Um outro olhar
Eu saí do interior
Até a minha cidade
Confesso que chateado
E sem um pingo de vontade
Pois tinha enjoado o caminho
Da sempre mesma paisagem.
E de repente uma voz
No meu ouvido falou
"Deixe de você ser besta,
Tenha atenção, por favor
E olhe com outro olhar
Aquilo que nunca olhou".
Eu vi uns pés de ipês
Bem floridos e copados
Cores roxas e amarelas
Me deixou maravilhado
Olhei aquela beleza
Que eu nunca tinha olhado.
Eu vi um João-de-barro
Em um trabalho delicado
Moldando sua moradia
De um jeito dedicado
Olhei tanta perfeição
Que eu nunca tinha olhado.
Eu vi uma campo verdinho
Cheio de bicho pastando
As ovelhas saltitavam
Como quem se está brincando
E os cavalos relinchavam
Como quem se está cantando.
Eu vi um pé de mangueira
Cheia de fruta madura
Pipira e muita curica
Comiam aquela fartura
E os caroços que caem
Com a terra se mistura.
Vi um bando de urubus
Em um total desespero
Repuxando carnes vivas
De ainda vivo cordeiro
Porque a fome é mais cruel
Que o suspiro derradeiro.
Eu vi uma cobra passando
E naquele susto meu
Quis logo matar o bicho
Só que ao ver o olhar seu
Percebi que ao invés da cobra
O animal era eu.
Eu também vi uma garça
Em um certo momento
Balançando suas asas
Cortando o céu pelo centro
Parecia que seu voo
Era quem criava o vento.
E ao entrar na cidade
De longe vi a lagoa
O vento que lhe soprava
Chacoalhava uma canoa
Revelando um paraíso
Fosse pra qualquer pessoa.
E foi lembrando da voz
Que outra hora escutei
Que prometi pra mim mesmo
Com clareza eu afirmei,
Vou olhar com outro olhar
Pra tudo que nunca olhei.
Daniel Oliveira
@eu_ca_com_meus_cordoes.