CABEÇA DE CUIA

[Para Luiz Martins de Morais, o Luiz Dicosa,

que desde os tempos de menino é meu amigo

de caçadas e das boas estórias]

[Lenda do Piauí]

A estória é escabrosa,

Do tempo de menino,

Coisa mesmo do cão,

Como conta o Firmino,

De um garoto terrível,

Que matou a mãe dormindo.

O nome dele é Crispim,

Moleque muito raivoso,

Era pobre, o desgraçado...

Pra comer ficou nervoso,

Uma sopa rala demais,

Em dia muito chuvoso!

Morava em um barraco,

Às margens do rio Parnaíba,

Quando a mãe ofereceu,

Sopa com osso outra vez,

Isso muito o enfureceu...

Todos os dias do mês?

Na mãe um osso jogou,

Acertando sua cabeça,

A coitada já tombou,

Que o pior não aconteça,

Lá se foi a esperança...

Morte antes que anoiteça!

Mas antes da mãe morrer,

Rogou-lhe uma maldição,

Que mesmo sem ele querer,

Nas águas do rio irá vagar...

E a cabeça dele ia crescer,

Como uma cuia a boiar!

A mãe de Crispim também,

Disse naquela maldição,

Que o filho desgraçado,

Só seria assim libertado,

Se devorasse então

Sete virgens, constatado!

Tinham que ser todas Marias!

Crispim assim enlouqueceu,

Ao rio Parnaíba ele correu...

E afogando-se, desapareceu!

Numa mistura de ódio e medo,

Foi-se o maldito, se escafedeu!

Seu corpo não se encontrou,

Mas a estória é assim tia?

Ô, não deixe sua filha Maria...

Lavar roupa ou banhar no rio,

Só de passar lá dá medo,

Dá espanto e dá calafrio!

Ele procura as virgens...

Mas mata quem encontrar,

Vira até as embarcações,

Destroça os corações,

Pra fazer o Crispim parar,

Só a força de sete dragões.

Ele procura as mulheres,

Pois sua mãe pensa ser...

Que veio ao rio Parnaíba,

Para assim lhe perdoar...

Mas, chegando perto pra ver,

A revolta é de doer!

Por isso mata a gente,

Que passa ali pelas águas,

E mais revoltado fica,

Com sangue muito quente,

Pois nunca devorou virgem,

Querendo ou por acidente!

Conheci Maria Quitéria,

Maria Salomé, Maria Teresa,

Maria do Coité, Maria Amélia,

Maria do Nelo e Maria Creusa,

Todas belas, vi lá na tuia...

Com medo do cabeça de cuia!

Morei perto do rio Parnaíba,

Esse desgramento nunca vi,

Mas ouvia sempre falar...

Minha mãe contava isso,

Que era pra eu me assustar,

E no rio não ir pra nadar!

A coitada tinha medo,

Que eu me afogasse,

Ela queria o meu bem,

Sem que eu me interessasse!

Cabeça de cuia num tem,

Tinha medo que eu o achasse.

Era pura lenda, eu já sabia,

Eu nem era virgem nem Maria,

O que o cabeça de cuia

Ia querer com um menino?

Mas até que me ajudou,

A deixar de ser traquino!!

Poeta Camilo Martins

Aqui, hoje, 25.11.2014

20h25min [Noite]

Estilo: Cordel rimado