A RESILIÊNCIA NORDESTINA
Por Gecílio Souza
O meu espírito repete
O que a cultura destaca
O caboclo do Nordeste
É pau que não se descasca
Quem sobreviveu no agreste
Virou pedra que não lasca
É rocha que não se inverte
É aço de sólida marca
Feito de barro e areia
Não foge de cara feia
Sua fibra ninguém tasca
Acolhe até o cafajeste
Mas repele sua inhaca
Do sotaque ao que se veste
A cultura ergue a placa
O acarajé e o croquete
Reabilitam a gente fraca
Anda de jegue e charrete
De carro, cavalo e vaca
Não reclama nem murmura
Mas carrega na cintura
Um facão ou uma faca
É simples e não marionete
Na enrolação não embarca
Ao explorador se converte
Somente o vira-casaca
Humilde, não ergue o topete
Mas não foge da fuzarca
Na inteligência compete
Com o esclarecido monarca
É símbolo de resistência
Tem bondade e inteligência
Na cultura se destaca
Não aceita o cassetete
Nem ordem de algum babaca
Faz do jegue caminhonete
Sua mala é a própria saca
Repele a quem se intromete
Com o preconceito tarasca
Pondera, argumenta e reflete
Em enredo não se enrasca
Se tiver de brigar, briga
O que tem de dizer, diga
Quando está feito a macaca
Paga a passagem e o frete
Jamais pula a catraca
Enfrenta prova e teste
Sem a ladainha prosaica
Contesta, não se compromete
Com a discriminação carrasca
Bom na poesia e na raquete
A literatura ele abarca
O cordel e a poesia
Formam a sua companhia
E o repente lhe demarca
Seu cérebro é um disquete
O raciocínio não se atraca
A pesquisa ou a enquete
Lhe atribui urucubaca
Não crê em crise sem peste
Nem em farra sem ressaca
Desconfia de quem promete
Pois não aceita pataca
O seu estilo é diferente
Na chuva ou no tempo quente
Nunca desarma a barraca
Ele é gente e não maquete
Rejeita a pecha de ticaca
Luta muito e se diverte
Ainda põe o pé na jaca
Come sarapatel e espaguete
Buchada de bode ou paca
Brinca folia e basquete
Dribla até a renda parca
Enfrenta a prolongada seca
Mas tem ódio é da cerca
Que põe cangalha e bruaca
Luta até de canivete
É cidadão e não estaca
O brio que lhe reveste
Descortina a vista opaca
Do vendedor de chiclete
Até o juiz da comarca
Respeita o monge do Tibete
A criança e o patriarca
Reverencia o ateu
Respeita cristão e judeu
Se benze contra a mandraca
Não dá flores nem confete
Ao inescrupuloso panaca
Humilde e não se submete
À classe que lhe assaca
Violência do faroeste
O nordestino encarca
A ripa em quem se veste
Da bazófia e da matraca
Que a elite indolente
Não se meta novamente
Contra o nosso jararaca!
G. S.