NÍSIA FLORESTA – UMA MULHER À FRENTE DO SEU TEMPO
Invoco o fúlgido estro
E o gênio se manifesta
Para talhar em estrofes
Uma escultura modesta,
Sem contratempo e revés
Sobre os duzentos e dez
Anos de Nísia Floresta.
Resistente como cacto
Do seco chão nordestino,
Nísia encarou intempéries,
Mas em sonho cristalino,
Via nítida paisagem
Do futuro, e a coragem
De traçar o seu destino.
Da mãe, herdara ternura.
Do pai, causídico forte,
O destemor nos embates
Projetados pela sorte.
Por seu dom incomparável,
Fez-se a mulher mais notável
Do Rio Grande do Norte.
A influência paterna
Cinzelara a odisseia,
No desvelo com estudos,
Na lapidação da ideia
De buscar o proximismo,
Sorvendo o liberalismo
E a cultura europeia.
Ao florir da adolescência
Casou-se e não foi feliz.
Rompeu o laço, e com o tempo,
Dissolveu-se a cicatriz.
Depois o destino justo,
Dera-lhe Manoel Augusto
Com quem viveu como quis.
Na dissolvição do enlace
Com Alexandre, sequer,
Dele obteve o respeito.
Brotando-lhe o mister
De lapidar a conduta
Para inserir-se na luta
Dos direitos da mulher.
Intolerância antilusa
Naquela época embaçada,
Fez Dionísio viver
Com a prole em retirada.
E numa vitória linda,
Contra a elite em Olinda,
Tombou vítima de emboscada.
Perde o pai aos dezessete
Por causa de uma quizília,
Mas mantivera-se sóbria
Com a família em vigília.
Transpõe o luto, a tragédia,
E segura firme a rédea
Na união da família.
Em Nísia desabrochara
A luz do pioneirismo,
Defendeu temas polêmicos
Através do jornalismo.
Em um período sombrio
Suscitou o desafio
De pautar o feminismo.
Nísia nunca adotou
O estilo senhoril,
Ousada e contestadora
Desde o alvor juvenil,
Intensa, fez-se escritora
E primeira professora
Feminista do Brasil.
Sua poesia expõe
Sensibilidade artística,
Mordaz visão social,
Compreensão humanística...
A grande cosmopolita
Deu mais realce à escrita
Com adornos da linguística.
Emotiva Pedagoga,
Magistral educadora,
Fulgurante jornalista,
Refinada tradutora,
Clara abolicionista,
Resoluta feminista
E esplendorosa escritora.
Teceu questões femininas
No ‘Opúsculo Humanitário’,
Vindo de Augusto Comte,
Favorável comentário.
O pai do positivismo
Viu em Nísia brilhantismo
E contundente ideário.
A igualdade de gênero,
Foi a principal bandeira
Da intrépida ativista
E militante altaneira,
Que construiu esmerado
Inestimável legado
Para a nação brasileira.
Com a morte em Porto Alegre,
Do amado companheiro,
Leciona por três anos,
Mas Nísia muda o roteiro.
Abrem-se novas cortinas,
Funda escola pra meninas
Lá no Rio de Janeiro.
Publicações na Europa,
Várias em nosso país,
Defendeu índios e negros,
Seus direitos, seu matiz.
Soube conquistar espaço,
Pisou com desembaraço,
Berlim, Lisboa e Paris.
Nísia casou-se com treze
Anos a primeira vez,
Com dezessete a segunda,
Viuvou aos vinte e três.
A figura que idolatro
Morreu com setenta e quatro
Na França, com lucidez.
Eis a síntese da síntese
Da faustosa trajetória
Duma esplêndida mulher
Talhada para vitória.
Pelo que li faço a média
Que só uma enciclopédia
Caberia a sua história.