MENTI PRA MÃE NÃO SOFRER.
Bati na porta da casa
Alguém perguntou "quem é"
"É Joaquim de seu Zé
Minha pergunta não atrasa
O chão tá mesmo que brasa
Então me diga agora
Eu tô em cima da hora
E mãe mandou perguntar
Se pai veio se deitar
Ai com a senhora?"
"Que menino atrevido
Cabuloso e chato
Não vê que isso é boato
Zoando no teu ouvido?
Teu pai é desconhecido
Eu não conheço seu Zé
Não sei como ele é
Se é magro ou gordo
Com isso é que me mordo
Do quengo ate o pé".
"Quem é que tá tossindo
Ai com esse pigarro
E o cheiro desse cigarro
Que de cá tô sentindo?
Não que falar eu vou indo
Não tá aqui quem passou
Não sei quem foi que falou
Isso já não importa
Só vim na sua porta
Porque foi mãe que mandou!.
"Mandou no lugar errado
Menino tu me escuta
Eu não sou prostituta
Para viver no pecado
Mais o teu pai tá errado
Casando com quem não quis
Deixando tua mãe infeliz
E acha que eu não presto?
Pois não vou comer resto
Da sobre que o povo diz".
"Então abra a porta
Venha falar comigo
Saia desse castigo
Se isso lhe importa
Se a conversa tá torta
Conserte aparecendo
O sol tá derretendo
Eu quero ir é embora
Tá me ouvindo senhora
O que tô lhe dizendo"?
"Apaga esse cigarro
Deixa de tá tossindo
O menino tá ouvindo
Conhece o teu pigarro
Vai pisando no barro
Pelo roçado de milho
Toma rumo do trilho
Que dá na beira da orta
Enquanto eu abro a porta
Pra falar com teu filho".
Ouvi um troço caindo
Então me adiantei
Por uma brecha olhei
E vi quem tava tossindo
A "tal" tava mentindo
Fingindo está sozinha
Lá dentro da camarinha
Mais a verdade eu vi
Sem esperar eu corri
Pra contar tudo a mãinha
Sai em disparada
Com o sol derretendo
E o suor escorrendo
Na minha pele queimada
Meus pés sobre a calçada
Corriam como o vento
Mais no meu pensamento
Uma vontade eu tinha
Não deixar que mãinha
Caísse em sofrimento.
Quanto mais eu corria
Mais eu ficava confuso
Um pensamento intruso
Aos poucos me consumia
A minha alma tremia
Minguava meu coração
Porque a falsa ilusão
como um papel se rasgou
Quem minha mãe desrespeitou
Foi meu herói do sertão.
Cheguei em casa cansado
Abri a porta e entrei
No tamborete sentei
Com o corpo todo suado
Fiquei um tempo calado
Quando mãe apareceu
Um copo d'água me deu
Beijou minha testa suada
E eu não disse mais nada
Mais ela me entendeu.
Levantou a minha cabeça
Eu vi seus olhinhos d'água
Molhados de dor e magoa
Sem que ela mereça
Não deixarei que padeça
Defenderei nessa luta
Enfrentarei a labuta
Sobre sol e poeira
A minha mãe tão guerreira
É uma santa matuta.
Levantei lhe dei um abraço
Senti seu corpo tremendo
Lhe beijei e fui trazendo
Minha mãe pra o terraço
E ali naquele espaço
Lhe sentei na rede armada
Lhe encostei numa almofada
Feita de puro algodão
Com amor beijei-lhe a mão
De pele já enrugada.
Acariciei seus cabelos
Uns escuros outros brancos
Tirei seus pés dos tamancos
Com todo amor dos meus zelos
Que me orgulho em te-los
E lhe disse: "é caçoada
Mãe, é mentira e mais nada
Falação besta é que há
Não vi o meu pai por lá
É tudo conversa fiada".