O sertão em decadência
Cajarana, Pinha, Umbu
Pau ferro, angico, aroeira
Mata pasto, jitirana
Jatobá e Caibreira
Melão de são Caetano
Tudo tem, eu não engano
Na caatinga brasileira
Guaxinim, gato do mato
Peba, tatu e preá
Jararaca, corre campo
Abelha de arapuá
Aves de arribação
Asa branca, mergulhão
Tudo isso tem por lá
Tejo e camaleão
Galinha d’água, concriz
Traíra, curimatã
Lambu, anum, codorniz
Raposa, tamanduá
Tudo isso eu vi por lá
Numa caatinga feliz
Quando chove em janeiro
Se planta milho e feijão
Tudo junto e misturado
Com o branquinho algodão
Na leiteira, queijo e nata
Na vazante tem batata
Tem melancia e melão
No meu sertão também tem
Um bom partido de cana
Lá na várzea do açude
Da variedade caiana
Prá moer, fazer garapa
Mas antes de moer rapa
Prá o caldo ficar bacana
No domingo mata um bode
E também faz a buchada
Compra um litro de cachaça
Faz uma festa danada
Bebe antes de almoçar
E depois vai se deitar
Na sombra bem arejada
Quem não dorme se organiza
Numa mesa de baralho
Jogam sueca com bois
E não permitem atrapalho
Tomam café com batata
Bolo de milho e de nata
Cuscuz e queijo de coalho
Depois que serve o jantar
A dona da casa ordena
Todos para a sala grande
Para rezar a novena
Lá não tem televisão
Sob a luz do lampião
A sala fica pequena
Os mais velhos vão dormir
Os vizinhos vão embora
O pai determina aos filhos
Só passem mais uma hora
Pois amanhã tem a lida
Quero todos na medida
Bem no romper da aurora
As moças casam novinhas
Com algum vizinho seu
Rapaz bem do seu convívio
Que há tempos conheceu
Inda menina brincando
E o tempo vai passando
Na vida que Deus Lhe deu
Os rapazes muito jovens
Não podem mais estudar
Para ajudar seus pais
Necessitam trabalhar
Se querem mais um dinheiro
Mudam pra o Rio de Janeiro
Dando adeus a seu lugar
Mas as coisas vem mudando
Com grande velocidade
Muitos deixando o campo
Para morar na cidade
E sem qualificação
A mais mera ocupação
É uma oportunidade
Chegam na periferia
Sem casa para morar
Fazem barraco de lona
Se abrigam em todo lugar
Assim surgem as favelas
E tantas famílias belas
Passam a se humilhar
Há tantas casas fechadas
Em nossa zona rural
A tal mecanização
Da agricultura formal
Extinguiu muitos empregos
Gerando desassossegos
Nessa vida desigual
Quem não aprendeu a ler
Não dirige um trator
Também são sabe mexer
Num simples computador
Por isso é mandado embora
Sem querer já está fora
Por decisão do doutor
Não cultivam mais agave
Acabou o algodão
Sem a produtividade
Empobreceu o sertão
Prá voltar a ser celeiro
Precisa agua e dinheiro
Prá fazer irrigação