CHEGADA DE BOB MOTTA NO CÉU DE ADELE
Bob Motta se encantou
Foi para o céu de Adele
Chegando lá se encontrou
Com a sua segunda pele
Aquela que o coração
Além da vida compele
Obrigando sua alma
A buscar santa guarida
Junto àquela que lhe foi
A grande musa em vida
E hoje, em outro plano,
Seu existir revalida.
Porque poeta não morre
Apenas muda de plano
Muito acima da visão
Precária do ser humano
Terra não comensurável
No santo meridiano.
Entre astros e estrelas
Bob Motta procurou
A sua querida Adele
Nos sete céus encontrou
Em linda senda florida
Sua alma penetrou.
Um anjo receptor
Com seu ar celestial
Vestindo gibão de couro
Cantando seu madrigal
Esperava o velho Bob
Na entrada ogival
Em arco bem curvilíneo
Onde se lia o letreiro:
“Bem vindo seja o poeta
Do Nordeste brasileiro
Com a viola matuta
E seu cantar altaneiro.”
Eis, porém, mais que ligeiro,
Surge um ser que o deixa mudo
Na comitiva de frente
Vem o Câmara Cascudo
Folclorista de Natal
Que foi seu mestre em tudo.
Cascudo abraça o poeta
Na aura misteriosa
Tendo na mão um livrinho
Na outra mão uma rosa
Convidando para um chá
E dois dedinhos de prosa.
No papo, mestre Cascudo
O saúda pelo escrito
Do livro “Bob e Adele,
Causos de amor infinito.”
Seu derradeiro trabalho
Com seu tema favorito.
Bob, nessa ocasião,
Chorando de alegria,
Indaga por sua Adele
A quem faz tempo não via
Cascudo chama o porteiro
Que logo confidencia:
“Adele está na segunda
Travessa do bem-querer
Vizinho à Rua do Amor
Casa do resplandecer
Fazendo curso intensivo
Logo vai aparecer.”
Recém chegado precisa
Sofrer certa reclusão
Entra numa quarentena
Antes de ter a visão
Para incubar outra vida
Nessa nova dimensão.
Aproveitando esse tempo
Bob Motta visitou
Francisquinho, Zefa Paula,
Muita gente encontrou
Pessoal lá da Ribeira
A todos cumprimentou.
Reviveu Rosa de Ouro
Lá na Quinze de Novembro
Onde tomou muita cana
Da confraria era membro
Na boate de Alabama
Nas festanças de dezembro.
Viu a Rua de São Pedro
Virgínia e Maria Boa
Otávio, Raquel, Aninha,
Andou nas praças, atoa,
Onde antigos colegas
Saudavam sua pessoa.
A mais pungente saudade
Sentiu de todos dali
De Natal da boemia
Ensopado de siri
Comeu com muito bom gosto
Na peixada Potengi.
O João Ricardo Correia
Um amigo potiguar
Lembra que o velho Bob
Com a vida quase a escapar
Voltou do coma e contou
Em livro o que viu por lá.
Isso ocorreu já faz tempo
Agora foi de verdade
Não volta mais pra narrar
A grande felicidade
De encontrar sua Adele
E matar sua saudade.
Mas o anjo diligente
Voou pela imensidão
Do tempo/espaço celeste
Pra fazer a narração
De como Bob encontrou
Sua mais forte paixão.
Isso se deu no salão
Da Espiritualidade
Onde as almas se encontram
Quando têm afinidade
Em seus pendores e instintos
Conforme a Grande Verdade.
Sem o imediatismo
Da vida material
Delia e Bob se consolam
Em busca do ideal
Das chamadas “almas gêmeas”:
A convivência eternal.
Veio o anjo-escrivão
Na mesa tomou assento
Para anotar do poeta
Seu manso depoimento.
E assim ele contou
Todo o acontecimento:
“Conheço a menina Adele
Desde a mais remota era
A primeira vez que vi
De maneira mais sincera
Antes de se apresentar
Eu já sabia quem era
Porque, sem medo de errar,
A alegria tão dela
Me contagiou de um jeito
De uma forma tão bela
E me encantou num abraço
Onde o amor se revela.
Ela vivia nos sonhos
Do meu futuro e passado
Era como um anjo bom
Que me foi apresentado
Mas eu sabia que era
Antes de me ser mostrado.
Então, quando este poeta
Enxergou pra muito além
Montado nas coisas simples
Que a inspiração lhe vem
Descobriu que Adele sempre
Foi seu verdadeiro bem.
Acertamos parceria
No negócio do amor
Onde sou eternamente
Seu credor e adorador
Ela detém cem por cento
Das ações ao portador.
Vida mistura com vida
Amor se enrosca no amor,
Palavras não dizem nada
Da imensurável dor
Quando Adele partiu
A vida perdeu a cor.
No ofício do poeta
Eu fiquei sem meu farol
Como me reinventar
Sem me aquecer no seu sol?
A vida perdeu o encanto
Caminhei pra o arrebol.
Nós precisamos de luz
Pra o tempo não se apagar
Se esse luzeiro nos falta
O que mais há de restar?
Foi assim que sucumbi
E nesse céu vim parar.
Pescador procura o peixe
A alma procura a luz
Minha Adele me guiou
Para a casa de Jesus
Onde hoje aqui me encontro
Em plaga que me seduz.”
O Anjo Mestre, ouvindo,
Assim se pronunciou:
“Já não haverá mais morte,
O mundo velho passou,
Enxugue as lágrimas dos olhos”,
No Livro Santo anotou:
“Continuem essas almas
Unidas no infinito
No plano espiritual
De acordo com o veredicto
Como prêmio eternal
Por este amor inaudito.”
Assim, o Deus de Isaac
O mesmo Deus de Abraão
Recebeu Adele e Bob
Na sua santa mansão
Pois o amor é mais forte
Que a decomposição.
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