Descanse em paz
Pra cumprir o meu dever
Abracei um ministério
Pouco tinha a oferecer
Não agi de modo sério
Hoje estou a escrever
Pra sair do cemitério.
Falhei no dever de casa
Não cumpri o combinado
Vi que o tempo não atrasa
O que fiz já é passado
Meu fogão já não tem brasa
E eu estou abandonado.
Eu pensei que a oração
Me livrasse do outro lado
Onde não há solidão
Ninguém fica endividado
Todos têm obrigação
Ninguém diz está errado.
Fiz caminho de retorno
Pra pagar o que devia
Usei roupa com adorno
Com a qual sempre benzia
Comi pão com leite morno
Coisa que não conhecia.
Num deserto de emoções
Eu plantei minha semente
Fiz diversas plantações
Semeadas em solo ardente
Porém as perseguições
Impediram ir em frente.
Rezei culto e ladainha
Fiz despacho na calçada
Apesar da crença minha
Não servir para mais nada
Porém era a que eu tinha
Pra marcar a minha estrada.
Muitos passos caminhei
Sempre preso àquele chão
Em lugar algum cheguei
Para minha frustração
Do meu lar me afastei
Ao meu par neguei o pão.
Fiz o meu próprio destino
Com o qual me acostumei
Comecei desde menino
A fazer o que pensei
Apesar de pouco ensino
A muitos eu enganei.
Tentei ser um convertido
Quando quis me confessar
Descobri estar perdido
Sem ninguém a me esperar
Sozinho e desiludido
Assim consegui chorar.
Vi o meu passado em chama
Vi meu pai me aconselhando
Minha mãe tirando a lama
Que eu estava carregando
Ouvi o chamar da dama
Que eu estava enganando.
Ouvi mina mãe rezando
Aos pés da Virgem Maria
Era uma mãe olhando
Para a outra que sorria
Uma a outra consolando
Pelo que acontecia.
Eu fiquei ali parado
Sem saber o que fazer
E de tanto encabulado
Eu pensei nada saber
Quando vi alguém ao lado
Mostrando o meu proceder.
Fui aos poucos meditando
Sobre o que eu recebi
Fui assim me preparando
Alguns livros também li
Fui assim me aprimorando
Pra fazer o que ouvi.
Vi o meu preceptor
Anotar numa prancheta
Qual o preço do favor
Que existe na ampulheta
Que explica o que é valor
Sem usar uma caneta.
Eu segui sem entender
Tão estranha explicação
Perguntei para saber
O sentido da lição
Descobri que o sofrer
É o calvário do ancião.
Resolvi então seguir
Esse meu preceptor
Que não tinha aonde ir
Não sabia o que é rancor
Nunca iria competir
Para disputar amor.
Fui com ele caminhando
Todavia sem falar
Ele disse me olhando
Já é hora de parar
Cada um vá procurando
Um lugar pra descansar.