João Rosado
João Rosado tinha um sonho
desde quando era menino
que aos poucos conquistou
apesar do pouco tino
aprendeu com mestre Preto
o mentor do seu destino
tudo um dia começou
na montagem de um sino
João Rosado o marceneiro
dando vida ao seu intento
resolveu ser construtor
foi trabalhar num convento
uma turma no telhado
e a outra no cimento
mestre Preto lhe pediu
ir atrás de um sargento
vá atrás de um sargento
peque aqui esse dinheiro
vá comprar na rua Quinta
na casa do marceneiro
custa em torno de "duzento"
um jumento é mais dinheiro
na feira de Livramento
se comprar um macho inteiro
prontamente João Rosado
na rapidez de seus trinta
varou a rua ligeiro
com o rosto cheio de tinta
me responda meu amigo:
Deus permita que não minta
onde eu compro um sargento
em loja da rua Quinta?
Zé Peneiro, cão astuto
botando o dedo no queixo
engoliu um riso frouxo
que quis sair por desleixo
se quiser, levo até lá
me permita que eu deixo
não fica na rua Quinta
mas na rua João Aleixo
e levou João até lá
apontando o local
dizendo: é aquele em frente
de uma banca de jornal
pobre João caiu direto
na esparrela do mal
pois o pobre analfabeto
não tinha nem o mobral
e na rua João Aleixo
lá havia um quartel
que o Zé mentiu assim
lá vende tudo a granel
de sargento a serrote
de martelo a cinzel
tudo o que quiser comprar
é só levar no papel
um tanto desconfiado
saiu o João marceneiro
atravessando a rua
e conferindo o dinheiro
erguendo a vista pra cima
tentando ler o letreiro
mas de nada adiantava
desvendar tal paradeiro
quando entrou lá no quartel
foi logo desconfiando
da proposta de Peneiro
mesmo assim foi nele entrando
erguendo o chapéu da testa
com sua mão foi coçando
balbuciando palavras
foi logo assim cochichando:
isso aqui não se parece
com uma loja de ferragem
mas parece um sobradão
com uma larga garagem
foi entrando porta adentro
sem lhe faltar a coragem
se deparou com um guarda
que amarelou sua imagem
bom dia, meu caro amigo
eu vim comprar um sargento
“vi” dizer que ele só custa
um pouco mais de “duzento”
se for verdade eu compro
muito mais caro é o jumento
que mestre Preto comprou
na feira do Livramento
o soldado enfurecido
com tamanho desrespeito
abriu a palma da mão
e espalmou no seu peito
o pobre “véi” do João
caiu no chão de mau jeito
e se ergueu meio zonzo
falando assim: que mau feito!
aqui não vende sargento
mas tem gaiola pra burro
suma daqui bem depressa
senão lhe cubro no murro
pobre João saiu correndo
debaixo daquele esturro
entrou no convento triste
dizendo assim no sussurro:
vou pedir a mestre preto
que não me mande mais não
ir atrás de um sargento
que peça a outro então
eu não sei que mal eu fiz
pra ter levado um surrão
ô funcionário estressado
manobrado pelo cão!...