O Caboclo Rompe Mato e o Panteão de Oxóssi
Venho contar uma história
Versada em poesia pura
Onde o poder da memória
À velha crença se mistura
E relata a grande vitória
Da nossa amada Cultura.
Se passa na Grande Floresta
A saga que aqui relato.
Meu verso agora empresta
O lirismo para este fato
Se minha pena se presta
Cito um Caboclo do Mato.
A sanha desse herói valente
Tem origem no animismo
É um guerreiro diferente
Forjado no sincretismo.
Da morte um sobrevivente
Oxóssi deu-lhe o batismo.
A chegada do homem branco
Nas terras de Pindorama
Trouxe consigo o quebranto
Que a vida do índio trama
Trazendo a perda e o pranto
Que à comoção se soma.
Devido à grande proximidade
Dos acampamentos europeus
O índio viu com curiosidade
Costumes que não eram seus
Chegando a bem da verdade
A vê-los como enviados de Deus.
A convivência ali os unia
E a confiança se firmava
O que o povo branco fazia
O indígena logo o imitava
E assim também a agonia
Da gripe se espalhava.
Um Curumim inocente
Por pura ingenuidade
Do perigo inconsciente
Desconhecendo a maldade.
Daquele povo diferente
Quis conquistar a amizade
Vivendo ali misturado
De tudo ele se inteirava
Mas o seu corpo delicado
À cruel morte desafiava
E por ter se descuidado
Ela logo o alcançava.
Com o corpo quente, cansado
Voltou à aldeia entanguido
Deitou-se na oca acanhado
Pelo chão ficou estendido
E o vendo tão alquebrado
O Cacique deu um rugido.
O grito ecoou na mata
Chamando o Grande Pajé
Que veio com a voz pacata
Cantando pra Tenodé
Pedindo a visão sensata
E a cura por meio da fé
Mas os espíritos ancestrais
Ficaram todos assustados
De nada ouviu os seus ais
Estavam todos ali calados
Nem os poderes espirituais
Resfriou o corpo abrasado
O Cacique, pai do menino,
Tomou o corpo num abraço
Partiu dali sem destino.
Em busca de algum regaço
Para salvar seu pequenino
Daquele triste embaraço.
O Pajé os acompanhava
Sempre rezando e pedindo
Pelos seus deuses clamava
Mas nenhum estava ouvindo
A moléstia se espalhava
E a criança quase partindo.
No meio de uma clareira
O guerreiro se desespera
Fez uma prece derradeira.
E urrando como uma fera
Deixa-se cair na paineira
Da triste morte à espera.
O seu coração combalido
Enfrenta a maior batalha
Perder um filho querido
Enquanto a sua força falha
E o pranto mais dolorido
Pelo semblante se espalha.
Não percebeu a ausência
Do velho sábio, o Pajé.
Que com muita paciência
Recorria a Tupã Tenodé
E da floresta a essência,
O deus Guerreiro Çuacêpé.
Mas foi o choro de dor
Do impotente guerreiro
Que atraiu o Pai Caçador
Da floresta o Curandeiro
O arqueiro e fiel protetor
Oxóssi, o Deus justiceiro.
Aproximou-se de leve
Do corpo do Curumim
E num aceno bem breve
Ao pai exclamou assim:
De tudo quanto me deve,
Quero seu filho pra mim!
O Cacique achou loucura
Mas o menino entregou
Oxóssi fez sua benzedura
E aquela criança acordou
Então com grande ternura
Nos braços do pai colocou
Olhando os dois demorado
Disse: Aqui eu sei que trato
Com o Chefe bom e honrado
E este curumim de fato
Que agora, é o meu afilhado
Chama Caboclo Rompe Mato.
Doravante a sua missão
É trabalhar com bravura
E sob à minha benção
Romper a floresta escura
Das ervas fazer a poção
Para afugentar a amargura
Na tribo será o Panteão
De Oxóssi, o Deus da cura.
Adriribeiro/@adri.poesias