Roça
Meu pai era boiadeiro
Cuidava dos bois no terreiro
Mas gado não era alimento
Vivia pastando sem medo
Na roça onde morávamos
Nenhum animal era comido
A horta que nos provia alimento
Comíamos sem arrependimento
O porquinho era de estimação
A galinha era pra ter adubo
Mas seu ovo também degustava
Com a gema e tudo
A água vinha das nascentes
Água pura e cristalina
Também tinha água ardente
Na quitanda da dona Evelina
Na roça a vida era simples
Não tinha luxo e mordomia
Acordávamos bem cedinho
Pra ver o nascer do dia
Os pássaros eram soltos
Nenhum preso na gaiola
Era só colocar o fruto na janela
Que logo vinham sem demora
Tenho muita saudade da roça
Do verde e do ar puro
Da comida no fogão à lenha
Da noite no escuro
Na época não tínhamos luz
Nem televisão
Olhar o céu e as estrelas, na noite
Era nossa diversão
Contávamos histórias de cordel
Em volta da fogueira
Meu pai tocava pífano
Minha mãe era violeira
Naquele tempo todos eram unidos
Mesmo sendo conservadores
O respeito era o mínimo
Pro cabra adulto e pro jovem menino
Sinto muita falta da roça
Dos bichos e da natureza
Da vida na simplicidade
A lembrança não sai da cabeça
Minha mãe foi curandeira
Curava com ervas da terra
Aprendeu as receitas com a biza
Que era curandeira mais velha
Os vizinhos quando doentes
Corriam lá na porteira
Chamavam às pressas a mãe
Pra curar todas as doenças
O remédio eram as ervas
Não tinha nada de química
O alimento vinha da terra
A água era limpa
Hoje tudo mudou
Não é mais como antigamente
O respeito se acabou
O alimento é diferente
As pessoas não olham pro céu
A TV é a diversão
O menino não sabe o que é cordel
Nem nunca tomou chá de hortelã
Os pássaros foram presos,
Não cantam em liberdade
Nem mais a água, que as pessoas tomam
É de verdade
Que saudade da roça,
Que saudade!