O RATO DO CAMPO E O RATO DA CIDADE

Num campo muito distante

Vivia um rato pacato,

Mesmo sem ser importante,

Achava tudo um barato

Viver sem correr perigo,

Comendo favas de trigo,

Boa era a vida – de fato!

Sua rotina era singela,

Sem os bens materiais,

Não conhecia panela,

Fogão, cozinha, algo mais,

Mas vivia em liberdade,

Partilhando, com amizade,

Seus bens com os animais.

Ele tinha um amigo,

Esperto e interesseiro

Que morava na cidade,

Bem gordo e bem faceiro,

Que em visita ao colega,

Apesar de achá-lo brega,

Ficou lá o dia inteiro.

O ratinho recebeu

O amigo com alegria,

Há tempos que por ali

Tanta festa não se via,

Numa conversa animada,

Fizeram uma caminhada

E pararam ao meio dia.

A fome havia chegado,

Era melhor almoçar

Favas, trigo e ervanços,

Era o que tinha pra dar,

Em sua simplicidade,

Aquilo era, na verdade,

Dos deuses o melhor manjar.

Terminada a refeição,

O visitante agradeceu,

Pois com tanta cortesia,

O amigo lhe recebeu,

Disse-lhe : - Meu caro amigo,

Peço-lhe, venha comigo,

Comer do pão que é meu!

Na casa onde fiz morada,

São tantas as iguarias,

Como coisas diferentes

Gostosas, todos os dias,

Eu te digo com certeza,

Comendo aquelas belezas,

Tu terás melhores dias.

O visitante falava

E demonstrava firmeza,

Convenceu o seu amigo

A ir, com delicadeza,

Pensando que ele também

Poderia se dar bem,

Com os mimos da natureza.

Quando chegaram à cidade,

Foram direto à cozinha

Pra comer carne de porco,

Queijo, cabrito e galinha,

Manjar até se fartar,

Sem sequer adivinhar

Que a má sorte já vinha.

Comeram de tudo um pouco,

Foi enorme a euforia,

Estavam bem à vontade,

Um cantava, o outro ria,

Nisto, ouviu-se um barulho,

Alguém trazendo um embrulho,

Começou a agonia!

O cozinheiro chegou

E viu tamanha comilança,

Os dois ratinhos bem fartos,

Cada qual com maior pança,

Falou: - Em um só segundo

Eu vou matar todo mundo,

Acabo com a festança.

Mas o rato da cidade,

Ligeiro e muito astuto,

Pensando em não morrer,

Não deixar mulher de luto,

Embrenhou-se pelo mato,

Quem ficou pra pagar pato,

Sem correr - foi o matuto.

Não conhecia a saída,

Por isso todo ferido

Pelas surras que levou,

Com o corpo combalido,

Uma das patas quebrou,

Acho até que desmaiou,

Pensou que havia morrido.

O amigo da cidade

Vendo-o naquele estado,

Disse-lhe: - Bom companheiro,

Preciso ser perdoado,

Ouça-me com atenção,

Voltemos lá pro fogão

Pra fazer um bom grolado.

Vamos botar pra quebrar,

Fazer um grande alarido,

Comer até nos fartar

Sem a ninguém dar ouvido,

Fazer raiva até matar

E de uma vez desbancar,

O cozinheiro enxerido!

Porém o rato do campo

Respondeu desapontado:

- Meu amigo, Deus me livre,

Digo-te muito obrigado,

Galinha, porco e capão

Não valem um só tostão,

Quero viver sossegado!

Vou voltar pro meu cantinho

E viver na paz do Senhor,

Não preciso de riqueza,

Comer coisa de valor,

Lá eu tenho alimento,

Sinceramente, eu lamento,

Ficar?! Só se burro eu for!

Guarda pra ti a comida

Que tens aqui na cidade,

Sou feliz com minha vida

E juro, falo a verdade,

Não brinco com minha sorte

Pra correr risco de morte

Por uma futilidade!

...

( Este cordel foi elaborado com base na fábula " O rato da cidade e o rato do campo "atribuída a Esopo - fabulista grego do século VI A.C).

Maria do Socorro Domingos

Publicação anterior:

Recanto das Letras em 30/01/2012

Código do texto: T3470499:

Mariamaria JPessoa Pb
Enviado por Mariamaria JPessoa Pb em 27/04/2018
Código do texto: T6320835
Classificação de conteúdo: seguro