A Dama entre Cactos
No olhar azul da cabocla,
Eu não sei se cabeça oca
Ou mulher de siso bom,
Tem um desejo e me ataca
Como ao pasto faz a vaca
Como à vaca, o boi marrom.
Já tem ela meia idade
Mas inda tem mocidade
No seu jeito de mulher;
Seu semblante não tem ruga,
E saltita feito pulga
No forró, onde tiver.
O espírito é brincalhão,
Mas acho que o coração
É um pouquinho solitário,
Mesmo assim de modo algum,
Eu nunca a vi sobre o rum
Descontando seu calvário.
Passa tinta no cabelo,
Traja com grande desvelo
Como pode e como ganha.
E digo: tem ganho escasso,
Mas aqui neste pedaço,
Seu talhe é uma façanha.
Seu perfume é de madame,
Não causa nenhum vexame
Em festa mais social,
Pois, com a graça completa
Inda lhe sobra etiqueta
Da fineza ao carnaval.
Sua fala é nordestina
Porém tudo ela combina
E forma um jeito sem par,
De falar com toda gente;
Comigo é bem diferente
Com outro já vai mudar.
Os seus dentes - marfim branco
Que talvez eu nem arranco
Palavras pra descrever;
Todos juntinhos sem falha
Que quando ela gargalha
É como a luz acender.
Com elegância caminha
E não sei se tem rainha
Neste mundo à altura dela,
E ao passar por um espelho
Retoca o batom vermelho
Pra ficar sempre mais bela.
É. Eu bem que poderia
Me unir a esta dama um dia,
Mas penso meio cabreiro:
Esse tal pompa orgulhosa,
Muito metida, vaidosa,
É puro Rio de Janeiro.
Eduardo Persa