CORDEL DO AMOR QUE SE FOI - A TEUS OLHOS

CORDEL DO AMOR QUE SE FOI - Terceira Parte

AOS TEUS OLHOS

Se me fosse permitido

Ver por meio dos teus olhos,

Quiçá um clarear d’abrolhos

Revelasse-me quanto o Olvido

Ocultara do acontecido

Até o silêncio entreolhos

D’um amor enfim perdido...

Dá-me os teus olhos p’ra ver

Como viste o que não vi!

Mostra o que nunca entendi

Para de vez t’esquecer

Ou simplesmente poder

Não ter saudades de ti

Nem esperanças manter.

Deixa-me ver como vês;

Deixa-me olhar como olhas.

Entender tuas escolhas

E cotejar teus porquês

Ao me negares mercês,

Antes que tu te recolhas

À distância uma outra vez.

Em face de teus motivos,

Penso que possa livrar-me

Dos apelos de teu charme

Que os olhos me têm captivos.

Resta esconder-me dos vivos.

Ou senão viver ao alarme

D’estes teus lábios lascivos...

Não fosses do mundo o centro,

Cairia por ti de joelhos

E embora d’olhos vermelhos,

Te veria desde dentro...

Mas, se teus olhos adentro,

Vejo como por espelhos

Os azares que concentro.

Soberbo olhar que m’empedra,

Não o rosto: O coração!

Receio, ao par da ilusão,

Os sós amores de Fedra,

Cuja lendária paixão

Lembra a do tosco carvão

Que diamante se poliedra...

De facto, estrelas cadentes

Após riscarem o céu,

Deixam crateras ao léu

Com desastres surpreendentes

Que tornam selvas crescentes

N’um titânico escarcéu

Pedrinhas esplendecentes...

E do mesmo modo o amor

Após devastar minh’alma,

Levou-me a clareza e a calma

Soterrando-me em torpor...

Nada há mais em meu favor:

Eis quem te houvera a palma,

Hoje a teus olhos menor!...

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