IDADE DA RAZÃO
Pode ser que você queira,
mas também pode ser que não,
seguir nessa fila ordeira
rumo a boca do dragão.
Até parece brincadeira
ver toda essa multidão
sendo passada em peneira,
sendo moída em pilão.
Gente sempre em corre-corre
na esperança de viver.
Gente cujo sangue escorre
sob a força do poder
do vampiro louco e porre
que sem ser só pensa em ter.
Gente que ninguém socorre
pois quem tentar pode morrer.
Como o gado na campina,
qual fiéis em procissão,
minha gente se imagina
sem poder de decisão.
pois o medo que a domina
tolda-lhe a mente e a visão
e qualquer coisa fascina
a minha gente sem razão.
Essa gente que se cala
e quando fala nada diz,
gente que chora na sala
e na rua canta feliz.
Gente que de dor se entala
mas bate palmas, pede bis.
Gente que ainda se embala
nos sonhos da meretriz.
Gente simples e tão sofrida
que não sabe o quanto é forte,
que vive tão dividida,
que só se encontra na morte
na rasa cova medida
com palmos do mesmo porte.
Minha gente conduzida
que nunca fez sua sorte.
Gente que ensina às crianças
o que aprendeu dos mais velhos:
a viver de esperanças;
a curvar sempre os joelhos;
a evitar as mudanças
e manter calma ante os relhos.
Gente que espera a bonança
mas traz os olhos vermelhos.
Minha gente! eis a hora!
É preciso dizer não!
é preciso jogar fora
toda essa podridão!
Já o homem novo aflora
como semente do chão!
Façamos nós sem demora
nossa Idade da Razão.
Belém, maio de 1978.