A GAROTA DO CEMITERIO

¹Um dia desses eu fui

Numa festa em um salão,

Conheci uma garota

De tão rara perfeição:

De corpinho esculturado,

Com olhar bem avivado

Que nem brilho duma estrela;.

Cada passo que eu dançava,

Os movimentos que dava

Era somente pra vê-la.

²Ela que estava a bailar

Levemente feito pena

Me fechou com seu olhar

Desses que o cabra envenena

Fiquei desajuizado,

Coração acelerado

De desejo e farnezim

Me deu um fri na espinha

Que queimou e me espezinha

Aqui por dentro de mim.

³Sem aguentar a quentura

Que consumia o meu peito

Fui perto da criatura

E logo de contrapeito

Lhe convidei pra dançar

De logo a lhe perguntar

Como se chama menina,

e olhando no olhar meu

Sorridente respondeu

Eu me chamo Josefina.

⁴Segurei-a com a mão,

Olhei bem nos olhos dela.

Senti que meu coração

Se arriou co' essa donzela.

Dançávamos bem coladinho

Um forró, bem de mansinho,

No meio dessa muvuca;

Pra mexer com minha mente

Tão maliciosamente

Alisou-me bem na nuca.

⁵ E eu me arrepiei-me todo

Com aquele toque felino.

Mergulhando nesse engodo

Do feitiço feminino,

Revidei a tal carícia.

Também cheio de malícia

Alisei no seu cangote

Senti sua pele fria

Que também se arrepia

Toda cheia de Fricote.

⁶ Ela forte me abraçava

Sussurrando ao meu ouvido

Eu, já doido, lhe tocava

No seu corpo bem servido.

E fervendo de desejo

Taquei-lhe um cálido beijo

Desses de perder o ar.

Lhe atraquei nos meus abraços.

Entre pegas e amassos

Não paramos de dançar.

⁷ Ficamos a festa inteira

Nesse gostoso chamego.

A garota era faceira

Eu já lhe tinha apego.

De repente ela parou

Veemente me olhou

E me deu um forte abraço,

E disse: - já está na hora,

Meu querido, de ir embora.

E me puxou pelo braço.

⁸ Saímos desembestado

Todo o povo derrubando;

Eu tava todo quebrado

De tanto ela ir me puxando.

Na rua eu me assombrei

Pois num relance notei

Quando ela mudou de humor.

Fiquei bastante assustado

Com o rosto desfigurado

Todo pálido, frio, sem cor.

⁹ -Vixe Maria! - eu pensei -

Que mal danado era aquilo...

Mesmo assim continuei

Seguindo-a com tal sigilo.

Seguimos no nesse mistério.

Bem de frente ao cemitério

A garota, assim, parou

E disse, no meu ouvido:

- Muito obrigado querido,

O meu destino chegou!

¹⁰ Eu fiquei estatalado,

Muito pasmo, sem ação.

Uns três minutos parado

Sem alguma reação.

Mesmo assim quando tornei

Do susto, lhe abracei

E tornei a lhe beijar.

E disse, bastante louco:

- Meu amor, daqui a pouco

Estaremos no seu lar.

¹¹ Pensava, eu, que o seu lar

Estava a metros à frente,

Que queria aproveitar

Mais o chamego da gente.

Ela de mim se afastou,

De lá mesmo, me mostrou

Uma sepultura bela

Eu entrei, muito assustado

E estava lá encravado

Seu nome e a foto dela.

¹² Uns sete anos fazia

Que ela tinha falecido.

Meu corpo todo tremia

Com que tinha me ocorrido

Eu sem saber se eu corria

Se chorava, se tremia

Oh, situação buzunta?

Eu fiquei desapontado

Por assim ter namorado

Noite inteira com a defunta.

¹³ Então, saí com a Bixiga

Do cemitério correndo,

Com uma dor de barriga

De medo grande, tremendo.

Depois dessas que passei

Nunca mais me assanhei

A dançar em um salão

Só de olhar pruma menina

Penso logo em Josefina

E se acaba a animação.