A CERCA DO MEU QUINTAL

Hoje me veio uma lembrança

Não sei explicar porque

Lembrei de uma imagem fria

Em uma manhã sombria

Onde crianças brincavam

Pulando dando risada

e eu apenas os via

Olhava por uma flexa

Da cerca do meu quintal

Caminhões, carros, bonecas

Para mim era irreal

Meus olhos fitava a cena

Me sentia tão pequena!

Que suspirava serena

De volta pro meu real

A vontade era imensa

De tocar aqueles brinquedos

Mas só olhava de longe

E desejava em segredo

Eles me ofereciam

e só pra aumentar a minha dor!

Quando eu dizia que sim

Eles diziam não dou!

Assim o tempo passava

E eu ali a observar

As vezes dava um sorriso

Pra com eles me enturmar

Mas eles nem se importavam

E continuavam a brincar

Eu era ainda criança

Me perguntava porque

Eu não podia brincar

E ter aquele lazer

Da cerca do meu quintal

Chorava silenciosa

Até minha mãe gritar

Entra menina dengosa

Atendia minha mãe

Fingindo não perceber

A tristeza que sentia

Em não me oferecer

Os brinquedos do vizinho

Bonecas, bolas , carrinhos

Isso eu não podia ter

Durante toda a semana

Era essa a rotina

Minha mãe lavava roupa

E quando estava no varal

Eu corria para a flexa

Da cerca do meu quintal

Observando aquela cena

Então fiquei a pensar

O que eu podia fazer

Para esse quadro mudar?

Não tinha nenhum recurso

Nem por onde começar

Foi quando me descobri

E comecei a lutar

Minha família era grande

Também grande a nossa fé

Papai, mamãe e Lourdinha

Laíde, Chico e Zefinha

Salete, Cida e Zezé

Eu, Helena e Bezinha

Tereza, Naná e zé.

Loudinha foi a primeira

Ajudou na criação

Cuidava dos pequeninos

Com muita dedicação

Meus pai saia pra roça

Minha mãe também seguia

Os cinco filhos mais velhos

Também eram bóias frias

Meu pai era agricultor

Padeiro e frandileiro

Professor de coração

Folclorista e escrivão

Ensinava à quem quisesse

Sair da escuridão

Eu ajudava no ofício

De ensiná-los a ler

Pois eu já tinha aprendido

A ler e a escrever

No salão da padaria

A noite a escola surgia

E no final de semana

Era aquela cantoria

No ano 63

Com oito anos de idade

Eu já sabia que um dia

Mudaria de cidade

Se continuasse ali

não tinha prosperidade

Num lugar de pernambuco

Sem ter nem eletricidade

Tinha uma vontade imensa

De crescer, de estudar

Ficava então esperando

Que a luz pudesse brilhar

Até me tocar seus raios

Dai então despertar

Do sertão de Alagoas

Vieram nos visitar

Uns parentes que moravam

Há muito tempo no lugar

Então meus pais consentiram

Que eu pudesse me mudar

Deixei a minha família

Parti em busca de mim

Enfrentei muitas barreiras

Mas nada me fez desistir

Nem tirar do meu caminho

O que eu queria pra mim

Aos 11 anos de idade

Sai da terra natal

Muitas vezes eu chorava

De saudades do local

Deixei para trás o tempo

Das minhas tristes lembranças

O tempo da minha infância

Da cerca do meu quintal.

Obs ( cordel premiado no Concurso de Prosa e Versos Luiz B. Torres, pela Academia de Letras Ciências e Artes -APALCA. Ano 2005.

Judite Rocha
Enviado por Judite Rocha em 17/09/2018
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