O PREÇO DA AMBIÇÃO
Essa história vem trazendo
Crime, castigo e prisão
Remorso, recolhimento
Também falta de razão
Essas coisas só têm causa
Onde se tem ambição.
Um velho tinha dois filhos
O primeiro adoeceu
Essa doença era rara
A fortuna se perdeu
E o filho sem ter melhora
Não durou muito e morreu.
Só o segundo restou
Foi crescendo e trabalhando
Na cabana do seu pai
Com ele, ficou morando
Trabalhava de manhã
Mas de tarde era estudando.
A vida ficou difícil
Pois o trabalho era escasso
Um dia caindo em si
Perguntou-se: – o que é que faço?
Para mudar tudo isso
Eu tenho que dar um passo.
Chamando o pai atenção
O filho foi lhe dizendo:
– Trabalhar está difícil
Meu estudo estou perdendo
Nós temos que se mudar
Ou vamos findar morrendo.
O pai disse: – você vai,
Posso saber para onde?
O que foi que você fez
Que eu pergunto e não responde?
Que malefício fizeste,
Que em teu coração esconde?
O filho explicou ao pai
Qual era a situação:
Não havia mais emprego
Não tinha mais condição
Com isso o pai entendeu
E teve compreensão.
O filho foi para longe
Deixou seu pai na cabana
Conseguiu um bom emprego
Namorava uma tal Ana
E mandava para o pai
Dinheiro toda semana.
Nesse ritmo um bom tempo
Passou sem s’ interromper
Mas teve tempos que o filho
Ao pai não pode escrever
Dessa forma o pai julgava:
– Meu filho fez foi morrer.
O trabalho era pesado
E num curso se atrevia
Estudava faculdade
E cursava engenharia
Por conta de obrigações
Ao pai não mais escrevia.
Foi tempo que se casou-se
Com Ana da Conceição
Nasceu seu primeiro filho
O qual teve educação
Mas depois ele morreu
Pulando num cacimbão.
De novo conheceu Ana
Ela pariu u’ a menina
Era linda e deslumbrante
Se mostrava a mais divina
Só que hoje está crescida
É professora e ensina.
Esse filho que tratamos
Que o pai jugou que morreu
Já estava bem de vida
Pois Deus lhe favoreceu
Nessas alturas estava
No continente Europeu.
Viajou para Alemanha
Disso nós temos indício
Em contato com empresas
Teve um chamado propício
Foi assim que viajou
Para exercer seu ofício.
Passou muito tempo lá
E voltou certo momento
Porque Ana em carta disse:
– Vamos ter o enlaçamento;
Nossa filha vai casar
Compareça ao casamento.
Quando, deu-se o casamento
Pra Europa ele voltou
Fez as malas, despediu-se
Num avião embarcou
Com horas mais para frente
Na Alemanha ele chegou.
Continuou trabalhado
Exercendo a profissão
Já era homem de fama
Tinha qualificação
Conseguiu bom patrimônio
De grande avaliação.
De lá se comunicava
Com a família direto,
Depois recebeu notícias
Que era avô, tinha neto
Mas não se lembrou do pai
Nem se possuía um teto.
Numa noite então pensando
Do velho pai se lembrou
A saudade era tão grande
Que no seu quarto chorou
E para rever seu velho
Pra sua pátria voltou.
Ele deixou seu emprego
Prometeu não mais voltar
Dizendo: – vou ver meu pai
Quero a saudade matar,
Como tenho bom currículo
Trabalho em qualquer lugar.
Retornou pra sua gente
Com muita felicidade
Tinha uma fortuna grande
Bastante prosperidade
Só que maior no seu peito
Era o peso da saudade.
Chamando a sua família
Começou a lhes dizer:
– Eu vim pra rever meu pai,
Vou até lhe convencer
E se ele concordar
Para cá vou lhe trazer.
A família concordou.
Era final de semana
Ele foi rever seu pai
Ao chegar viu a choupana
E reconheceu que aquela
Era do pai, a cabana.
Chamando o velho de fora
Começou a disfarçar
Passando por forasteiro
Sem o pai desconfiar
O velho saiu e disse:
– Pode vir que tem lugar.
O filho adentrou ali
Se fazendo que era mouco
Deu u’ a mudança na fala
Fazendo que estava rouco
Para o pai não perceber
E pra ele falar pouco.
Após a ceia deitou-se
Para poder descansar
O velho notou u’ a mala
Começou a imaginar:
– Eu acho qu’ isso é dinheiro,
Logo estou a precisar.
Abrindo a mala em silêncio
Ao mesmo tempo ligeiro
Ficou surpreso e contente
Pois de fato era dinheiro
No mesmo instante pôs fim
A vida do “forasteiro”.
E matando o “forasteiro”
Começou a revirar
Aquele dinheiro todo
Mas não pode imaginar
Que no fundo da maleta
Algo triste ia encontrar.
Achou a foto do filho
No tempo que era mais moço
E prestou bem atenção
Para um sinal no pescoço
Assim que reconheceu
Entrou logo em alvoroço.
Daquela hora em diante
O velho foi pra prisão
Chorando com desconforto
Pela falta de razão
E disse: – eu estou pagando
O preço dessa ambição.
Dizem que o velho morreu
Em ato de contrição
O seu desejo era grande
De ter absolvição
Que o filho lhe apareceu
Certa noite e deu perdão.
E é aqui que terminamos
Esse tal fato narrar,
Esperando que o leitor
Possa dele se agradar:
Que traz na nomeação
O Preço da Ambição
Que o leitor pode notar.
Baixa Grande 21/11/2019
*Este cordel foi baseado em um dos contos recolhidos pelo grande folclorista Câmara Cascudo. Encontra-se em prosa no livro Contos Populares dos Brasil.