Peões
I
Meu senhor, minha senhora!
Vou pedir por essa gente.
Mas deles, não sou agente
Nem tampouco, devedora.
Mas se rogo, sou autora,
Paciente de leseira
Ou quem sabe de cegueira.
E peço, não por galhofa,
Muito menos por farofa;
Valha-me Deus, a canseira!
II
Altas horas no palanque,
Da família tão ausente.
A pensar na cama quente,
No armário urso se tranque,
Vai pra casa num arranque,
Visitar gleba meeira.
A comparte dá rasteira,
Pondo água na fervura:
Estou que é só tontura,
Valha-me Deus, a canseira!
III
Seis da manhã, já na rua,
Sem paletó nem gravata.
De chinelo, alpercata,
Sem a Mercedes perua,
O coitado se extenua.
Depois vem a bebedeira
No mercado, na ladeira,
Sarapatel com cachaça.
Beijo em banguela na praça,
Valha-me Deus, a canseira!
IV
Com nome limpo na praça,
Exibe a cara sem medo.
Bom caráter desde cedo,
Só lhe desgrenha, a devassa:
Que pedra em vidro estilhaça.
Pra ficar na dianteira,
Esconde bem a lixeira.
E, pau no lombo do rival,
Sujeito falso, sem moral.
Valha-me Deus, a canseira!
V
Mas, o tempo é fumaça.
Logo se juntam no ato
Para repartir o pato:
Que não há bom sem pirraça,
Poder sem boa trapaça.
Porque a vida é arteira,
Um dia passa a rasteira.
Que pato tem carne dura
E requer tempo e quentura
Valha-me Deus, a canseira!