NO REBOLIÇO DO PENSAR
Faz um calor arrochado
Dentro do meu pensamento
Tô carente de um vento
Pra pensar mais arejado
Pois o pensar abafado
Mina um suor reimoso
Salgado e pegajoso
No nó da imaginação
Gastura quente do cão
Dum formigar cabuloso.
Já se formou um catombo
No veio do meu cangote
Meu pensamento folote
Dá topada leva tombo
Zoa que nem marimbondo
Por dentro da cucuruta
É aperreio de luta
Que atanaza meu ser
Sobejo de um padecer
Castigo fio da puta.
No arrudiar da vista
Fico meio alesado
De olho arregalado
Vendo a coisa mal quista
Por isso eu fiz a lista:
É trupicão no anseio
É murro de aperreio
Biliscão de agonia
Desespero todo dia
É ruma de sonho feio.
Eu já li tudo que pude
Pra saber tudo que tenho
Mais foi pouco o enpenho
E não tem quem me ajude
Trepeça de atitude
Que me deixou só o caco
Comendo pó de buraco
Sem resposta verdadeira
Chega a me dá coceira
No pixaim do sovaco.
Se olho o céu distante
Vejo quanto sou pequeno:
Toco de pau no terreno
Lodo preso na vazante
Mulambo de retirante
Cafuçú esfarrapado
Bicudo, beiço rachado
Bucho cheio de lumbriga
Sabugo véi de espiga
Seco, murcho desprezado.
Já apelei para tudo
Já pipoquei minha fé
Já consultei um pajé
Cabrunco e tabacudo
Que fumou em um canudo
Feito de uma taquara
Mais foi em vão a seara
Este pião do capeta
Era só um picareta
Zonando da minha cara.
O meu pensar engebrado
Carece de polimento
Mode brilhar o intento
Do meu querer desejado
Eu já tô aperreado
Sem ter bizú amoroso
Nesse pensar vagaroso
Que catuca minha mente
Com gosto de aguardente
Danado de amargoso.
Tô vendo a hora eu morrer
Com o miolo queimado
Sem achar o procurado
Sem ter pra onde correr
Sinto em mim escorrer
A pingueira do cansaço
Molhando meu pé descalço
No chão frio do vazio
Sem o fogo no pavio
Lascado só o cangaço.
Nessa arenga medonha
Nesse bafafá safado
Eu me sinto acochado
Que nem palha de pamonha
Uma coisa me arranha
Empanzina, faz um bolo
Tô andando feito tolo
Besta, leso e cagão
Tô vendo a hora o cão
Carregar o meu miolo.
Já chegou o fim do dia
E eu continuo oco
Azogado no sufoco
Com a cabeça vazia
Tô feito cego de guia
Que só anda arrastado
O meu pensar envergado
Amolece no estio
Sofre seco no fastio
Manco, besta e ariado.