A Dama entre Cactos

No olhar azul da cabocla,

Eu não sei se cabeça oca

Ou mulher de siso bom,

Tem um desejo e me ataca

Como ao pasto faz a vaca

Como à vaca, o boi marrom.

Já tem ela meia idade

Mas inda tem mocidade

No seu jeito de mulher;

Seu semblante não tem ruga,

E saltita feito pulga

No forró, onde tiver.

O espírito é brincalhão,

Mas acho que o coração

É um pouquinho solitário,

Mesmo assim de modo algum,

Eu nunca a vi sobre o rum

Descontando seu calvário.

Passa tinta no cabelo,

Traja com grande desvelo

Como pode e como ganha.

E digo: tem ganho escasso,

Mas aqui neste pedaço,

Seu talhe é uma façanha.

Seu perfume é de madame,

Não causa nenhum vexame

Em festa mais social,

Pois, com a graça completa

Inda lhe sobra etiqueta

Da fineza ao carnaval.

Sua fala é nordestina

Porém tudo ela combina

E forma um jeito sem par,

De falar com toda gente;

Comigo é bem diferente

Com outro já vai mudar.

Os seus dentes - marfim branco

Que talvez eu nem arranco

Palavras pra descrever;

Todos juntinhos sem falha

Que quando ela gargalha

É como a luz acender.

Com elegância caminha

E não sei se tem rainha

Neste mundo à altura dela,

E ao passar por um espelho

Retoca o batom vermelho

Pra ficar sempre mais bela.

É. Eu bem que poderia

Me unir a esta dama um dia,

Mas penso meio cabreiro:

Esse tal pompa orgulhosa,

Muito metida, vaidosa,

É puro Rio de Janeiro.

Eduardo Persa

Rogério Freitas
Enviado por Rogério Freitas em 08/05/2021
Código do texto: T7251004
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