A morte do amor.
Em uma noite gelada
Sem sequer um cobertor
Ouvi da mulher amada
Que eu era um impostor
E da rua enlameada
Eu seria morador.
Perguntei como seria
Nossas vidas, separados,
Ela disse que eu iria
Sempre ser um derrotado
E que nunca eu poderia
Ter uma mulher ao lado.
Perguntei onde eu errava
E por que não me falou
Ela disse que eu olhava
A vizinha que mudou
E porque não trabalhava
Vagabundo é o que sou.
Decidi então calar
Para ouvir acusações
A mulher a me acusar
Repetindo palavrões
Dizia pra me afastar
Sob tapas e safanões.
Apesar da desventura
Eu tentava argumentar
Eu jamais tive aventura
Sempre respeitei meu lar
Se andei em noite escura
Foi para ir trabalhar.
Minha mulher repetia
Que eu sou um sem amor
O que sinto em demasia
É somente desamor
E que a minha alegria
É poder provocar dor.
Vi meu mundo desabar
Ante tanta acusação
Resolvi sair do lar
E morar em um porão
Assim mesmo eu fui parar
Numa cela de prisão.
Acusado de ladrão
Não pude me defender
Ninguém estendeu a mão
Não queriam nem saber
E o soldado valentão
Diz que fiz pra merecer.
Sofri muito na cadeia
Mas de nada eu reclamei
Sob a luz de uma candeia
Escrevi o que passei
Não falei da vida alheia
Sobre mim eu me calei.
Certo dia um homem justo
Veio a mim e perguntou
O porquê do alto custo
Que a vida me cobrou
Nessa hora tive um susto
Mas de nada ele acusou.
Esse homem perguntou
Qual a minha atividade
E porque na cela estou
Se não falto com a verdade
Ele disse que eu sou
Preso da sociedade.
Não existe lei no mundo
Pra mudar uma verdade
Ela poder estar no fundo
Da falsa realidade
Mas até o moribundo
Sabe a dor da falsidade.
Ele disse: eu sou juiz
Eu cheguei aqui há pouco
A sua pena eu não fiz
Eu não faço ouvido mouco
A sua conduta diz
Que você não é um louco.
Vou lhe dar a liberdade
Revisar a sua pena
Apagar toda maldade
A justiça assim ordena
Você fala só verdade
E verdade não condena
Os meus dias foram tantos
Que esqueci a minha idade
Invoquei todos os santos
Em busca de caridade
Apesar dos desencantos
Eu voltei para a cidade.
Encontrei minha mulher
Rezando uma ladainha
Repetindo que não quer
Viver a vida sozinha
Se ainda eu lhe quiser
Será só e sempre minha.
O meu coração doeu
Ouvindo o que foi falado
Mas o amor que era meu
Também foi crucificado
O que ela não me deu
Hoje é parte do passado.