ZÉ AMORIM

ZÉ AMORIM

Deus eterno das alturas

Santo Deus Senhor da glória

Derrama luz sobre mim

Dê-me uma viva memória

Pois quero narrar em verso

Uma comovente história

Versar sobre Zé Amorim

Este grande nordestino

Acompanhei sua história

Desde os tempos de menino

Muito me honra contar

O seu brilhante destino

Narrar esta trajetória

Deste grande oestano

Do Rio Grande do Norte

Que nasceu naquele ano

Quarenta, século passado

Mês nove, muito me ufano

Deveria ser seu nome

José Carlos de Amorim

Mas já havia um primo

Com nome igual assim

E para não misturar

Ele passou a se chamar

Somente Zé Amorim

Ele nasceu na fazenda

Cujo nome é Torada

Filho do Senhor Francisco

Nunes família honrada

Que também era Amorim

De geração reputada

Sua mãe era Amélia

Mulher de grande visão

Neta de Manuel Carlos

Pai de grande geração

Dono de muitas terras

Lá naquela região

Desde muito pequenino

José foi inteligente

Tinha dom para a mecânica

Sendo até polivalente

Porque ali na fazenda

A luta era abrangente

Seu pai criou a família

Toda ela deste jeito

Ali havia união

Disciplina e respeito

Bastava olhar para um

E já via o efeito

Na lei da semeadura

Só se colhe o que se planta

No grande frio da noite

Há de se cobrir com manta

É lei ditada por Deus

Por isso mesmo é santa

José desde bem pequeno

Já tinha sonho e ilusão

Fabricava seus carrinhos

Com eixo, roda e cocão

Fazia bem acabado

Tal era a fabricação

Sempre usou de maestria

Muito talento e cuidado

Tudo riscado e medido

Serrote bem amolado

Não gosta de gambiarra

Faz tudo bem acabado

Assim seus projetos têm

Uma grande perfeição

Seus carros eram usados

Prá carregar produção

Depois da luta levava

Para a sua diversão

Chamava os seus irmãos

Para aquela brincadeira

Escolhia um local

De uma grande ladeira

Limpava todo o mato

Na base da roçadeira

Levavam o carro p’ro alto

A subida era atroz

Mas ao chegar lá em cima

Depois de luta feroz

Desciam ladeira abaixo

Numa carreira veloz

A carrada era arrumada

Irmãos na carroceria

Ele sentado na frente

Pois era quem dirigia

Todos bastante felizes

Era grande a alegria

Terminado o seu lazer

O sol já se escondendo

Para dar lugar a lua

Que já vinha ali nascendo

Trazendo muita beleza

Lindo quadro todos vendo

Corriam para o açude

Levando o carro a puxar

Iam tomar o seu banho

Gostoso mergulho dar

Depois vinham para casa

Era hora do jantar

O cardápio era gostoso

Dona Amélia assim fazia

Cuscuz, queijo e qualhada

Mas se era outro dia

Arroz de leite, beleza

Do jeito qu’ela sabia

Dormia ali na fazenda

No quarto grande ou na sala

A rede branca armada

O véu da noite embala

Sonhos rodando nas mentes

Lá fora neblina rala

No dia seguinte a luta

Continua novamente

Zé amorim trazia um plano

Bem guardado em sua mente

Construir uma carroça

Projeto bem diferente

Mas faria isto depois

Queria era brincar

Ia pro topo da serra

Pedra ali ia rolar

Soltava a pedra descendo

O papoco era tremendo

E o barulho a ecoar

Era assim muito feliz

Não se encontrava na fossa

Dormia bem sossegado

Na vida simples da roça

De madrugada voltava

A lembrança da carroça

Primeiro passo seria

Amolar o seu machado

Depois seguir mata a dentro

Ver um angico curado

Cortar e arrastar com boi

Ao lugar determinado

Depois de muito andar

Na serra mata fechada

Viu um angico bem seco

A ele tomou chegada

Resolveu já nele dar

A primeira machadada

Era duro igual a ferro

O fogo chega subia

Foi cortando devagar

Gastou quase meio dia

Mas derrubou o angico

E o puxou como queria

A noite ele foi dormir

Como uma pedra, cansado

Caiu na rede e dormiu

Estava todo quebrado

De madrugada sonhou

Com o projeto sagrado

Escolheu logo um lugar

Bem escondido distante

Ninguém podia saber

Do seu projeto importante

Trabalhou com muito afinco

E o serviço foi adiante

Mas ia bem devagar

Fazia nas horas vagas

E começou a serrar

Com a força d’uma draga

Serrando em cima do risco

Tão certo que o risco apaga

O projeto foi andando

O mestre era valente

Toda noite ia pensando

Bem dentro de sua mente

Como fazer a carroça

Seria sua a patente

Domingo dia de feira

Quando à cidade ia

Comprava alguma coisa

Que o projeto requeria

Ferragens, lixa e tinta

Certamente ele trazia

Fez tudo aparafusado

Com esmero e cuidado

Todas as peças lixadas

Mesa, grades e tablado

E foi montando a carroça

Do seu sonho tão sonhado

No dia que concluiu

Foi grande a satisfação

Teve que mostrar a todos

Ali naquele rincão

Ao passar todos olhavam

Com grande admiração

Mas o melhor foi na feira

Aconteceu mesmo assim

Entrou na primeira rua

Parou em frente ao jardim

O povo olhava e corria

Para ver Zé amorim

De fato não era ele

Que o povo queria ver

Era o seu coche bem feito

Que pôs muitos a correr

Foi a carroça mais linda

Que alguém queria ter

Botaram logo dinheiro

Muitos queriam comprar

Porém ele não vendia

Só queria passear

Mostrar sua obra prima

Depois prá casa voltar

Em toda feira alguém vinha

De novo fazer proposta

Para comprar a carroça

Mas ficava sem resposta

Zé amorim não vendia

A carroça tão composta

Um dia ele passando

Na rua da prefeitura

O burro todo elegante

José cheio de postura

Viu uma jovem bonita

Risonha e toda pura

O seu nome é  Ireneide

Que ficou muito animada

Não era só com a carroça

Que vinha próximo a calçada

Pode crer era com o dono

Que via e dava risada

Naquele encontro informal

Começaram a namorar

Toda vez que ia a rua

A namorada ia olhar

Zé Amorim é deste jeito

Tudo que faz é bem feito

Namorava pra casar

Já passado algum tempo

Ao mostrar a todo povo

Botaram tanto dinheiro

Na carroça ali de novo

Que resolveu entregar

Seu projeto supernovo

Com o dinheiro da venda

Adivinhem o que ele fez?

Comprou um jipe novinho

E agora desta vez

Resolveu ir para a praça

Porque já tinha freguês

O tempo corria rápido

Na estrada da sua vida

Resolveu pedir a moça

Porque era a mais querida

E marcar o casamento

Com sua noiva pedida

No dia do casamento

Num momento singular

O vigário deu a bênção

Ali na frente do altar

E juraram amor eterno

Prá Deus lhes abençoar

Na brisa fria da noite

Quando a bruma vem caindo

Os amores se completam

Corações vão se esvaindo

Em laços fortes de amor

E a neblina se exaurindo

José e Neida passaram

Uns meses lá na fazenda

Do seu tempo de menino

Voltou a armar a tenda

Limpou a casa e o cercado

O curral, engenho e moenda

Fez plantação de arroz

Na baixa viu a crescença

Aproveitando o inverno

No coração grande crença

Que com a bênção de Deus

Iria encher a despensa

Restaurou tudo ali

Pisou deixou o seu rastro

Tratou bem os cajueiros

Fincou no sertão seu mastro

Riscou seu risco no céu

Como valoroso astro

Desta união Deus lhes deu

Cinco rebentos bonitos

Todos eles bem criados

Nos caminhos favoritos

Onde Deus põe sua mão

Os filhos ficam benditos

Há duas décadas atrás

Deixou  o velho sertão

Veio morar em Mossoró

Procurar uma opção

De táxi ou qualquer serviço

Melhorar a condição

Com filhos ainda pequenos

Deixou a sua cidade

Veio tentar em outras plagas

Sorte e oportunidade

Neida montou uma loja

Com muita tenacidade

José trouxe o seu jipe

Desde a época da carroça

Toparia um serviço

De verdade não de troça

Podia ser qualquer um

Só não queria mais roça

Os troços vinham na frente

O jipe vinha atrás

No peito a dor moente

A saudade é sagaz

Só se muda para longe

Quem de fato é tenaz

Desde as eras do sertão

Zé Amorim já começou

A juntar peças antigas

De que muito ele gostou

A coisa foi aumentando

N’um museu já se tornou

Além das peças antigas

Foi as moedas procurando

Sempre que surgia uma

Ia pegando e comprando

E a sua coleção

Devagar ia aumentando

São moedas brasileiras

Que ele guarda com cuidado

Organizadas em pastas

Tudo limpo e arrumado

Num dia de puro azar

Ele esqueceu de fechar

A porta e foi roubado

Por sorte foi só uma pasta

Que o larápio levou

Certamente na carreira

Na escada ele passou

Tudo foi tão de repente

Que nem o dono notou

Prá completar o seu hobby

No ano noventa e dois

Viu um cartão telefônico

Comprou, foi juntando, pois

Queria ser pioneiro

Na cidade bem depois

De fato é o pioneiro

Ali naquela cidade

Tem muitos cartões difíceis

Que lhe dão a qualidade

Alguém pode até ter mais

Ele não quer quantidade

Pouco a pouco foi juntando

Só cartões cá do Brasil

Rica coleção já tem

Com quase dezoito mil

Sãos as estampas mais lindas

Que o olho humano já viu

Pela própria condição

De ter sido o primeiro

Começou a juntar cartão

Empregando algum dinheiro

Como já partiu na frente

Hoje é o pioneiro

Todo dia ele tirava

A lama do seu corcel

A ferrugem não entrava

Naquela luta cruel

No chão ele se deitava

E usava o seu pincel

Como sempre quis zelar

Carros com manutenção

Projetou fazer um dique

Na garagem do oitão

Foi devagar construindo

Um projeto de rojão

Que ideia admirável

Colocou quatro colunas

Com roscas bem trabalhadas

Acoplou com engrenagens

Todas bem lubrificadas

Fez a base e armações

Nas paredes amarradas

Ao concluir a mecânica

Tudo funcionou perfeito

Porém achou bem pesado

Operar daquele jeito

O esforço era tamanho

Que dava uma dor no peito

Pensou automatizar

Pôr motor ele queria

Convidou o irmão Arnaud

Prá mexer com energia

De pronto ele fez tudo

Será que o carro subia?

Ao ligar ao chave ao lado

No dia da inauguração

Não teve curto-circuito

Tudo era perfeição

O carro subiu beleza

Ficou bem alto do chão

Agora pode limpar

Os seus carros sem problema

O dique até parece

Uma coisa de cinema

Sobe e desce tudo elétrico

Acabou todo dilema

Um dia viu um canhão

Na base da infantaria

Achou bastante bonito

Fazer um também queria

Matutou por muito tempo

Mas seu canhão concluía

Colocou em sua sala

Não pense que é mentira

Sempre limpa  passa o pano

A poeira ele tira

Se botar uma bala nele

Garanto que o bicho atira

Se tivesse estudado

Seria grande engenheiro

Digo sem medo de errar

Também seria o primeiro

O  homem traça seus planos

Mas vem de Deus o roteiro

Deus igualmente já fez

A alegria redobrar

Com sete netos que tem

Veio uma bisneta alegrar

Quem beija a face do neto

A boca vem adoçar

Hoje o seu comércio

É uma loja de presente

Fábia, filha, gerencia

Faz tudo decentemente

Neida viaja faz compras

Num fluxo sempre crescente

Alem de ser um mecânico

É um grande engenheiro

Qualquer serviço ele topa

Mesmo que passe o mes inteiro

Em tudo que ele inventa

Com paciência enfrenta

Será sempre o primeiro

José não tem mais seu táxi

Lá no centro da cidade

Em frente a Riachuelo

É grande sua saudade

Faz seus projetos em casa

Com responsabilidade

E por falar em museu

Assunto bem importante

Hoje ele tem grande acervo

Peças que juntou durante

Sua grande caminhada

Na estrada da vida andante

São várias peças antigas

Que guarda com atenção

Máquinas, ferros e armas

Vindos d’outra geração

Que ele zela, limpa e guarda

Com muita dedicação

Assim vai tocando a vida

Enquanto Deus permitir

Com sua esposa querida

Conforme contado aqui

Só resta pedir a Deus

Mais bênçãos para o porvir

Ao meu  irmão Zé amorim

Quis prestar esta homenagem

Versificando assim

Nesta simples abordagem

Escrevi de coração

Relembrando nossa infância

Encurtando a distância

Do nosso lindo torrão

- FIM -

Arnaud Carlos de Amorim