VERSO E REVERSO
Por Gecílio Souza
Entre o autêntico e o hipócrita
Há uma discrepância brutal
O primeiro é um EU profundo
O segundo é superficial
O autêntico anda no meio
E o hipócrita na lateral
Autenticidade forma o ético
Hipocrisia forma o parcial
O autêntico é confiável
O hipócrita é miserável
LascIvo e sem cabedal
O autêntico busca a essência
O hipócrita é boçal
Para o autêntico duas coisas
Formam o elo fundamental
O hipócrita é veneno lento
Um escorpião cordial
O seu olhar é disperso
Sua fala é engodo verbal
O autêntico por sua vez
Reflete sobre o que fez
Se ocupa com o crucial
O autêntico vê e analisa
Com o recurso racional
O hipócrita é escorregadio
Se entretém com o banal
O autêntico é firme e cioso
Do próprio dever social
A reflexão sistemática
É o seu mote instrumental
O hipócrita é espertalhão
Joga a pedra e esconde a mão
E faz cara de general
O autêntico é criterioso
Mas não se atém ao formal
Redefine os conceitos
No particular e no geral
Para ele a existência
É uma dialética filosofal
Entende que a liberdade
Não é algo conceitual
Mas é a extensão do sujeito
Distorcida com preconceito
Pelo furor ultraliberal
Justiça é a distribuição
No modo proporcional
Um princípio equitativo
Que deveria ser trivial
Do ponto de vista ético
O Estado é marginal
Simulacro da justiça
Na essência é bestial
Ele mente e embroma
Dá pouco e muito toma
Não há Estado moral
O amor eclipsa a razão
Leva ao ato sentimental
O ódio é uma estupidez
Um veneno colateral
Que coloca o ser humano
Bem abaixo do animal
O hipócrita se vê alto
Feito um deus no pedestal
Suas preleções arrogantes
Lhe tornam pior que antes
Molecagem proposital
O autêntico se vê no chão
E o outro é seu igual
Para quem a humanidade
É uma corrente especial
O ser humano é um elo
Do vínculo estrutural
Cada ser ligado ao outro
Neste cordão umbilical
Há escolhas e destinos
Todos somos inquilinos
O mundo é o lar natural
Ética é ver de outra ótica
O valor primordial
A vida é o maior patrimônio
Mas é frágil como o cristal
A morte iguala a todos
Com a sua foice transversal
O hipócrita ignora isto
Porque ele é artificial
O autêntico tem consciência
Que há somente uma existência
Mas o mundo é plural
O autêntico interpreta o mundo
E reflete sobre o maior mal
A pauperização dos povos
Gera a miséria material
Ser humano versos ratos
Numa disputa trivial
Por espaços e alimentos
Nas ruas e na praça central
Enquanto no templo ao lado
O pregador auto-enviado
Recolhe o dízimo mensal
Proclama Deus e age contra
Numa contradição abismal
Prega a palavra com cuspe
E pega o irmão com o bornal
Louva, grita e se estribucha
Típico de peça teatral
Dos cidadãos da favela
Lhes tomam o essencial
Com suas pregações delirantes
Nos impõem seus governantes
Corruptos e sem cabedal
Legitimam e abençoam
Os donos do capital
Já os órfãos da previdência
Deixam em estado terminal
E o país se converteu
Ao mais cristão lamaçal
O evangelho invertido
É cartilha governamental
Juízes e procuradores
Se tornaram defensores
Da patranha ilegal
G. S.