Minhas raízes
Eu sou filho da poeira
Do mato e da capoeira
Da terra e do sertão
Sou filho da pobreza
Da dúvida e da incerteza
Do solo deste chão
Carrego comigo a ciência
Tenho plena consciência
Das lembranças do passado
De toda a minha infância
Da tão grande importância
Do meu caminho andado
Sou filho da simplicidade
Do campo e da cidade
Dos tempos idos matutos
Da colhida aconchegante
Do povo rude ignorante
De atitudes um tanto bruto
Do trabalhador rural
Do pescador de manguezal
Comerciante e salineiro
Sou filho da terra rachada
Da lavoura e da enxada
Do solo quente braseiro
Sou filho da natureza
Do matuto sem esperteza
Do caboclo acabrunhado
Da seca e da fartura
De uma vida pobre dura
Do plantador de roçado
Sou filho destas raízes
Carrego comigo as diretrizes
Tenho o mundo como professor
Na pele está tatuado
A foto do meu passado
Que exponho por onde for
Sou frequentador da bodega
Do retalho e da entrega
Do cereal a granel
Do cantador do sertão
Das oitavas a Quadrão
Ditadas em belo cordel
Sou filho do sol nascente
Das tardes e do poente
Das noites enluaradas
Do sol quente a torrar
Da lua a enamorar
As ondas de madrugada
Sou filho da terra molhada
Do cheiro das fezes jogadas
Como estrume seco ao chão
Dos berros das cabras e ovelhas
Do mel do favo das abelhas
Da tapera de palha sem oitão
Da enxada no chão a escavar
As covas rasas pra plantar
Das cantorias na varanda
Do martelo agalopado
Dos belos versos rimados
Das rodas de ciranda
Sou filho do boi bumbá
Do reisado e do pião no ar
Da paquera e das serenatas
Da famosa cachaça serrana
Dos gumes da cana caiana
Das noites de farinhadas
Sou filho do rio e do mar
Sou produto desse lugar
Tenho o DNA nordestino
Com o meu linguajar popular
Oxente eu gosto de falar
Carrego as manhas desde menino
Sou nordestino da gema
Amo versejar em poema
Sou autêntico do Ceará
Amante dos versos em cordel
Admirador da lua e do céu
Não sei muito bem falar
Sou grande admirador
Do violeiro e trovador
Das pelejas em cantoria
Fã de Patativa abençoado
Do poeta Cego Aderaldo
Leandro Gomes e Tião Simpatia
Admirador de Gonçalo Ferreira
Não chego aos pés nem esteira
Seguidor de todos cordelistas
Sem bem conhecer as métricas
Gosto da rima poética
Estes são os reais artistas
Sou fã do gado no curral
De toda a vida rural
Do leite quente mugido
Das frutas caídas ao chão
Do famoso arroz com feijão
Do milho assado e cozido
Amo pamonha e canjica
Tomar banho na bica
Tapioca e baião de dois
Não dispenso uma peixada
Uma saborosa caranguejada
Chá de burro e cuscuz de arroz
Uma paçoca deliciosa
Não tem coisa mais gostosa
Como galinha à cabidela
O sabor da Maria Izabel
É um néctar dos céus
O seu cheiro na panela
Gosto de ouvir brega
Fantasia a mente carrega
Adoro forró e baião
Reviver todo o passado
Relembrar os sonhos pensados
Gravados em meu coração
Quem não lembra da seriguela
Da criança com boca banguela
Com lábios ingênuos a sorrir
Comer açúcar com farinha
Das “peladas” à tardinha
Das garapas de murici
Da saborosa cajuína
Da luz da lamparina
Do ferro a carvão pra engomar
Do fogão a lenha ou a carvão
Das noites de luar no sertão
Dos pirilampos a iluminar
Do idoso no cachimbo a pitar
Das rendeiras com o seu tear
Das latas d’águas na cabeça
Das lavadeiras na beira do rio
Da quentura no tempo de estio
Da lida que recomeça
Do cheiro do mato molhado
O verde a brotar no roçado
A água inundando o chão
Das festas juninas
Do beijo da linda menina
Das fogueiras de São João
Toda esta cena relatada
Em minha mente gravada
É motivo de grande emoção
Relembrar todo o passado
Deixa-me extasiado
Acelera o coração
Vivi nesse mundo passado
O orgulho deixado de lado
Nos confins daquele torrão
Reinava sempre a bondade
Não existia matança e maldade
Era tranquilo o nosso rincão
Brincava de cavalo de pau
Imitava o lobo mau
Jogava bola descalço
Predominava só a verdade
A honradez e a seriedade
Não cabia quem era falso
Tomava banho de cuia
Nas missas orava aleluia
Depois acompanhava o leilão
Vibrava com aquela disputa
Gostava de toda permuta
No bolso nenhum tostão
Presente em todas as novenas
Acompanhava toda a cena
Com fé no santo do altar
Sonhava ser coroinha
Frequentava a igrejinha
Nem sequer sabia rezar
Sonhava um dia ser atleta
Almejava ganhar uma bicicleta
Raridade para um menino pobre
Calcanhares com rachaduras
Naquele chão de pura fervura
Que de calor a terra encobre
Vivia um grande dilema
Sem dinheiro para o cinema
Ver os filmes de faroeste
Para entrar não tinha acesso
Naquela época era sucesso
Em todo o nosso nordeste
À noite pra passear
Bem longe da beira mar
Ficava perto das canoas
Uma meiota com sardinha
Misturava com farinha
Depois ficava numa boa
São essas as minhas raízes
Foram momentos felizes
Vividos em meu passado
Alicerce para a vida
Aprendizagem absorvida
Nesse cordel registrado
Agradeço ao soberano
A minha vida nesse plano
E por tudo o que passei
Por toda a dificuldade
Por me mostrar a verdade
E as fases que atravessei.
Autor: Joabnascimento
Data: 22/04/18
Recanto das Letras: Joabnascimento
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