A CRUZ
O ato da crucificação
Do ser pelo ousar ter sido
Poesia, foi porque se fez
A cruz do ter existido.
A tempo nunca lhe disseram
Da liberdade maquiada
Criança só fazia verso
Da sua infância renegada
Menina feita sem algemas
Poesia nunca maculada.
Ousou desafiar a sorte
À morte de não ter saída....
Silêncio gotejou do corte
Da consciência concebida,
Então algo bem assustada
Vagou pelo viés da vida
Poesia ecoou na estrada
Verdades nunca dantes ditas...
Gritou, gritou... sem ser ouvida!
Sequer se figurou consorte
No anverso da chaga sofrida
Amou, amou ...poetizou a morte
Nem paz lhe foi concedida,
À noite ao revés da estrada
Cansada, algo combalida...
A rua lhe cedeu guarida.
Na cruz, então, a soerguer
O tudo que foi versejado
Na pele do tanto sofrer
A ânsia de ter opinado.
Poesia quanta consciência...
Razões, visões, o duplo-sentido
Metáforas do prenunciado
Em aliterações zunindo...
Do pútrido odor já expelido
Última nota sem sentido...
Do ódio mal delineado...
O verso correu assustado.
Agradeceu ao mais Sagrado
Coragem de ter prosseguido.
Foi quando em poesia ilesa
Ao ingênuo jeito de existir
Sem desejar ser realeza!
Crucificou-se em sutileza
Ao dom de a tudo pressentir...
A sonetar versos perplexos
Sem eco, nunca lhe ditados!
Crucificou-se em amplexos
Abraços nunca planejados
Na métrica deste universo,
No tempo foi só descompasso.
Poesia, seus versos cravejados
No vão dos perdidos espaços
Dos sonhos nunca imaginados
Sangrantes, em versos complexos
Soou, então, resfolegante...
A dor das vidas em rechaço.
Aliterou aos pés das cruzes
Rogou perdão por ter ousado
E prometeu não infringir
A regra: ser robotizado!
Não mais acenderia as luzes
Sequer em verso opinado,
Nenhuma rima a conferir
A primazia de se ousar sentir
Sem nunca ser crucificado.
Promessa: a de não existir!
Poesia...nunca mais pariu
Sequer um verso comportado!
Com medo de lhe ser negado
O pleno direito de fugir...
Do tudo tão degenerado.
Cordel... seu causo ressurgido
Milagre nunca questionado
Poesia um dia emergiu
Num verso meio descuidado
Ousou um derradeiro grito!
Ainda que amedrontado:
Sentido sempre a ser seguido:
Legítimo ser ressuscitado.
Tal verso em grito soerguido
Jazia bem crucificado...
Já não urgia ser ouvido:
Castigo seu?- foi ter amado.
Num ato qual de redenção
Do ser pelo ousar ter sido
Poesia, foi mais solidão...
A cruz de ter sobrevivido...