CORDEL DO ACASO
Gira mundo de um jeito veloz
gira o homem a pomba branca
como a linha gira o retroz
não importa se a mula manca
gira e leva cada destino
ao lugar de pertencimento
o mais velho e o menino
para e fora e para dentro
do redemoinho do acaso
que por acaso acaso é
carregando nos braços
o homem e a mulher
que juntos ou separados
cada um no seu viver
de noite entre os braços
que cada um quer oferecer
vai a vida na valsa triste
ou alegre do cantador
valsa de pés descalços
porém cheios de amor
na invenção do sentimento
que enche de cada um o peito
daquele que se diz honrado
no outro tão cheio de defeitos
na criança que nasce e cresce
para um dia ser feliz
mas numa quarta padece
por não poder ser o quis
e no gingado do molengo burro
se equilibra o que vai vender
aipim caju jenipapo e churros
pros que vivem de comer
e mui dileto o douto poeta
esfalfa a fala num proseado
de incendiar quem num se presta
a querer ser versejador danado
que por acaso passa a palavra
de passagem pelo sertão
onde mingua gota de chuva que cala
do lavrador seu coração
e nem por isso a coragem some
do calango que corre na areia
do deserto que engole o homem
e o replanta que nem teia
de aranha que cria seus filhotes
bem acima lá do alto
pra não morrer esmagada pelo choque
do bruto carro no negro asfalto
que por acaso é dirigido
por mãos de copos e tira-gosto
a ziguezaguear feito zumbido
de abelha que só mel tem posto
no vai da vida que sugere imensidão
cada ser sendo um planeta que vaga
dentro do cercado de cada coração
que sente mas que ao amor se cala
e por acaso distribuída é a forte luz
a quem quer ver bem claro no escuro
mesmo que lhe ponham o negro capuz
ou que apaguem na lousa o risco puro
da letra que versa sobre todos nós
que andamos às voltas feito caranguejos
que vão em busca do som da voz
que conta tim tim por tim tim cada segredo
que canto neste por acaso cordel
que de enfiada feito colar que se enfia
na linha do horizonte desenhada no papel
que recebe em seu ventre esta cordelírica poesia...
Fecho este por meio desta ação
que vem da mente e se enfia no braço
que braceja sem remo e sem embarcação
no rio sem nome que nomeado se chama acaso...