A corrida do tempo
Fui vencido pelo tempo
Mas venci a minha idade
Fiz da vida um passatempo
Não saí da puberdade
Apesar dos contratempos
Vivi com a felicidade.
Eu vivi em pensamentos
Mas cheguei a caminhar
Tive o meu divertimento
Gostei muito de cantar
Quando veio um sofrimento
Eu sentei pra descansar.
Vi o sol no meu caminho
Mas tentei me esconder
Em geral andei sozinho
Assim foi o meu viver
Livre como um passarinho
Sem lugar pra se esconder.
Na caverna mais escura
Eu buscava a minha luz
La havia água pura
Para quem fazia jus
Não havia vida dura
Tudo a na da se reduz.
Vi o meu tempo passar
Mas não sinto envelhecer
Tudo que posso pensar
Sou capaz de entender
Se alguém me perguntar
Sou capaz de responder.
Sei que nada vou saber
Limitando a perguntar
Mesmo assim vou entender
O viver sem reclamar
Nesse modesto escrever
Aprendi como pensar.
Mesmo só no meu cantinho
Vem alguém me procurar
Alguém diz que sou sozinho
Tenta me alimentar
Eu lhe dou o meu carinho
Mas recuso a aceitar.
Eu vivi a duras penas
Suportei a minha dor
No planeta fui apenas
Um modesto viajor
Que andava com centenas
Que fugiram do labor.
Levo o meu tempo às costas
Mas não posso reclamar
Coisa há que me desgosta
Mas consigo tolerar
E a alguém com as mãos postas
Sei que devo respeitar.
Quando chego na cozinha
Sinto cheiro de comida
Mas a casa está sozinha
Quase toda demolida
Ouço vozes da vizinha
Mas ela fica escondida.
Quando passo no chiqueiro
Ouço o meu porco roncar
Ele come o dia inteiro
Isso faz para engordar
Porém ele é trapaceiro
Pede pra não o matar.
Quando passo no curral
Ouço berros do bezerro
Que pastava no quintal
Assistindo o seu enterro
O patrão diz que afinal
Criar boi foi o seu erro.
Vejo fogo na lareira
Mas não há nenhum calor
Vejo água na chaleira
Porém não sobe valor
Também vejo a cristaleira
Toda suja de bolor.
Todo o meu conhecimento
Eu guardei a sete chaves
Não troquei por alimento
Mas deixei dentro das caves
Ensinei fazer fermento
Sem usar fezes de aves.
Não estou arrependido
Fiz o bem que me propus
Hoje sou um esquecido
Entretanto eu tenho luz
Pra mostrar para um caído
Que o destino não é cruz.
Levo o meu anjo da guarda
Aos lugares mais tacanhos
La eu sei que alguém aguarda
Dar prazer para ter ganho
Mas alguém na retaguarda
Diz que não somos estranhos.
E nessa corrida louca
Sem saber onde chegar
A virtude é sempre pouca
Muito há pra conquistar
Nossa arma está na touca
Que usamos pra sonhar.