TRUQUES DA SEMANA SANTA
Por Gecílio Souza
Escrevo mais e falo menos
Para poupar minha garganta
Além do mais, escrever
Me apraz e me encanta
E a quantidade de assuntos
É tão vasta que espanta
A disposição de abordá-los
Que trago comigo é tanta
Que a escrita é meu café
Meu almoço e minha janta
A poesia é o meu cônjuge
Comigo deita e se levanta
No fértil silêncio da noite
Me envolve com sua manta
Nas profundezas da mente
As ideias ela planta
E hoje em particular
Instou-me a pronunciar
Sobre a célebre semana santa
Quando a crença a razão suplanta
O mundo se escurece
O dogma apaga a luz
A substitui pela prece
Um preposto do senhor
A todo momento aparece
Propagando o catecismo
Que à multidão emburrece
Quanto mais se multiplicam
A ignorância se recrudesce
O esquema é tão complexo
Que a maioria desconhece
Muita gente vai dormir
Do jeito que amanhece
Em absoluta abstinência
O corpo é o vilão que padece
Já na aleluia os errantes
Reiteram o que faziam antes
E a realidade permanece
Tudo então se desvanece
E o “Deus” volta aos nirvanas
Os seguidores se enaltecem
Sorrindo batem as pestanas
Um ano inteiro é composto
De cinquenta e duas semanas
Mas somente uma é “santa”
Em que a menores filigranas
Sugerem a presença divina
Nas intersecções mundanas
As outras cinquenta e uma
Pela lógica são profanas
Os desejos se extravasam
Quantas ocasiões bacanas
Seguem uns matando os outros
Persistem mansões e cabanas
Mas ainda restam os domingos
Dos desabafos e choramingos
Pelas estripulias sacanas
A páscoa e as tradições romanas
São sutis formas de poder
Que dominam as consciências
E o povo sem perceber
Se dispõe de boa fé
Aos esquemas obedecer
Mas no lusco fusco da vida
É outro o seu proceder
Cinquenta e uma semanas
Fazem o que desejam fazer
Às ocultas tudo pode
O supremo não vai se ofender
E o supremo é tão “bom”
Que jamais deseja “ver”
Diversão, bebida e carne
Orgias, sexo, prazer
Afinal a quaresma se foi
E agora sobra para o boi
Que havia se livrado de morrer
Não consigo absorver
Essas crenças capciosas
É Deus pra lá, Deus pra cá
São meras enfadonhas prosas
Que se deslizam das bocas
De almas sujas e sebosas
Que no dia a dia praticam
As ações mais horrorosas
Nos templos, nas ruas e nas casas
Distribuem panfletos e rosas
Quantas mentes doentias
Quantas línguas venenosas
Aparências encantadoras
E essências maliciosas
Por isso a todos dirijo
Minhas solicitações respeitosas
Reclamem, xinguem ou sorriem
Mas por favor não me enviem
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