BONECA RITINHA.
Ritinha filha de Zeca
cabrita de formosura
bem dizer uma boneca
da mais bonita costura
morena cor de melaço
garbosa ferro e aço
niquelada no chamego
faiscou no meu intento
relinchei feito jumento
perdido sem ter sossego.
Já não sabia mais nada
pensando só em Ritinha
varava a madrugada
e o tal sono não vinha
me valia da varanda
mode vencer a demanda
daquela luta cruel
mais quanto mais eu lutava
mais a Ritinha rasgava
o meu sonhar de papel.
Eu sou um cabra reimoso
desprovido de afago
nunca me dei por mimoso
sempre fui seco e vago
minha vida era pouca
e nunca abri a boca
pra beijar uma cabrocha
mais quando fitei Ritinha
danousse deu a morrinha
eu me virei numa tocha.
Fiquei com raiva e tonto
pensei mudar de morada
porem eu não tava pronto
pra topar essa jornada
pelejava e não podia
sentindo a ventania
dum não sei que assoprando
ate que não teve jeito
o moinho do meu peito
acabou foi se quebrando.
Foi caco pra todo lado
não deu tempo nem de juntar
eu tava apaixonado
sem força pra levantar
vendo tudo colorido
feito um doido varrido
sorrindo sem ver de que
fiz rumo pra casa dela
com uma flor amarela
fingindo ser um buquê.
Passei goma no tecido
engraxei o meu sapato
fiz um bigode torcido
fiquei bem em fino trato
comprei gravata de seda
tomei rumo da vereda
que dava pra casa dela
senti o chão deslizando
e lá vai eu caminhando
me declarar a donzela.
Enquanto eu caminhava
um colibri me seguiu
ele contente voava
com seu corpinho esguio
tão frágil e tão pequeno
tão belo e tão sereno
acompanhava apenas
vendo aquela magia
o colibri parecia
ser um anjinho de penas.
Eu fiquei ate contente
com o colibri amigo
que pensei, Deus tá na frente
eu não vou correr perigo
com seu Amor e Bondade
me fez essa caridade
de não prosseguir sozinho
liberando um bom feitor
esse anjo protetor
em forma de passarinho.
E assim segui andando
com o meu sonho dourado
sonhando sempre sonhando
um sonhar enamorado
cheguei ate a assobiar
desejando enviar
um canto antes de mim
e assobiei baixinho
como faz o passarinho
para a fêmea no jardim.
Eu me senti emplumado
parecia esta voando
feito um gavião cromado
em um vale flutuando
contemplei a natureza
vi um céu azul turquesa
cobrindo a serra todinha
que pensei, sendo eu Deus
daria os feitos meus
de presente pra Ritinha.
Desci a ladeira parda
como um valente fiel
o meu anjinho da guarda
pousou sobre meu chapéu
parecia avisando
pra eu não ficar sonhando
era hora de acordar
mais minha arrogância
não quis dá importância
muito menos concordar.
De coragem e flor na mão
dei de frente na choupana
já bem perto do portão
vi que a vida engana
na cadeira de palhinha
eu vi a minha Ritinha
contente em alvoroço
faceira cheia de prosa
se rindo toda dengosa
na frente de outro moço.
O moço sujeito rico
pelo jeito pelo couro
cigarro caro no bico
Com um anelão de ouro
um falar bem educado
era um doutor formado
desses lá do estrangeiro
não era assim como eu
que ate no sonhar perdeu
o seu amor verdadeiro.
Meu sonho teve seu fim
acordei envergonhado
envergonhado de mim
por um dia ter sonhado
com alguém que tanto amei
e que por isso sonhei
como um passarinho triste
que mais nada lhe consola
acordando numa gaiola
só com água e alpiste.
Eu joguei a flor no mato
minha gravata de seda
o meu sapato barato
e fiz de volta a vereda
voltei a ser bicho bruto
aquele mesmo matuto
que fui que sou e serei
porem agora comigo
tenho um terno amigo
um colibri que ganhei.
Hoje o tempo passou
o caso ficou pra traz
meu cabelo prateou
não sou aquele rapaz
sonhador apaixonado
hoje velho enrugado
chegando no fim da linha
tropeço na esperança
mais sem tirar da lembrança
minha boneca Ritinha.