A REALIDADE BRASILEIRA EM CORDEL

Autor: Gecílio Pereira de Souza

geciliop@terra.com.br

01) Oh expectador atento

Que lê os meus versos agora

O Brasil cindiu-se em dois

Constata-se sem demora

Sendo um visto de dentro

O outro visto de fora

No belo e desenvolvido

A nata social mora

Na sub brasilidade

A massa se espreme e chora

Aquele se apóia neste

Aquela nesta se escora

Infeliz é o país dual

Em que o rico ao pobre explora

02) Oh caro amigo leitor

Cuja atenção me dispensa

Se a sua cortesia é grande

A minha alegria é imensa

Escrever não é tão fácil

Como muita gente pensa

Resolvi me atrever

Mas sei que a tarefa é densa

Tenho me sentido instado

Sem postular recompensa

A expor sobre o Brasil

Cuja elite é infensa

Infeliz é o país que se rende

Ao império da imprensa

03) Oh República reencontre

O seu zênite ideal

Não se esqueça que a RES

É da nação em geral

Privatizam o que é PÚBLICA

Com avidez sem igual

Prostituem-lhe sem pudor

Evocam o cerimonial

Matam-lhe e vilipendiam

Falseiam o seu ritual

Farreiam com seus despojos

Com apoteótico festival

Infeliz é o povo que sustenta

Certo Congresso Nacional

04) Oh Brasil continental

Não negligencie a própria saga

A política que lhe deprime

É insalubre, injusta e vaga

Uma estirpe de entes públicos

Historicamente lhe naufraga

Deliberadamente lhe avilta

És vítima de alguma praga?

A ostensiva hipocrisia

Tira-lhe as vísceras e o afaga

Tripudia sobre o seu brio

Oculta o rosto e exibe a nádega

Infeliz o país que abriga

Gugu e Ana Maria Braga

05) Oh liberdade oscilante

Legítima mãe do cidadão

Cuidado, pois lhe ameaçam

Se ponha de prontidão

Saiba que estão à espreita

As cassandras e o falcão

Eis que os seus apologistas

Revestem-se de apiedação

Porém são seus ex-algozes

Neófitos de bandeira na mão

Os pseudo-democratas

Com nostalgia de então

Infeliz o país que abriga

Leão Lobo, Xuxa e Faustão

06) Oh sistema judiciário

Por que a justiça suspendes?

E tu, excelso STF

Refletes sobre o que defendes?

Parlamento, olhe o escrúpulo!

Afinal, o que pretendes?

Executivo, fique atento!

Será que ilusões não vendes?

E tu, povo brasileiro

A esta balbúrdia entendes?

Lance mão de sua força

Já que a consciência acendes

Infeliz a nação que abriga

Ratinho, Hebe e Gilmar Mendes

07) Oh divindades togadas

A sua autoridade é imposta

Deixem a condição de deuses

Pois o seu prestígio se esgota

Aos sedentos de justiça

Vocês se põem de costa?

O seu líder é boquirroto

De arrogância exposta

Nega a sua tara por mídia

Mas de holofotes é que gosta

Desdenha a opinião pública

Que já não mais lhe suporta

Infeliz é o país que respeita

Quem o STF embota

08) Oh unidades federadas

Não tripliquem nossos prantos

A sucessão de escândalos

E os desmandos são tantos

Nem mesmo a tecnologia

Consegue enumerar quantos

E o povo vai vivendo

De migalhas e de espantos

Os nobres se pronunciam

Se atribuindo encantos

Comem ouro e tomam vinho

Adornam-se com nobres mantos

Infeliz é o país que abriga

Big-Brother e Sílvio Santos

09) Oh bravo povo brasileiro

Cujo condão é a vergonha

Levante-se e tome o cajado

Negue o estigma de pamonha

A cidadania custa suor

Não é dádiva de cegonha

Recupere a altivez

Faça jus a quem ainda sonha

Grande parte dos políticos

Entorpece-se na maconha

Demônios em forma de anjos

Víboras de letal peçonha

Infeliz a sociedade que nutre

O PMDB, coisa medonha!

10) Oh nação gigante e bela

Revigore a sua raiz

És o berço das riquezas

Do pantanal é a matriz

Milhares de espécies animais

Orquestra de aves que diz

A natureza em multicores

Inspiração do verniz

Todos os pássaros em sinfonia

Cujo maestro é a perdiz

No outro extremo chão seco

A fome é a força motriz

Ai da sociedade que abriga

Sarney, Maluf e Roriz

11) Oh trabalhadores uni-vos

Pois lhes subtraem o trabalho

Confiscam os seus salários

Vocês viverão de cascalho?

Ou se abrigarão na rua

Bebendo e jogando baralho

Conflitando-se com seu cônjuge

Tirando da escola o pirralho

Comendo pão pernoitado

Ou arroz com sal e alho

Consumindo-se na sarjeta

Sob chuva, sol e orvalho

Infeliz é o país que abriga

Mão Santa e Jáder Barbalho

12) Oh jovens de ambos os sexos

Próximos guias do caminho

Não se abatam com o desanimo

Nem temam pedra e espinho

Resistam à venalidade

Não se sucumbam ao mesquinho

Resgatem a dignidade

Não deixem o Brasil sozinho

Aposentem as velhas raposas

Dêem-lhes pijama e um cantinho

Tosem as assas das rapinas

Ateiem-lhe fogo no ninho

Infeliz é nação que abriga

Collor e Jarbas Passarinho

13) Oh mulheres onde estejam

Na cidade, campo ou ladeira

Vocês são o sustentáculo

Da família brasileira

A sua missão não se limita

A ser genitora ou rendeira

A política lhes convoca

Ponham fim na bandalheira

Imitem as gregas amazonas

Façam os homens cerrar fileira

Recuperem o respeito

Submerso na sujeira

Infeliz é a nação que abriga

Inocêncio e Edmar Moreira

14) Oh criançada inocente

Seja menina ou menino

Venham com bola ou boneca

Num gesto puro e repentino

Dirijam-se à classe política

Acordem-nos com apito e sino

Exijam que tomem juízo

E brequem este desatino

Que a miséria e a violência

Não são filhas do destino

São rebentos da política

Eles que comam o pepino

Infeliz é o país que abriga

Mozarildo e José Agripino

15) Oh pobres irmãos sem pátria

Atirados à indigência

Tentem reunir alguma força

Já que vivem por resistência

Enfileirem-se pelas ruas

Pois não devem continência

Decretem a indignação

E minem a paciência

Dos cheirosos e bem nutridos

Que ostentam luxo e decência

Porém são falsos normais

Neuróticos que ocultam a demência

Infeliz é o país que abriga

Certo tipo de excelência

16) Oh humanidade indígena

Que em outro Deus acredita

E na relação com o divino

Nenhum povo lhe imita

És os ecocidadáos

Pintam-se da imaculada chita

Adornam-se da natureza

Numa interação bonita

Venham juntar-se aos pálidos

Perdoem-lhes a invasão maldita

Do Brasil tens maior quinhão

Mas isto o livro não recita

Infeliz a nação que abriga

Luiz Estevão e Celso Pitta

17) Oh silvícolas brasileiros

Como a nossa história erra!

Um erro proposital

Mas a trama não se encerra

A Europa culta e santa

Decretou-lhe fatal guerra

Foi um genocídio impune

Da planície até a serra

Quem conseguiu remanescer-se

Doente e aviltado se ferra

Confiscaram-lhe reservas

Hoje ali só o gado berra

Infeliz é o país que bane

Os genuínos donos da terra

18) Oh imprensa parcial

Insto-lhe à reflexão

Buscas a verdade dos fatos

Ou tendenciosa informação?

És joguete dos poderosos

Ou meio de alienação?

Afinal de contas tens dono

Com interesses e opinião

Preconizam neutralidade

Mas não passa de jargão

Confundem ditadura da mídia

Com liberdade de expressão

Infeliz é a sociedade que abriga

A Rede Globo e o Estadão

19) Oh consumidores de mídia

Revelo-lhes sem segredo

Dos pensadores tenho pena

Dos teleguiados tenho medo

Estes para degustar TVs

Despertam-se logo cedo

Chacoteiam os que criticam

Transpõem-se para o enredo

Das desavenças dos pobres

Que se esmurram e cospem azedo

Gargalham incontinentes

Dão positivo com o dedo

Infeliz a nação que reverencia

Boris Casoy e Edir Macedo

20) Oh magistério católico

Prosélito da eternidade

Optastes pelo silencio

Ante tanta desonestidade?

Renunciastes à defesa dos pobres

Que incham a grande cidade?

Os ricos lhe anestesiaram

Com oferendas e caridade?

Mas o tempo gasto nos púlpitos

Dedicam mais da metade

No reforço ao neo-moralismo

E violam a moralidade

Infeliz é o povo que cultua

Esta hipócrita santidade

21) Oh contingente evangélico

Pretensamente detentor

Da graça e da salvação

Eleito pelo Redentor

Por onde andam a inocência

A sua fé e o seu fervor?

Reverbera-se contra o mundo

Com gritaria e louvor

Mas reverencia o dinheiro

O poder, o luxo e o sabor

Nega, mas ama a política

Gesta corrupto e corruptor

Infeliz é a nação que abriga

O pseudo-pregador

22) Oh fiéis de todos os credos

Dirijo-me sem rispidez

Se a fé é importante

Muito mais é a sensatez

Não prescindam da razão

Em nome da rigidez

Causa-nos perplexidade

O que um cardeal fez

Recorreu à excomunhão

Por causa de uma gravidez

Exprimiu a intolerância

De quem se espera lucidez

Infeliz é o país que venera

Os teólogos da estupidez

23) Oh leitores informados

Que provam do meu desgosto

Alguns acontecimentos

Deixam-nos corado o rosto

O espírito medieval

Parece que anda solto

Pensei que o santo ofício

Já tivesse sido morto

Mas um bispo o reeditou

Conforme o que foi exposto

Excomungou a classe médica

Por ter realizado um aborto

Infeliz é quem revencia

Clérigos de espírito torto

24) Oh comunidade acadêmica

Que aqui e ali nos empolga

Pense bem este país

Que na injustiça se afoga

A nossa corte suprema

Para os fortes advoga

O ministro que a preside

A carta magna revoga

No Brasil os magistrados

Têm 90 dias de folga

As decisões mais prementes

A categoria prorroga

Infeliz é o país julgado

Por ruralistas de toga

25) Oh compositores de música

A vocês faço um apelo

Dê erudição à letra

Cabedal é o nosso selo

Aos intérpretes eu peço

Que cantem com maior zelo

Não obstruam nossos ouvidos

Com mais dores de cotovelo

Som máximo sem conteúdo

Racionalidade no gelo

Serviçal e alienante

Do sentimentalismo desvelo

Infeliz é a nação que consome

A anestesia do modelo

26) Oh brasil, o dos anônimos

Das favelas e dos cortiços

Que abriga outra cultura

Dos espoliados e mestiços

Onde os cidadãos de bem

Vivem às margens dos serviços

E atenção do poder público

Que deviam ser maciços

O que dar razão a Marx

Quando fala dos feitiços

O Estado capitalista

Produz seus próprios enguiços

Infeliz é o país que poupa

Quem desvia e dá sumiços

27) Oh agremiações políticas

Contra vocês eu disparo

Com raríssimas exceções

Sem projeto e sem preparo

Centrais da corrupção

Que ao país custam bem caro

Aparelhos ideológicos

Por dinheiro têm bom faro

Legendas de aluguel

Patriotismo ali é raro

A sua má gênese não cura

Nem com radical reparo

Infeliz é o país que suporta

O tal Jair Bolsonaro

28) Oh políticos que adoecem

E ocultam a doença

Vivem às turras com seus cônjuges

Escamoteiam a desavença

São geneticamente céticos

Mas anunciam falsa crença

Velórios, festas e missas

Têm sempre a sua presença

Abraços e tapas nas costas

Entram e saem sem pedir licença

Escondem dos eleitores

Ou disfarçam a indiferença

Infeliz é o país que abriga

Estes fariseus de nascença

29) Oh supostos pária-homens

Cujo prestígio decresce

Articulam, enganam e matam

E a mordomia prevalece

Cidadãos de uma pátria

Onde o mortal não perece

Morrer ali não se morre

Apenas desaparece

Nas obras gravam seus nomes

Da torre até o alicerce

Na ponte e no viaduto

Onde a massa comparece

Infeliz é o país que sempre

Os falsos heróis reconhece

30) Oh profissionais da política

Que estão na minha mira

Patronos da falsidade

Promotores da mentira

Professores de Pinóquio

Felinos da macambira

Torquemadas da política

Contra quem crítica lhe atira

Savanarolas de terno

Incontinentes na ira

Vicentinos na aparência

Mas a alma fedor transpira

Infeliz é o país cujo povo

A estes vampiros admira

31) Oh presbíteros da ganância

De fé monetária e extrema

O seu cérebro é de proveta

Ou sofreu algum edema?

Fanáticos e intolerantes

Põem-se na altura suprema

Condenam as coisas do mundo

Mas mundano é o seu esquema

Erguem templos aos quatro ventos

Nus desfilam em Ipanema

Carregam malas de dólares

Dinheiro não é problema

Infeliz é o país que aplaude

Quem fecha teatro e cinema

32) Oh cerrado que agoniza

Diante do nosso bigode

Ora fogo lhe devora

Ora trator lhe sacode

Soja, capim e eucalipto

É o lucro que se explode

Expulsam os sertanejos

A família, o porco e o bode

Enfrentam com escopeta

Qualquer um que lhes aborde

O Estado é leniente

É poder que nunca pode

Infeliz é o país que abriga

Malfeitor de pinta lorde

33) Oh sem-terra e sem-teto

Que vida é essa, a sua?

Com tanto chão ocioso

E com tanta terra nua

Na cidade lotes baldios

Outdoor mais que insinua

Especulação imobiliária

Só faltam vender a lua

Vocês vertem suor e sangue

Mas a luta continua

Querem criminalizá-los

Os grandes lhes chegam a pua

Infeliz é o país onde

A grilagem se perpetua

34) Oh camponeses valentes

Entre si são camaradas

Suas armas são o martelo

Machados, foices e enxadas

Os documentos primeiros

Sao suas mãos calejadas

Aspiram uma gleba de terra

Pra plantar e fazer moradas

De terras o país é rico

Mas quase todas cercadas

Latifúndio improdutivo

Das matas até as chapadas

Infeliz é o país que atira

Seus filhos às margens das estradas

35) Oh religiosos insanos

A sua doutrina é da dor

Intolerante e severa

Delinqüente do amor

Contraditória em si

Prega a paz, difunde o horror

Como pode um cardeal

Com o título de pastor

Cioso excomunga médicos

Beatifica estuprador

Por fora é manto sagrado

Por dentro é ódio e rancor

Infeliz é a nação que suporta

Profetas do despudor

36) Oh Câmara dos deputados

Teoricamente importante

Ao regime democrático

Que anda cambaleante

Transformaste-se num antro

De bandido e traficante

Revise a sua conduta

Que é ignóbil e irritante

Criminosos aí circulam

Com liberdade impressionante

Considere a impaciência

Que nas ruas cresce bastante

Infeliz é o povo que elege

Severino Cavalcante

37) Oh Senado Federal

Fixe bem em seus letreiros

Suposto acento da nação

E casa dos timoneiros

Da República democrática

Baluarte dos brasileiros

Exerça a introspecção

E verá os gazeteiros

Graúdos industriais

Empresários e banqueiros

Históricos latifundiários

Contrabandistas e grileiros

Infeliz é o país que abriga

Efraim e Renan Calheiros

38) Oh Congresso Nacional

Câmara baixa e câmara alta

Volte os olhos para o Brasil

Passe peroba em sua lata

Expurgue estes marginais

Que trajam terno e gravata

Viajam com o dinheiro público

Deliciam-se com a mamata

Subsidiam namoro e orgias

Em cada sessão é uma falta

Se resolvem comparecer

Não chegam na hora exata

Infeliz é o povo que banca

A gatunagem que lhe mata

39) Oh república de bananas

Democracia hesitante

Intolerância crescente

Violência galopante

Privatização da política

Expõe o desimportante

Casamento mídia-crime

Homicida é figurante

Não acha que está na hora

De uma assepsia impactante?

Sem esquecer que a luz do sol

É o melhor desinfetante

Infeliz é o país que suporta

O Dem. o privatizante

40) Oh dignos compatriotas

Que não se mostram nas telas

São as vítimas imediatas

Dos desmandos e das mazelas

Transpiram para colocar

Conteúdo nas panelas

Vivem a degustar com os olhos

O luxo nas passarelas

Vendo pais neuróticos atirar

Crianças pelas janelas

Garotos sendo arrastados

Pelas ruas das favelas

Infeliz é a nação que ouve

Magistrados tagarelas

41) Oh infante democracia

Imperfeita mas necessária

Nenhum regime a supera

Por ser a mais igualitária

Nos direitos e nos deveres

Da nossa índole gregária

O seu parto foi traumático

Numa ocasião precária

Os seus desafetos possuem

Capacidade extraordinária

São seus falsos defensores

Com volição temerária

Infeliz é o país que anistia

A nostalgia autoritária

42) Oh nossos irmãos enfermos

Da vida habitam o deserto

Roubaram-lhe o horizonte

Deixaram-lhe a morte por perto

Desviaram os seus recursos

Fizeram obras de concreto

Compraram passagens aéreas

O erário que banque o resto

Na rede de saúde pública

Hospitais desabam teto

Mutuários do sofrimento

Tributários do esperto

Infeliz é a nação que sustenta

Geddel e ACM Neto

43) Oh brasileiros veteranos

Mestres da experiência

Muitos instruíram a prole

Na academia da decência

Oxigenaram o INSS

Capitalizaram a previdência

Hoje sofrem o desrespeito

Intolerância e impaciência

Negam-lhes justos proventos

A vocês que têm preferência

Queimam sempre o seu dinheiro

Com CPI e audiência

Infeliz é o país que despreza

Os idosos e descendência

44) Oh direita brasileira

De matiz reacionário

Eu não faço prognóstico

Porque não sou visionário

Mas sei emitir juízo

Analisando o cenário

O faço como cidadão

Sem um vínculo partidário

É na condição de filósofo

Que teço tal comentário

Lula resgatou o Brasil

Melhorou tudo e o salário

Infeliz é o partido que se opõe

Ao presidente operário

45) Oh milhões de eleitores

O mal continua vivo

O Gilmar Mendes aspira

Um mandato eletivo

Não estou certo de qual seja

Se acento no legislativo

Ou presidente da República

Pois anda tão expositivo

Se estou equivocado

Qual é então o seu objetivo?

Que é obcecado por mídia

Parece um deus exclusivo

Infeliz é a nação que tolera

De tal magistrado ficar cativo

46) Oh atávica classe política

Cujo prestígio se enferruja

Subestima o nosso brio

Mergulha-se na lambuja

Perfumada e de botox

No poder se faz maruja

Delinqüe, brande orgulhosa

Quer justiça e mata a cuja

Hipócrita e demagoga

A Narciso sobrepuja

Matreira, rastreia o ambiente

Igual olho de coruja

Infeliz é a nação que aplaude

Excelências de alma suja

47) Oh senhores moralistas

Da moral que assassina

São arcanjos frente à câmera

Mas demônios na surdina

Intransigentes pais da ética

Acadêmicos da propina

Deploram a criminalidade

Que deflagra em cada esquina

Porém preconizam o crime

Sob o terno ou a batina

Trafegam por entre as nuvens

Traficam até cocaína

Infeliz é o povo que venera

Estas aves de rapina

48) Oh esplêndida Amazônia

Todo o mundo lhe aproveita

Enaltece o seu valor

Mas por mera etiqueta

Investe contra o seu ventre

Com moto-serra e picareta

O pasto demite as árvores

E os bois saem de carreta

O fogo destrói flora e fauna

Transforma-as em matéria preta

Imolaram Chico Mendes

Emudeceram a trombeta

Infeliz é a nação que perdoa

Os algozes do planeta

49) Oh senhores da floresta

Nobres servos do dinheiro

Os olhos contêm cifrão

Querem pra si o Brasil inteiro

Alvejam quem os interpelam

A morte é seu escudeiro

Ceifaram a Dorothy Stang

A mando do fazendeiro

Os índios viraram vítimas

Do sulista arrozeiro

Matam fiscais do trabalho

Têm cartório como parceiro

Infeliz é o país que esquece

Quem aqui viveu primeiro

50) Oh Brasil tupiniquim

Ontologicamente belo

Distinto por natureza

Igual à flor do marmelo

Porém nutre um contraste

Ostentação e flagelo

Ricaços espezinham os pobres

Em desproporcional duelo

Aqueles comem lagosta

Estes vivem do farelo

A classe baixa é o prego

A classe alta o martelo

Infeliz é o povo que perde

O branco, azul, verde e amarelo

51) Oh nobres irmãos de cor

Cuja cepa é africana

Vítimas do interesse sórdido

Daquela Europa tirana

Seu sangue hidratou esta terra

Girou os engenhos de cana

Os brancos escreveram a história

Tal história nos engana

Distorce a verdade dos fatos

É ideológica e insana

Cultua o colonizador

Cristã de atitude profana

Infeliz é o país que matou

Zumbi, síntese da raça humana

52) Oh militantes do esporte

E mortais deuses da bola

Tenham orgulho e não empáfia

Pois a crise nos assola

Promotores da alegria

Quando em campo a esfera rola

Dos pés cuidem com a chuteira

Assim ninguém os esfola

Mas lembrem-se igualmente

Que possuem uma cachola

À qual dispensem cuidado

Saber, estudo, escola

Infeliz é a nação que custeia

Mordomia de cartola

Oiliceg
Enviado por Oiliceg em 02/08/2016
Reeditado em 22/04/2019
Código do texto: T5717267
Classificação de conteúdo: seguro
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