Satíricon tupiniquim ("um samba do crioulo doido")
Antes da morte chegar
aconselhou o seu filho:
pra você andar no trilho,
seja qual for o lugar,
tem que ouvir e guardar
em segredo este conselho,
portanto dobre o joelho,
e me faça o juramento
não fale pro pensamento
e nem mesmo pro espelho.
Pois meu pai, pode contar,
que vou guardar em segredo,
e nem mesmo por brinquedo
a alguém vou revelar.
Guardo no fundo do mar,
enterrado na areia,
que nem mesmo uma sereia,
ou um bom escafandrista,
vão um dia por a vista
no seu segredo. Me creia!
O velho pai titubeia,
risca a pena no papel
faz um verso de cordel
e pede ao filho que leia,
enquanto degusta a ceia
e o vinho tinto caseiro,
sob a luz do candeeiro,
que se mistura ao luar,
e se põe a paginar
um passado aventureiro:
_Dia três de fevereiro,
do ano cinquenta e quatro,
estreava no teatro,
pra ganhar algum dinheiro,
um distinto cavaleiro,
amante da poesia,
que ainda não sabia,
pois o futuro é incerto,
que um dia, longe ou perto,
pelo mundo sairia.
Um tal Manuel Maria,
conhecido por Bocage,
com todo o rigor no traje
e também na montaria,
seguiu, a tanger a cria.
Foi boêmio, viajante,
desceu ao inferno de Dante,
enfrentou a inquisição,
foi preso e, na prisão
deu um passo mais adiante.
Carregou um meliante,
que também era poeta,
no varão da bicicleta,
até um lugar distante.
Beberam água da fonte
do seu tempo de menino,
tornou-se Elmano Sadino,
seu primeiro codinome,
passou sede, passou fome,
satirizando o divino.
Falou grosso, falou fino,
fez desaforo pro cão.
Imitou camaleão,
padre, pastor e rabino...
Dançou samba, tocou hino,
violão e cavaquinho,
fez a água virar vinho,
cajado virar serpente,
inda andou de trás pra frente,
sem conhecer o caminho.
Voo feito passarinho,
pelos ares de Lisboa,
levou Fernando Pessoa
passear no Pelourinho.
E pra não morrer sozinho,
nalgum conto lusitano,
se juntou a Herculano,
um cabra do Piauí,
e de lá até aqui,
vão carregando o piano.
E até o final do ano,
vão escrever em conjunto,
qualquer que seja o assunto,
em verso parnasiano.
E se não mudar de plano,
no ano que se aproxima,
vão procurar uma rima
pro Raimundo de Drummond
e assim, em alto e bom som,
dar um fim à obra prima.
E pra não sair do clima
vão coçar, em redondilha,
o saco, o pé da virilha...
pouco abaixo, pouco acima...
Descascar laranja-lima,
jogar a casca pra riba,
afogar o Parnaíba,
num soneto de Camões
e rio Solimões,
nalgum frevo de Capiba.
Antes da morte chegar
aconselhou o seu filho:
pra você andar no trilho,
seja qual for o lugar,
tem que ouvir e guardar
em segredo este conselho,
portanto dobre o joelho,
e me faça o juramento
não fale pro pensamento
e nem mesmo pro espelho.
Pois meu pai, pode contar,
que vou guardar em segredo,
e nem mesmo por brinquedo
a alguém vou revelar.
Guardo no fundo do mar,
enterrado na areia,
que nem mesmo uma sereia,
ou um bom escafandrista,
vão um dia por a vista
no seu segredo. Me creia!
O velho pai titubeia,
risca a pena no papel
faz um verso de cordel
e pede ao filho que leia,
enquanto degusta a ceia
e o vinho tinto caseiro,
sob a luz do candeeiro,
que se mistura ao luar,
e se põe a paginar
um passado aventureiro:
_Dia três de fevereiro,
do ano cinquenta e quatro,
estreava no teatro,
pra ganhar algum dinheiro,
um distinto cavaleiro,
amante da poesia,
que ainda não sabia,
pois o futuro é incerto,
que um dia, longe ou perto,
pelo mundo sairia.
Um tal Manuel Maria,
conhecido por Bocage,
com todo o rigor no traje
e também na montaria,
seguiu, a tanger a cria.
Foi boêmio, viajante,
desceu ao inferno de Dante,
enfrentou a inquisição,
foi preso e, na prisão
deu um passo mais adiante.
Carregou um meliante,
que também era poeta,
no varão da bicicleta,
até um lugar distante.
Beberam água da fonte
do seu tempo de menino,
tornou-se Elmano Sadino,
seu primeiro codinome,
passou sede, passou fome,
satirizando o divino.
Falou grosso, falou fino,
fez desaforo pro cão.
Imitou camaleão,
padre, pastor e rabino...
Dançou samba, tocou hino,
violão e cavaquinho,
fez a água virar vinho,
cajado virar serpente,
inda andou de trás pra frente,
sem conhecer o caminho.
Voo feito passarinho,
pelos ares de Lisboa,
levou Fernando Pessoa
passear no Pelourinho.
E pra não morrer sozinho,
nalgum conto lusitano,
se juntou a Herculano,
um cabra do Piauí,
e de lá até aqui,
vão carregando o piano.
E até o final do ano,
vão escrever em conjunto,
qualquer que seja o assunto,
em verso parnasiano.
E se não mudar de plano,
no ano que se aproxima,
vão procurar uma rima
pro Raimundo de Drummond
e assim, em alto e bom som,
dar um fim à obra prima.
E pra não sair do clima
vão coçar, em redondilha,
o saco, o pé da virilha...
pouco abaixo, pouco acima...
Descascar laranja-lima,
jogar a casca pra riba,
afogar o Parnaíba,
num soneto de Camões
e rio Solimões,
nalgum frevo de Capiba.