Não me chame pelo nome.

Não me chame pelo nome

Pois sequer eu mesmo o sei

Esqueci meu sobrenome

Dele nunca me lembrei

Mesmo tendo sede e fome

Nada eu lhe pedirei.

O meu tempo já passou

Sou um velho sem um lar

A saúde escasseou

Pouco eu consigo andar

Sou alguém que fracassou

Nenhum foi meu prosperar.

Tenho mágoas desta vida

Tudo a mim ela negou

Foi pesada na subida

Nem um pouco aliviou

Foi ingrata na descida

Quando o meu pranto rolou.

Deixou marcas bem profundas

Cicatrizes bem à mostra

Promoveu mil barafundas

Pôs o peso em minhas costas

Mostrando a face iracunda

Disse que de mim não gosta.

Levou toda a esperança

Só deixou o frio orvalho

Retirou a tolerância

Me deixando sem trabalho

Para mim deu só vingança

Promoveu provas de ordálio.

Fez um rio de tristeza

Fez um mar de amargura

Escondeu toda beleza

Me prendeu na sinecura

Amarrou-me à fortaleza

Onde está minha tortura.

Fez um rio caudaloso

Mas não fez nenhum remanso

Apesar de cauteloso

Não tive nenhum avanço

Sempre fui laborioso

Mas nunca tive um descanso.

Eu pensei que a minha dor

Fosse coisa passageira

Mas suporto o desamor

Vindo da família inteira

Eu lhe dei muito valor

Mas pra ela sou toupeira.

Vi o meu suor jorrar

No trabalho que fazia

Pra levar para o meu lar

O pão que precisaria

Hoje ouço o comentar

Que eu nada mais valia.

Esquecido pelo tempo

Caminhando sem parar

Consegui chegar ao templo

Onde fui me confessar

La eu encontrei o vento

Que queria me escutar.

Disse a ele que sofria

Num deserto de amor

Perguntei se poderia

Acabar com aquela dor

Ele disse que daria

Um remédio ao sofredor.

Deu-me um cálice de vinho

Numa taça emoldurada

Eu fiquei ali sozinho

Consegui pensar em nada

Quando o vento de mansinho

Disse vem meu camarada.

Eu segui o seu conselho

Adentrei naquele templo

Passei perto de um espelho

Refletindo um bom exemplo

Nele vi os meus cabelos

Prateados pelo tempo.

Vi então o meu destino

Sendo exposto ao meu olhar

Descobri que o desatino

Que estava a carregar

Era a curva do caminho

Que eu devia endireitar.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 24/12/2017
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