O CACHACEIRO
Por Gecílio Souza
Tenho andado refletindo
O quanto a cachaça é malvada
Ela faz o chachaceiro
Perder o rumo da estrada
É cliente vip do bar
Um inimigo da enxada
Compra fiado e não paga
Deixa a conta pendurada
Cada dose que ele toma
Parece tiro de espingarda
Cai aqui, cai acolá
Feito caça mal atirada
Tropeça nas próprias pernas
Como vaca mal sangrada
Caminha em zigue zague
Do centro para a beirada
Aqui e ali uma rasteira
Lhe dá uma desandada
Toco, pedra e meio fio
Ele dá chute e pesada
O corpo em desequilíbrio
Cai em cima da calçada
Resmungando e babando
Não tem mais noção de nada
Às vezes desaba no choro
Outras vezes dá gargalhada
Se levanta tonto e trôpego
Com a visão embaçada
Chega em casa valentão
Geralmente à madrugada
Mal acerta com o portão
Chuta os degraus da escada
Suas ideias são tão firmes
Quanto firme é sua pisada
Não consegue tirar o sapato
E calça a sandália trocada
O odor se exala dos pés
A casa fica infestada
Chega com a braguilha aberta
E a camisa desbotoada
Faz ameaças à esposa
Escorraça a criançada
Porém a sua valentia
É um festival de zoada
Os vizinhos dão notícias
Da doméstica trapalhada
O cachaceiro adormece
Com a pança estufada
Amanhece cuspindo azedo
Com a cara amassada
Hematomas na cabeça
No lombo sinal de pancada
Na boca não vai escova
O seu banho é uma chuvada
Toma pinga no boteco
E em casa tem guardada
Ele é motivo de chacota
Figura desacreditada
É intruso e descarado
Assedia a mulherada
O que fala é sem proveito
Sua cara é muito safada
Pelas ruas da cidade
Sua vida é mal falada
Já não tem vontade própria
Sua mente está viciada
Pode ser que já esteja
Com cirrose avançada
Essa alma está enferma
E precisa ser tratada
É sofrida e lamentável
A vida da mulher casada
Cujo marido é pinguço
Ela está na encruzilhada
Apostou no casamento
Mas a aposta deu errada
A mulher do cachaceiro
É uma santa sacrificada!