O JUMENTO ROXIN
O meu pai tinha um jumento
E o nome dele era Roxin,
Era marrom como chocolate
além de ser bem “mansin”,
Era delicado como uma cabra
e a suas orelhas empinava
como as antenas do Chapolin.
Nesse tempo Pai era carroceiro,
Junto com Roxin vendia água,
Andavam de carroça o dia inteiro
o calor do cão eles aguentava,
Só não faltava comida na mesa
Porque os dois a colocava.
Às vezes eu ia pru sítio
e chegando sentia o vento bom,
Essa não era a melhor parte
mas a melhor era o frisson,
Que eu sentia na chegada
quando Roxin me avistava
e rinchava Rrinrron rrinrron!
Vendo o balde seco
eu ia até no açude encher,
Trazia ele cheio até Roxin
e o jegue começava a beber,
Depois ele me acariciava
e suas zurea se levantava
como forma de agradecer.
Vez e outra eu acompanhava Pai
nas suas peripécias com Roxin,
O véi usava cipó de marmeleiro
pra me deixar com dó do Bichin,
Apesar de Roxin não ser perspicaz
ele tinha a grandeza dum querubim.
Num dia desse Pai amarrou ele
numa árvore em frente de casa,
O meu Sobrinho pegou um cipó
e começou a meter cutucada,
Até que o Roxin se chateou
de costas pra ele se virou
e tacou-lhe uma coiceada.
A testa do meu sobrinho se abriu
e ele foi levado pru hospital,
Quatro pontos na sua testa
resultou do coice do animal,
Cujo ocorrido me fez pensar
sobre quem foi o irracional.
Outro dia Pai vindo bebo do sítio
pegou no sono na carroça,
Era de noite e ele acordou
em casa e diante da porta,
Painha ficou estupefato
vendo que mesmo sem guia-lo
o Jegue fez toda a rota.
Quando eu montava nele
nós cavalgava pelo campo,
De dia víamos de tudo
menos a luz dos pirilampo,
Cobras e caranguejeiras
causavam em Roxin espanto.
Um dia desse eu e meus amigos
na carroça nós andou,
Um deu uma cipoada em Roxin
e o jegue desembestou
com a força de um cavalo
que nos deixou fascinado
quando a poeira levantou.
Roxin não conseguia resistir
à tentação de uma jumenta,
Ela fazia o papel da presa
e ele da cobra peçonhenta,
Que dava o bote sem hesitar
e rinchava de contenta.
Quando uma jumenta invadiu
o sitio pulando os arames farpado
as olheiras de Roxin subiu
e seu bastão preto ficou armado,
Ele torou a corda e correu
nas costas dela se ergueu
e o ato foi praticado.
Ele era muito fogoso
e mostrava seu jeito cortês
com o seu rinchado charmoso
que não tinha nada de português,
Se lá tivesse puteiro de Jumenta
Roxin seria o maior freguês.
O meu pai não o respeitava
e não o tratava com carinho,
Além das cipoadas
vez e outra xingava o bichinho,
Chamando o Roxin de Sapirico
quando este ficava distraído
e parava no caminho.
Mas Pai nunca deixava
faltar comida pru Bichin,
Dava milho, capim e água
que alegrava muito Roxin,
Sendo qu’ele comia até ficar
como um bolão de pebolim.
Roxin também era jegue de guarda,
Vi isso quando eu dormi lá,
No sítio só tinha o gorjear dos sapos
até que ele começou a rinchar,
Pai acordou e saiu da casinha
e viu que na árvore das galinhas
um ladrão estava pras roubar.
Meu pai pegou minha balinheira
e atirou na cabeça do desgraçado,
O ladrão caiu de cima da árvore
saiu correndo e sumiu no mato,
Nenhuma galinha foi roubada
e ao Jegue fui muito grato.
Roxin marcou a minha vida
mas toda anedota tem um final,
E o fim desse conto chega
no dia que fui no milharal,
Pai pediu preu ir buscar Roxin
mas vi uma cena bem surreal.
Houve um momento que hesitei
E enfim decidir enfrentar,
Lasquei a cabeça da sucuri
E o laço começou a desatar,
Nisso o Roxin caiu no Chão
Inconsciente e sem respirar.
Logo gritei em plena fúria
Socando a foice na serpente,
O sangue cobriu o corpo dela
Nunca mais fui inocente.
Meu pai não demonstrou remorso
Apenas encarou como perda casual,
Riu até do meu relato
Tendo em vista que eu passava mal,
Indiferente ao cadáver do bicho
Nutriu a ideia de jogá-lo no lixo
Só que eu fiz um funeral.
Santo André, 10 de Dezembro de 2020