A MINHA BIOGRAFIA
EM RIMA E METRIFICADA


 
Trabalho que compõe o Livro de
ANNA MARIA CASCUDO BARRETO
MULHERES ESPECIAIS 2

Como um
Depoimento Poético

 
 
“Sou filha de agricultores!
Casa de taipa o meu berço!
Criei-me de pés descalços
Participando de terço,
Cantando hinos pra santa,
Dormindo sempre sem janta,
Porém tendo à vida apreço.
 
Família de treze irmãos,
Porém só quatro escaparam
Das “doenças de menino”
Que aos outros nove levaram.
Eu escapei da papeira,
Da bexiga verdadeira...
Mas elas me maltrataram.
 
Meu pai era analfabeto
Porém bom “decorador”.
Ouvia cordéis na feira,
Pelejas de cantador
De viola e decorava.
Para os seus filhos contava
Com o peito cheio de amor.
 
Isto fez com eu amasse
Desde cedo a poesia
Em rima e metrificada
Como os cordéis que eu ouvia
Mas ao crescer precisei
Trabalhar e me ausentei
Do que me dava alegria.
 
Casando, minha irmã levou-me
Para com ela morar
Em Montanhas. E ali
Chegando, fui estudar
Na única escola existente
Do Estado. E era “decente”.
A Escola - um Grupo Escolar.
 
Grupo Escolar Carlos Gomes
Ou Escolas Reunidas
Carlos Gomes, pois mudou
Com nova Lei emitida.
E entrar naquela Escola
Seria uma grande esmola
Antes jamais recebida.
 
Não esmola simplesmente!
Pois isso não é legal!
Mas, uma dádiva divina,
Que elevou meu astral.
Pois não sei se isso é sina,
Mas, desde mui pequenina,
Eu achava-me anormal.
 
É que, diferentemente
Do povo do meu lugar,
Meninas principalmente,
Via-me ao me comparar.
O que elas tinham na mente
Era muito diferente
Do meu modo de pensar.
 
Eu sempre quis estudar
Com o intuito de aprender
Sem nem pensar que o estudo
Pudesse me oferecer
Algo mais que educação.
Pois jamais tive a intenção
De riquezas obter.
 
Foi o saber por saber
Que sempre me interessou,
Sem ambição por dinheiro
Ou seja, mesmo o que for.
E, assim, pequenininha,
Com a minha irmã mocinha,
Ia à escola, doutor!
 
Com quatro aninhos apenas
Soletrava o be-a-bá.
Aos seis, cantava cordel
Na rede a me balançar:
Pros meus pais, irmãs e tia,
E pro Jerimum, que ia,
Todinho, ouvir-me cantar.
 
Mesmo quando eu fui morar
Com minha irmã que casou,
Em Montanhas, lembro bem,
Nada jamais me afastou
Das rimas que tanto amava!
Pois nas feiras sempre estava
Em busca do cantador.
 
O cantador de cordel,
Que era o próprio vendedor
Dos livrinhos – dos folhetos
Que nos falavam de amor
E que diziam: no fim,
O mau sempre acaba ruim
E o bom sempre é vencedor.
 
E ficava arrepiada
Com as histórias “reais”
Tal como a do Boi Falante.
E de casos colossais:
O Pavão Misterioso
Que, num final glorioso,
Faz que sonhem os casais.
 
Era uma vida gostosa
De amor e de liberdade!
Especialmente quando
Meus pais vêm pra Cidade
De Montanhas, pra ficar
De vez. Ali vão morar.
Isto é que é felicidade!
 
Agora iria estudar
Como era minha vontade
Sem o controle da mana
Que agia com austeridade
Com a maninha “danada”,
Ativa mas malcriada,
Que afirmava ser ruindade.
 
Na escola sempre inquieta,
De todos tirando a paz.
De quem sentava na frente,
De lado, e até detrás,
Eu beliscava e mangava!
À professora irritava.
Era azougada demais!
 
Repito o Primeiro Ano
Por não saber Tabuada.
Quase morro de vergonha!
E choro desesperada!
Prometo a mim: - Nunca mais
Serei deixada pra trás
Por aquela desgraçada!
 
Meu Professor Severino
Purifica Maciel
Ficou na minha lembrança
Como um grande menestrel,
Um artista do saber
Que me ajudou a entender
Que o conhecimento é mel.
 
Do Jerimum pra Montanhas,
De Montanhas pra Natal,
Também passando em Recife,
Buscando vencer o mal
Do não saber. Pois queria
Estudar, mas não podia,
Faltava-me o capital.
 
Fui empregada doméstica
Mas pouco tempo aguentei.
Faltando-me a paciência
Com a minha mãe falei,
Tendo dela a aprovação
Pedi logo demissão
E noutro “emprego” pousei.
 
Daí passei a dar aula
Mas sem remuneração
Só por dormida e comida
E o resto da formação.
Era datilografia
O que ensinava e aprendia.
Doação por doação.
 
Outro emprego, de escritório,
Em seguida eu arranjei.
Representação de livros.
Neste, dois meses fiquei.
Os meus patrões, dois, sumiram!
Nem sequer se despediram.
O escritório eu fechei.
 
Seis anos e alguns meses
No comércio de Natal,
Tecidos, medicamentos,
Financeira e, no geral,
Em caixa... Eu trabalhei.
Até que um dia encontrei
Um trabalho especial.
 
Foi na COSERN, através
De um concurso que pedia
O Primeiro Grau completo
Que eu vi, foi chegado o dia
De conseguir me firmar,
Fiz a prova pra passar,
Conseguindo o que queria.
 
Aí já estava casada
E com meu segundo filho,
Parei de estudar de novo
Perdendo da vida o brilho
Pois eu amava a escola
Que, para mim, era a mola
Que bota o homem no trilho.
 
Vinte e um ano e meses
 A COSERN me firmou.
Só saindo aposentada
Quando esta privatizou.
E ali, na Companhia,
Formei-me em Economia
Mas ninguém me apadrinhou.
 
Aposentada, atrevi-me
A novo Vestibular,
Tentei pra Filosofia
Conseguindo me aprovar.
Tendo o curso começado
Fiz o Concurso do Estado
Também consegui passar.
 
Fui, pra Segunda DIRED,
A primeira colocada
Porém após quatro anos
Inda não fora chamada,
Fiz pra Natal, e no décimo
Fiquei. Mas só com o acréscimo
De três anos fui chamada.

 

Amante da poesia,
Utilizo o meu cordel
Pra dar aula expositiva
Desempenhando o papel
De poeta cordelista.
Digo: Eu não sou artista
Mas versifico a granel!
 
Recomecei aos sessenta
O que vem nos afirmar
Que aos setenta e cinco, à força
Das Leis, vou me aposentar
De novo! Mas eu garanto,
Leitores: estou no ponto!
Tenho mesmo que parar.
 

Rezei aqui minha história
Ou seja, a biografia,
Seletando casos que
Atende ao que se pedia.
Rogo que, se não gostaram,
Escondam sua alergia.
Garanto que, se assim for,
Interinamente o amor
Servirá de sinergia.
 
 
 
Rosa Regis
 
2015

 

Revisto, com pequenas alterações em 16 de novembro de 2021.