MINHA ANDORINHA.

Seu doutor tome cuidado

Que não sou o seu parceiro

Não me faça de coitado

Se não lhe faço primeiro

Eu sou um homem honesto

Não nasci pra comer resto

Nem comer do seu pirão

Não me venha com insulto

Não zombe deste matuto

Pra não entrar no facão.

Sua condição e a minha

Difere no patamar

Sou comedor de farinha

E você de caviar

Mas minha farinha é pura

É branca e tem fartura

De gosto e vitamina

Já essa sua dieta

É fraca, pouca e não presta

E sai tudo na urina.

Trabalho de sol a sol

Feito cativo calado

Mas cá no meu arrebol

Eu sou muito respeitado

Nunca enganei ninguém

Sou da paz, pratico o bem

Sem precisar ter anel

Já o senhor sem postura

Tem anel de formatura

Mas não cumpri seu papel.

Mas vamos deixar pra lá

Essa nossa diferença

O que me fez chegar cá

Foi a malvada doença

E doença meu amigo

É certo o pior castigo

Que pode ter uma sina

Mas eu ainda acredito

Que Jesus nosso Bendito

Inventou a medicina.

Inventou a medicina

Com toda sabedoria

A sua Palavra ensina

Sem nenhuma heresia

"A quem muito será dado

Muito será cobrado"

É a lei franca e justa

Quem aqui faz aqui paga

E assim abri a vaga

Pra pagar a sua custa.

Já faz uns cinco anos

Que vim no seu hospital

Crente cheio de planos

Para combater um mal

Lhe mostrei a minha amada

Fraca, doente cansada

Tossindo, sentindo dor

Mas o senhor sem conduta

Me enganou na consulta

Tá lembrado seu doutor?

Se lembra daquele olhinho

Que abria e fechava

Parecendo um passarinho

Que há muito não voava?

Mas o senhor nem ligou,

Falou pouco se apagou

Para minha andorinha

E disse rindo da luta:

Que doença de matuta

Findava em "doencinha"

Rabiscou no seu papel

Um remédio esquisito

Que pra lê nem bacharel

Entendia o escrito

Mesmo assim fui na farmácia

E falei com dona Acácia

Que me disse o que era,

Me despachou a consulta

Que paguei com muita luta

Mas não passou de quimera.

Eu sou um homem rude

E não possuo estudo

Porem fiz tudo que pude

Fiz do nada um tudo

Pra não faltar o remédio

Que por o seu intermédio

Gastei o pouco que tinha

Mas de nada adiantou

O que o senhor passou

Não sarou minha andorinha.

Eu quero lhe perguntar

Se fosse com o doutor

O senhor ia frequentar

Hospital de agricultor?

Por certo essa pergunta

Já tem a resposta junta

E eu lhe digo ligeiro

Sem ter medo da resposta:

O senhor ia uma bosta

Corria pro estrangeiro.

Já eu corri pra capela

Buscando um socorrer

Fiz promessa comprei vela

Pra meu amor não morrer

Disse para seu vigário

Que daria meu salário

A santa da devoção

Se ela me ajudasse

E de uma vez curasse

A minha santa paixão.

Mas como o senhor sabe

Pobre não tem valia

E o puco que lhe cabe

Qualquer sereno esfria

Então sabe como é...

Fui perdendo minha fé

Ficando quase um ateu

Ate que Deus se lembrou

E no meu trilho botou

Um com mas fé do que eu.

As quatro horas da tarde

Gritou na minha cancela

Era um anjo de bondade

Que veio acudir ela

Na figura de amigo

Veio tirar do perigo

Minha meiga andorinha

Que já sem pluma penava

Queria voar não voava

Com a doença que tinha.

Aquilo foi um milagre

Foi de fato salvação

Quem tem sua fé consagre

Dentro de seu coração

Porque o que vou contar

O doutor vai escutar

Imaginando a cena

E depois que eu acabar

Você é quem vai julgar

Qual será a sua pena.

Quando cheguei na cancela

Tive a grata surpresa

Ao vê a figura bela

Da meiga madre Tereza

E pensei com meus botões

Quem lhe deu informações

Sobre minha andorinha

Será que eu tô sonhando?

E nisso fui escutando

A sua voz de rainha.

"Boa tarde meu filhinho

Será que eu posso entrar?

Eu vim vê seu passarinho

Tenho gosto de encontrar,

Garanto que serei breve"

Caminhou em passo leve

Direto pra camarinha

Abriu um riso de luz

Traçou o sinal da cruz

Vendo minha andorinha.

O quarto ficou sereno

E eu calado, dormente

Ao vê um ser tão pequeno

Ser pela fé tão potente

Algo me veio aos molhos

Enchi de água os olhos

Fui tomado de emoção

Que confesso que parei

E ali me ajoelhei

Em fervorosa oração.

Quando os olhos abri

Quase levo uma paulada

Pois não é que eu vi

Minha andorinha sentada!

Nela eu vi virtude,

Estava sã com saúde

Rindo e me chamando

Foi ai que eu notei

Que aquilo que passei

Foi Deus comigo falando.

Porem na minha mesinha

Tava escrito um recado

Que a minha andorinha

Tomara o remédio errado

Mas que eu desse perdão

Ao homem sem coração

Covarde e embusteiro

Que por ter a má condulta

Inventou uma consulta

Tão somente por dinheiro.

Por isso voltei aqui

Seu doutor do anelão

Você com seu bisturi

E eu com o meu facão.

Tá com medo seu doutor

Desse pobre agricultor

Que não tem uma ruela?

Agora é só nos dois

Feito feijão com arroz

Juntos na mesma panela.

Diga qual é a sentença

Que eu devo lhe punir

Pela sua indiferença

No seu modo de agir

Tá calado é, seu peste!

Não quer passar pelo teste

Agora pede clemência

Vou dá fim nesse embate

Permitindo que lhe mate

Sua própria consciência.

Agora preste atenção

Porque eu já vou partir

Mas tome essa injeção

De remorso a lhe ferir

Dane-se o falatório

Fique com seu consultório

E sua vida mesquinha

Que foi salva por um triz

Que eu vou viver feliz

Junto com minha andorinha.

Ebenézer Lopes
Enviado por Ebenézer Lopes em 05/02/2018
Reeditado em 05/02/2018
Código do texto: T6245562
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2018. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.