SAUDADES DO SERTÃO

Rir quem sente alegria,

chora quem tem saudades,

lamenta quem já perdeu

um amor de verdade,

sonha quem inda lembra

das coisas da tenra idade.

Todos os tons de cores

cheiros e sons matutinos

do tempo vago e distante

de quando eu era menino

estão cá na memória

como canto em surdino:

A noite devagarinho

estendendo o seu manto,

a obscura coruja,

o seu temível canto

espalhando tristeza

como um triste acalanto.

O rústico cazebre

e sua singeleza:

o velho candeeiro,

a lamparina acesa,

desafiando as trevas

lá de cima da mesa.

A lua cheia sorrindo

no meio da madrugada,

o galo atorduado

cantando na alvorada,

o cachorro magrelo

latindo ali por nada.

As manhãs infindas

à sombra da mangueira

brincando de atirar

pedras de baladeira,

de pular, correr

E outras mil brincadeiras.

O bule prateado

cheinho de café,

beiju de mandioca,

farinha na cuité,

o carinho da mãe,

o afago e o cafuné.

O velho rádio a pilha

tocando uma canção,

o gatinho miando

querendo só atenção

papai fazendo um cesto

mamãe ao pé do fogão.

As duas bilhas d’água

em cima da bilheira,

a aranha tecendo

A tarde inteira

uma teia sem fim

no alto da cumeeira.

O riacho sereno

límpido, transparente

correndo em silêncio,

lento, tão calmamente,

contornando as pedras

Feito uma serpente.

O caminho de areia,

a antiga cancela,

a casa ao pé do morro

tão pobre e singela

exibindo margaridas

Em suas janelas.

A vida no roçado,

aquela vida dura:

poeira de carvão,

cinsa sol e secura.

feito casca de coco,

igual a rapadura.

O céu azul e prateado

sob a imensidão

capim seco e palmeira

cobrindo o árido chão,

como se fosse hoje

ainda lembro do sertão.

Adão Brandão
Enviado por Adão Brandão em 13/03/2018
Reeditado em 13/03/2018
Código do texto: T6278885
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