O MEU RIMANCEIRO * Admoestação
Dói-me este tempo parado.
Caminhos sem caminheiros…
Que relógio abandonado
sem ter corda nem ponteiros!...
No movimento aparente,
desde a manhã ao sol pôr,
tece o sol incandescente
um manto de luz e cor.
As memórias soterradas
sangram nas papoilas rubras
que sonham desesperadas
o dia em que as redescubras.
A sono solto dormindo,
teimas em não dar por nada.
Nem sonhas o sonho lindo
que há em cada madrugada.
Nas noites de estio ardente,
cantam grilos ao luar
na sinfonia estridente
que em vão te quer despertar…
Mas como um justo tu dormes,
como se fossem tranquilos
estes escombros disformes
que desesperam os grilos.
O que é dos outros cobiças,
numa inveja envergonhada…
e, alheio ao que desperdiças,
acabas por não ter nada.
Tens as nozes do rifão,
p’ra parti-las não tens dentes…
Se és assim por condição,
assume-a e não te lamentes!
José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 28 de Janeiro de 2018.