O ASSALTO
E foi grande o reboliço,
Que se deu lá no cortiço
Depois daquele assalto
Quando dois desocupados,
Dois amigos e chegados
Resolveram dar um salto
Nas suas vidas vazias.
Dinheiro era o que valia,
Para ter óculos Ray ban
E aparelho celular...
O que pudessem comprar
Sem pensar no amanhã!
É Botar o dinheiro no bolso
Sem trabalho sem esforço,
E sequer suar camisa...
- É tirar de quem tem mais!
Dizia o “mala” rapaz,
Com o tom de quem avisa:
Nós iremos dar trabalho
Em nossa trilha de atalho,
Roubando e assaltando,
Colocando em risco;
Um destino bem arisco
E assim nós vai levando.
Pegaram um pau de fogo
E começaram um jogo,
Perigoso por demais...
Assaltaram uma Lotérica
Numa rapidez milimétrica,
E não tiveram mais paz
Com a polícia no encalço,
Pisando num cadafalso
Os meliantes correram...
E correram contra o tempo
Fugindo do contratempo,
De minutos que perderam
Quando de sua fuga;
Fugindo de uma rusga
Certa com a polícia...
Achando de se esconder
Sem tempo para correr
Embaixo de uma mobília,
De uma cama de Jirau
Na casa do nego Lau
E de uma dona Zefinha.
A polícia fez revista
Atrás de alguma pista
Mas não na casa vizinha.
Revistaram seu casebre
E ele como uma lebre
Bem que soube escapulir...
Já o seu companheiro
Teve o seu paradeiro
Descoberto. Não pôde fugir.
Ingênuos os assaltantes,
Ou espertos os meliantes,
Que foram se esconder
No aconchego do lar?
Onde uma sala-de-estar,
Pode a família envolver?
Veio o cerco da polícia
Com a sina de milícia
Gastar todo seu arsenal
Atirando no bandido
Que já estava rendido
Receando mal sinal.
Subira na cumeeira
Duma casinha na beira
Daquele cortiço
E tomou bala nos cornos
Como tivesse dez corpos,
Haja chumbo no toitiço!
Pediu arrego, se entregou.
E foi o que lhe restou
Fazer para não morrer
Todo crivado pelas balas
Da polícia e suas falas,
No cumprimento do dever.
Desceu daquele casebre
Quase ardendo em febre,
E com medo do pior.
Tremia, batia o queixo,
Temendo pelo desfecho,
Tremia como cipó!
Pelo ato tresloucado
De um assalto malogrado
Pelo azar e a má sorte,
Com a polícia militar
Doidinha pra lhe pegar
E lhe bater até a morte.
Ao ver um batalhão
De soldados e munição
Para provocar a guerra...
Esperando-lhe na rua
Para tirar a pele sua...
Tanto que caiu na terra.
Sacudido por um soco
Quase lhe deixa mouco,
Caindo de cara no chão...
E um chute nas costelas
E nos rins e nas patelas
E no meio do culhão!
Arremessado por um chute
De alguém que disse:- lute!
Recebeu um coice de mula!
Sequer deu um gemido
Ou choramingou ferido
Por ter levado uma surra.
Foi pancada nos flancos,
Nos rins de sair manco,
Para entrar na viatura...
Que a polícia com raiva
Não economiza na salva,
Nem tampouco na tortura!
É tanto chute no rim,
Que ele vai direitinho
Pra hemodiálise, na certa
Com os rins estourados
E alguns ossos quebrados
E hematomas na testa.
E foi pego pelas calças
Como se fossem alças
E arremessado na viatura.
Sangrando por orifícios
À custa dos sacrifícios
Daquela cruel tortura
Oh sujeitinhos safados
Essa raça de soldados
Que aproveitam a farda
Para bater e machucar
Para surrar e torturar
Quando estão na guarda.
O delinquente apanhado
Paga todos os pecados
Por se deixar aprisionar...
Apanha pela revolta
Dos soldados da escolta
Que lhe batem sem parar.
Foi assim que pegaram
E quase que rasgaram
Em dois, o Zé dentuço!
Chorando como menino
Acabrunhado e mofino
Afogando-se em soluço!
Já o amigo e comparsa,
E sócio em toda farsa,
Zé de Chico Bodeiro
Sumiu nas ruas estreitas
Da polícia às espreitas,
Desapareceu no facheiro!
A favela viu com aflição
Este seu dia de cão
Com aquela ação militar!
Com a polícia no pé
O cidadão perdeu a fé
De paz naquele lugar.
Rita tomava banho
Quando um estranho
Entrou no seu biombo
De palha de coqueiro
No meio do terreiro
Quase levando um tombo!
O banheiro improvisado,
Fê-lo ficar embasbacado
Com a nudez de Rita...
Perdeu a brutalidade
E parte da agilidade,
A sua característica.
Viu a Rita no manejo,
Graciosa no traquejo
Do uso do sabonete...
Passeando com a espuma
Em sua pele de pluma
Como fosse um joguete.
O cabo esqueceu a arma,
E até relaxou a guarda,
Diante daquela visão:
Da moça nua em pelo,
Tratando com todo zelo
E com total dedicação
A toda sua intimidade
Prêmio à cumplicidade
E à parceria e comunhão.
Parou ali petrificado,
E cometendo o pecado
De seu pensamento vão.
Queria ser um sabão
Espumando naquela mão,
Pelos dedos da mulata...
Que na maior ousadia
Ato contínuo percorria
Com um olhar de bravata
Acima de tudo provocador,
Extremamente sedutor
A provocar-lhe arrepio,
A instigar devaneios
Com a visão de seus seios,
Do seu desejo arredio
De possuir a fulana
E da forma mais sacana
Que pudesse imaginar...
Rita não se incomodou,
E até lhe provocou
Fazendo o Cabo suar.
Cobriu-se com uma toalha
Deixando mudo e sem fala
O antes raivoso soldado
Que adentrou seu quintal
Procurando um marginal
Com um semblante irado
Após aquela investida,
Saiu dali com a vista
Nublada e embaçada
Com a sua libido
Sem comprimido
Em alta e recompensada
Pelo teste cardiológico
Por que passara e lógico
Depois daquele flagra
Da moça em sua nudez
Exibindo a bela tez
E sua silhueta magra!
Depois de ficar à paisana
De montar campana
Para prender o assaltante,
A polícia desistiu.
Tanto que resistiu,
Desistia do flagrante!
O bandido se escondera
Sumira, se escafedera;
O negócio era esperar.
Era ficar de butuca,
Esperar que a cumbuca
Abrisse naquele lugar.
O fato é que o delinquente
Aconselhado por parente
Entregou-se ao delegado!
Este se recusou prendê-lo,
Recusou-se a atendê-lo
Por não ter um mandado.
Um mandado judicial
Vindo lá do tribunal
Que autorizasse o pior:
A prisão do delinquente
Do infrator inocente,
A prisão de um menor.
Porque era inimputável
E de forma considerável
Resguardado pela lei,
Seus direitos de menor
Por um futuro melhor,
Se eu entendo, não sei.
O bandido fora levado
Pela mãe e ia puxado
Pelas orelhas...
Feito menino obediente
Fora ele sorridente
Mexendo as sobrancelhas
Se entregar ao delegado
Que não se fez de rogado
Ao desistir da prisão.
Alegou não ter ordem
Para coibir a desordem
Cometida pelo cidadão.
Prenda doutor o rapaz!
Prenda em nome da paz
Pelo crime cometido.
Prendo não! Por quê?
Ta pensando o que?
Ele está arrependido?
O caso dele é de ação
Do juizado de menores, então
É para o conselho tutelar!
Se ninguém reclamou
É porque não burlou
A lei em seu lugar.
Leve o rapaz, seu doutor!
Disse a mãe do infrator
Com medo de represália;
Medo de vê-lo morto
Pelo caminho torto
Pisado pela sandália
De sua má companhia:
Jovens da periferia
Consumidores de droga.
Para alimentarem o vício
Jogam-se no precipício
Do crime sem volta.
Recuso-me a recebê-lo!
Disse o doutor Campelo
Encerrando o assunto.
Disse: - Entregue ao Juiz.
Leve a ele o infeliz!
Por mim, sinto muito!
Se matarem o menino
Juro pelo mais divino
Disse a mãe:- faço justiça!
Não querem prender
Talvez para cometer
Contra ele injustiça.
Fique tranquila senhora
Não chegou a sua hora,
Nem seu tempo de morrer!
Disse o delegado João
Que estava de plantão
Num enfado de doer.
Mas é bom não facilitar,
Que a coisa pode ficar
Difícil de entender.
Porque se der bandeira
E cair na roubalheira
A gente não vai amolecer.
Hoje é um menor infrator
Amanhã um grande dissabor
E um criminoso em potencial
Matando homens de bem
Enlutando a vida de alguém
Cassado como um animal
Com a polícia no encalço
Pelo grande passo em falso
Que deu na senda do crime
Entristecendo os parentes
Matando gente inocente
É gente que não se redime.
Talvez aquele meliante
Aquele jovem assaltante
Fosse produto do meio...
De uma vida de miséria
Gente pobre, gente séria,
Com governantes alheios
À educação e trabalho
À política de salário
E renda pra população!
Gente alheia à segurança;
Alheia à nossa esperança
De uma boa educação!
Criando com seu descaso
Desmantelo e atraso
A violência urbana
Com milhões de prisioneiros
Reféns de aventureiros
De uma sociedade sacana
Consumista e mercenária
Gente vil e perdulária
Crias do capitalismo,
Gerando nos dias atuais
Situações desiguais
No caminho do abismo!
E o sonho de consumo
Tem desviado de rumo
O jovem, sem educação!
Sem estrutura familiar;
Sem alguém pra educar,
Para dar-lhe formação!
E andar com pés no chão
Sem pensar na infração,
A cometer o delito
Por culpa da sociedade
Com sua impunidade,
Geradora de conflito!
Onde a mídia publicitária
A indústria imaginária
Criadora de bolsões
De sofrimento e miséria
Distribui como a artéria
Os desenganos e ilusões
Nos outdoors das cidades
Despertando a vaidade
Do homem contemporâneo
Que através do que é fútil
Demonstra mais o inútil
Que o lado espontâneo.
Um carro novo na porta
O status é o que importa
Mais que o estilo de vida.
Que aqui vale quem tem
Mesmo uma nota de cem
É condição garantida!
Assim pensa o capitalismo
Assim vive o socialismo
Assim sofre o cidadão
Com o aumento da violência
E de toda nossa dependência
Do consumo, meu irmão!
FIM