O MILAGRE DE ANAHÍ
Vamos agora conhecer
Nos versos que vem a seguir
Uma lenda brasileira
Que foi recontada por mim
Recontei porque fiquei encantada
Desde o primeiro dia em que ouvi
Nas vozes de cascatinha e Inhana
A história da bravura
Da guerreira Anahí.
Peço que se atentem a cada verso
E se conscientizem de que
Apesar do avançar dos templos
Nos conduzir a evolução
O povo indígena ainda transita sob o véu da injustiça
Onde homens, mulheres, jovens, velhos ou crianças
São reais protagonistas.
Enfim, donos daquelas terras
Que tupã lhes concedeu
Vivia aqueles guaranis em harmonia
Com a natureza em sintonia
Seguiam os dias seus...
Mas, vejam que sucedeu
Entre tantos estrangeiros
Os espanhóis chegaram ali
Pois além da terra os preciosos metais
Eram iscas para os atrair
E para tomar de assalto
Os direitos daquela gente
Respaldados pela impunidade
Prosseguiram livremente
Contudo, não foi tão fácil
Executar a expropriação
Pois os indígenas ofereceram resistência
Defendendo com pertinência
Cada palmo daquele chão.
Naquele macabro episodio
Muitos guerreiros tombaram
Bordados sangrentos demarcaram
Os espaços daquele chão
E até hoje somos sugestionados a acreditar
Que isso foi civilização.
Este assunto é extenso
Temos apenas uma introdução aqui
Para lhes apresentar a história
Da cantora indígena Anahí.
Órfã de mãe que também foi morta guerreando
Anos mais tarde Anahí teve sua tribo massacrada
E depois de uma batalha ferrenha
Ela assistiu tombar seu pai e também o seu irmão
Enquanto mulheres e crianças foram aprisionadas
Para servir na escravidão
Inconformada a guerreira
Vendo seus sonhos desfeitos
Sentiu sua alma sangrar e o coração indignado
Parecia romper-lhe no peito
A indígena inconformada
Resolutamente decidiu
Que escrava não seria
Sem sonho a vida não é viver
Então decididamente lutaria,
Lutaria para vencer
Mas não se daria por vencida
Se lutando viesse a morrer.
Naquele momento ela concluiu
Que o chefe era o alvo apropriado
Afinal aquele massacre
Foi por ele liderado
E pelo encontro malgrado
Ela recorria ao deus jaci(lua)
E invocava a ancestralidade
De sua raça guarani
Então na primeira oportunidade
Que a sós com comandante se viu
Seu âmago encheu-se de fúria
Sua indignação vociferou
E naquele dado instante
Tomada por um rompante
A guerreira Anahí
O comandante desafiou
Mediante isso, o soberbo líder
Subestimou seu potencial
Referiu-se a ela com o desprezo
Que era o seu natural
Mas de cabeça erguida
Ela encarou destemida
Aquele instante crucial
Pois mesmo que lhe custasse a vida
A batalha não seria perdida
Apenas findaria o mal.
Aquele pretensioso não contava
Que a sua vaidade estilhaçaria o seu moral
Porque a fúria da indígena guerreira
Trouxe o fim de sua carreira
Numa luta corporal
Na fuga, Anahí foi capturada
E experimentou os flagelos da crueldade
Pois aqueles indivíduos
Não possuíam margens
Às suas perversidades
E seguiram intensificando as torturas
Para obrigá-la advertir seu povo
De que somente a rendição
Lhes traria a esperança de novo
Defrontada a seu povo
Com singular esforço
Ergueu-se do chão a guerreira
E para desfazer o contrafeito
Encheu de ar os pulmões
E bradou com toda força do peito:
_ Lutem, lutem até a morte
Não abram mão de nossos direitos
Se essas gentes não nos respeitam
Abominamos o desproveito...
Gritos de guerra ecoaram
Enquanto os soldados a ataram numa corticeira
Empilharam madeiras em torno de si
Atearam fogo em seu corpo
Na espera de que seu grito de socorro
Ao longe se pudessem ouvir.
Contudo os algozes observadores
Surpreenderam-se com o advir
Pois sob o céu emantado de estrelas
Numa exuberante flor vermelha
Pasmos viram transformar-se
O corpo de Anahí.
Assombrados aqueles inimigos
Bateram em retirada dali.
Enquanto o sereno lua prateado
Fez a noite tornar-se dia
Até o céu aproximou-se
Para que melhor pudesse ouvir
Os passarinhos que cantavam
O milagre de Anahí.
Ps. Em setembro de 2018, escrevi este reconto para uma apresentação de festa da família da unidade escolar que atuo e aos 27 dias de março de 2020 o reeditei para postagem.