SEVERINO E O CANDIDATO.
Mãe certa vez me contou
Como foi meu batizado
Antes deu ter completado
Um ano que me fundou
Ela disse: "eu vou
Falar com o padre Justino
Pra batizar meu menino"
Me levou com choro e dengo
levei água pelo quengo
E fiquei por Severino.
Severino sim senhor
O nome que mãe me deu
E hoje aqui tô eu
Severino "o eleitor"
Casado e agricultor
Desde o tempo de Arrais
Mais hoje eu não sou mais
O eleitor que acredita
Na bandeira que agita
O pano dos imorais.
Agora vai ser assim
Com a idade que carrego
Eu mando pra caixa prego
Quem vier pedir a mim
Voto para maruim
Viver as custas da gente
Que mando esse indecente
Pra onde não tá querendo
Que hoje eu tô fervendo
Não tem quem me aguente.
Eu já avisei lá em casa
Se acaso alguém chegar
Pra ninguém se abestalhar
Com falação que atrasa
Com enganação que só vasa
Na peneira da promessa
Não quero ouvir conversa
Pois esse ano eu corto
Se um peste me pedir voto
Escangoto essa trepeça.
Eu já tô acostumado
Ouvir o "tinha" a dizer
Que o povo vai comer
Do bucho ficar dobrado
Vai vestir pano importado
Ter moradia decente
Que vai fornecer semente
E terra pra plantação
Mais é só enganação
De um covarde que mente.
Da cancela ele não passa
Se passar tome cuidado
Que esse cabra safado
Comigo não bota raça
No meu chão não faz graça
Já tô cheio de ilusão
De dá o meu voto em vão
Pra virar pó lá na furna
Que ele tome na urna
Com campanha e eleição.
Só chega perto abraçando
Como se fosse um amigo
De muito tempo antigo
E vai logo perguntando:
"O que é que tá faltando?
Tô aqui pra lhe ajudar"
E manda o outro anotar
O nome e o endereço
Todo voto tem um preço
O que ele quer é pagar.
Se atrepa num caminhão
E chama os bestas pra perto
Espera o momento certo
Pra falar da eleição
Chora aperta a mão
Abraça e dá risada
Oferece uma buchada
Com forró bode e cachaça
Mais nada disso é de graça
Depois a conta é cobrada.
Diz que se for eleito
Vai consertar a capela
E não vai faltar mais vela
Pra os santos em seu pleito
Que o padre vai ter direito
Ao um jumento pra trasporte
Ainda vai dá suporte
Pra o vinho da comunhão
Que vai dá pra o sacristão
Uma novilha e um garrote.
Vai deixar o cemitério
Como se fosse uma praça
Com portão e com vidraça
Parecendo com um império
E não sera um mistério
Se o rádio e os jornais
Não filmarem os locais
Para botar na enquete
Ser vista na internet
E nas redes sociais.
Que vai fundar um asilo
Pra o matuto abandonado
Com direito a milho assado
E a torresmo a quilo
Sera uma vida de estilo
Com rezador de plantão
E a principal refeição
Vai ser bucho e tanajura
Vai dá nova dentadura
Pra se mastigar feijão.
O candidato "morrinha"
Pra ganhar voto e mais nada
Prometeu pra matutada
Um caminhão de farinha
Queijo de coalho e galinha
Cadeira pra o clube atlético
Cura pra epilético
E pra adubar a frescura
Prometeu ter rapadura
Pra o cabra diabético.
É um vilão mentiroso
Com a cara de calango
Piolho de orangotango
Baiacu venenoso
O teu discurso reimoso
Tem a intenção traíra
É como um jogo que vira
E virando vai jogando
Vendo a bola girando
Na roleta da mentira.
Não tenho medo da guerra
Enfrento qualquer boiada
Não vou dá a minha enxada
Pra cavarem em outra terra
Quem a semente enterra
Vai colher o que plantou
Se o fruto que brotou
O sabor não lhe agrada
Eu não posso fazer nada
Mais o meu voto não dou.
Fique com seu partido
Que é melhor pra nos dois
Pra não misturar os bois
O cercado é dividido
Atenda o meu pedido
Eu não gosto de mandar
Mais se nada mudar
Nessa forma de eleição
Tu vai ter voto é do cão
Porque o meu não vou dá.
Sou igual a jararaca
Quando sou enganado
Depois do bote dado
O cabra toma na jaca
Sou feito fio de faca
Cortando o bucho do engano
Que venha pra causar dano
A esse eleitor honrado
Deixo o voto sepultado
Na cova do desengano.
Pois é daqui pra frente
O cabra comi medido
Se quiser ver seu partido
Respeitado e decente
Deixe de mostrar o dente
Com o falso sorriso
Porque eu não preciso
De uma falsa esperança
Eu só tenho confiança
É no chão aonde piso
Candidato aloprado
Sem miolo e sem sustança
É chocalho que balança
No pescoço do Estado
Tem o som roco abafado
Que quase ninguém escuta
É covarde para a luta
Do povo não é companheiro
Parlamentar maloqueiro
É fraco e sem conduta.
Não quero ser iludido
Com camisa numerada
Nem ver minha casa pintada
Com a cor de um partido
Se o candidato enxerido
Pensar que sou banana
Esse ano ele se engana
Que eu mudo a cor da chita
Bandeira aqui não se agita
Nem troco voto por grana.
Eu não vou mais a comício
Pra não ouvir arretado
O dizer: "tá aprovado"
feito doido no hospício
Quem usa desse artificio
É o povo inocente
Porque vivem carente
De amparo e instrução
E por ter falta de pão
Dão o voto a essa gente.
Eu não tô ficando leso
Pra não entender o moído
Dese bode fedido
Que nem messo e nem peso
Não gasto terço e nem rezo
Com esse bicho maluco
Não tô ficando caduco
E nem tô virando pato
Só voto num candidato
Que honre com Pernambuco.
É por isso que eu digo:
Pra eu votar esse ano
Vou mudar o meu plano
Pra não correr perigo
De votar num papa figo
Que tira de onde eu boto
Não emenda aonde corto
Tá doido pra me picar
Omi vá se lascar
Que de mim não tem um voto.
Pensa porque sou do mato
Não sei onde tenho a venta?
Filhote de uma jumenta
Da cara de carrapato
Sei onde aperta o sapato
Não tenho o tino enfadado
Tu traja linho importado
Eu só brim e algodão
Tu engorda numa mansão
As custas do eleitorado.
Que fingir que é matuto
Querendo falar errado
Que é pouco alfabetizado
Eita bicho corruto
Eu já tô ficando é puto
Com perdão da má palavra
Mais isso amarga e trava
Feito vinho de jurubeba
É que esse filho de ameba
Só presta em cova rasa.
Eu nasci nesse lugar
Gosto onde nasci
Aqui sempre vivi
Sem nunca me arrancar
Guando a morte cortar
Um dia minha raiz
Voarei como um concriz
Pra o céu de outro sertão
, Mais por enquanto não
Acredito no que diz.
Ontem no meu curral
Veio um cabra esquisito
Com o focinho de mosquito
Me entregar um jornal
Era um cabo eleitoral
A serviço da porfia
Com uma conversa macia
Mais eu logo disse assim:
Que aquele jornal pra mim
Tinha outra serventia.
Me desculpem a franqueza
Se pareço um pedante
Um matuto ignorante
É a minha natureza
É que não deixo na mesa
Farelo esparramado
E não vou ficar calado
Vendo esse desacato
Eu tô com a febre do rato
Com político aloprado.
Já disse e vou repetir
Se ele cruzar a cancela
Vai ficar sem a titela
É melhor ele não vir
Que eu não vou discutir
Pra não sair da esfera
Não quero ouvir quimera
E nem conversa fiada
Se vir fazer caçoada
Me viro na besta fera.
Se esse pinto goguento
Piar no meu roçado
O bico vai ser quebrado
As penas jogo ao vento
Aí nesse momento
Vai querer voltar pra o ovo
Então lhe pelo de novo
Pra ele sentir de uma vez
A mesma coisa que fez
Quando pelou o povo.
Mais não vai ser por isso
Que vou deixar de votar
Porque do jeito que estar
Não adianta o serviço
Com a força de Padim Ciço
De quem eu sou devoto
falo garanto e anoto
Que a pedra da corrução
Eu quebro nessa eleição
Com a marreta do voto.
Eu não vou dizer mais nada
Pra não azedar o pirão
Pra terminar a questão
Vou dá só essa lapada
Eu não tô de caçoada
Tô igual a espinho do mato
E digo ao candidato
Que não ajunte besteira
Que vai faltar ratoeira
Para pegar tanto rato.
Por fim não abro vereda
Para dá voto comprado
A candidato mofado
Fazendo campanha azeda
Nem direita nem esquerda
Não sou mais sonhador
Mais para legislador
A quem apoio entregue
Eu vou votar no meu jegue
Que honesto e trabalhador.