O CABRA CHAMADO RAIMUNDO
Oh! Meu devoto São Jorge
Das horas fazes segundo
Lendo provérbios de có
Simples pomar deste mundo
Escrever num belo dia
Hoje viver nostalgia
O nobre cabra Raimundo.
Aquele riso profundo
Trazido do Caritó
Dizem aquelas más línguas
Que veio de Mossoró
Sem comprovação na fala
Muita gente se cala
Lá pras brenhas Curió.
Se transformará em pó
Grande é tal agonia
Correndo nosso Raimundo
Falador de carestia
Vai comprar o que comer
Mas, não come pra saber
Rindo sem ter alegria.
Pensa lembrando Maria
Das noites de São João
Foi benzido dos pecados
Na primeira comunhão
Toda vez tão bem acorda
A confusão lhe transborda
Dá graça não ter paixão.
Jesus Cristo salvação
No domingo tem igreja
Bota sua melhor roupa
Nosso Deus que lhe proteja
Senta, se pousa à frente
Tido como boa gente
Ver o padre na peleja.
Onde se quer, assim seja
Um bode que nunca berra
Raimundo é habitante
Dos lajedos desta serra
A noite lhe traz insônia
Não tolera cerimônia
Cidadão comum da terra.
Já participou de guerra
Ao falar pros pastores
Fragilidade narrar
Das chaminés dos doutores
Julga para ser julgado
Ápice do massacrado
No cantar destes louvores.
A luta tem dissabores
Muitas intrometidas
Vivendo fazendo prece
Pras moças oferecidas
Tem ódio de satanás
Quando mandam dar o gás
Envergando nas subidas.
Seu jardim tem margaridas
Aquele é seu lugar
Gosta receber visita
Mas, prefere visitar
Senhores da redondeza
Lugarejos de beleza
Só fazem apreciar.
Ele quer se levantar
Depressa dar seu rolé
De posse de seu cavalo
Que se chama Rastapé
Montando, sai cavalgando
Pelo mato lamentando
Rezando pra ter mais fé.
De volta faz seu café
Toma, fica pensativo
Abrindo seus largos braços
Sonhando ser prestativo
Segue no canto da sala
Gira sua grande mala
Deixando contemplativo.
O viver é cansativo
Pra pagar tantos pecados
Sente desejo da carne
Lembra de tempos passados
Nunca ficou desse jeito
Sente batida do peito
Toque dos abençoados.
Aqueles gibis guardados
Naquela mala moral
Metade dos documentos
Muitos lhe metem pau
Mas, Raimundo é tão forte
Vai lutar até a morte
Como sujeito normal.
Nunca pensou ser o tal
Porém, assume que faz
Gosta de fazer balbúrdia
Nem importa com a paz
Por favor, caro pracinha
Não faça jamais gracinha
Pois, nada lhe satisfaz?
Leiam tudo que nos traz
A mãe só abandonou
Foi criado pelo pai
Onde jamais aguentou
Se conduzindo sozinho
Necessitando carinho
Ficando com bom avô.
Sempre pro povo ditou
Que fora feito galã
Namorou com tantas primas
Nos cheiros dum hortelã
Paquerando Gabriela
Bem rente à passarela
Com a filha do Natan.
No fundo baita vilã
Do clube carnavalesco
Raimundo foi convidado
Praquele baile burlesco
A moça tinha malícia
Diferente de Felícia
Daquele gesto grotesco.
Com este seu parentesco
Quase pileque raivoso
Teve que pensar naquilo
Momento bem horroroso
Raimundo no tom voz alta
Parece de quem assalta
Bendito servo vistoso.
Se sentia caridoso
Neste sofrido lamento
Não podia dar as ordens
Para sair do sofrimento
Nem quisera ser defunto
Mas, ficara tão bem junto
Como bolo sem fermento.
Livrando do ferimento
Raimundo se contemplou
Com tanto conhecimento
Neste cantinho firmou
E foi ligeiro plantar
Pra colher tem que regar
Pois, assim mesmo falou.
Ele quando se deitou
No redor tudo contente
Raimundo não tinha jeito
Envolveu mais uma crente
Dandara tinha segredo
Mas, não contava com medo
Desta tão grande patente.
Ele é mais exigente
Nela vai botando sola
Esta senhora medrosa
Quer vê-lo pedir esmola
Terá muito dinheiro
Daquele nobre guerreiro
Como ganhos em escola.
O seu domingo consola
De cerveja com cachaça
A danada perto dele
Os diabos acham graça
Raimundo quase morrendo
Aquela mulher querendo
Morar com ele na praça.
Seu Raimundo fez pirraça
Até hoje não casou
Botando culpa na peste
Detalhando que passou
Sem os pés e nem cabeça
E pelo que me pareça
É drama de quem contou.
Tanto minuto passou
Nem sei mais o que falar
O cabra Raimundo triste
Não consegue se firmar
Andava fazendo tudo
Em serviço bem peitudo
Sabia concretizar.
A doença quer ficar
Deixar Raimundo chocado
Um Homem sempre tranquilo
Mas, pode ser magoado
Zomba daquilo que faz
Ele se ver além mais
Seu poder condecorado.
Raimundo descontrolado
Agora tão bem importa
Abre suas asas fracas
Ver a sombra quase morta
Pega vela pelos braços
Esbarrando nos fracassos
Novamente vai à porta.
Reflete na visão torta
E tenta ganhar terreno
Mas, algo não faz vibrar
Ele fica mais sereno
É aqui que bruto trata
O próprio por si retrata
Do bem fazendo veneno.
Tudo se torna pequeno
Nesse caminho das trilhas
Raimundo se sente útil
Lembrando nunca ter filhas
Cruza braços em varanda
É público de ciranda
Distante daquelas milhas.
Pessoas também humilhas
Sem que te conheças, sim?
Ou chegas sempre correndo
Colhendo porto ruim?
Raimundo, é por aí
Teu bom ser irá sentir
Vendo flores no jardim.
Caixão de cheiro jasmim
Fechando sua vivência?
Cumpridor de toda cena
Nos princípios da decência
Saudade definitiva
Vida bela criativa
Cumprir papel na ciência.
Neste final há falência
Desconhecendo destino
Raimundo foi perecer
Feito cristão pequenino
Enrolado na medalha
Melancólica mortalha
De não ter sido menino.