O Lavrado em Cordel
Dedicado ao pesquisador Reinaldo Imbrozio Barbosa, o Tabelião do Lavrado.
Peço aos caros leitores
Licença para contar
E clamo ao Makunaima
Por favor me inspirar
Os versos desse Cordel
Que trago neste papel
Que agora vou rimar.
A Amazônia é
Um centro de vida bela
E que traz na paisagem
Cada cor da aquarela
Tem fauna exuberante
Mais a flora vislumbrante
Todos numa só parcela.
E bem no extremo norte
D’Amazônia brasileira
Ao nordeste de Roraima
Numa terra de palmeiras
No começo do Brasil
Descansa entre os rios
A vegetação rasteira.
Par’o mundo és Savana
Ao Brasil és um Cerrado
Ao índio és a morada
E o suor do pesado
Aqui és ecossistema
Que na arte vira tema
E te chamamos Lavrado.
Essas savanas dos trópicos
São caracterizadas
Por vegetação aberta
Quase sempre graminadas
Às vezes estão presentes
As lenhosas diferentes
Em veredas arranjadas.
No encontro do Brasil
Venezuela, Guiana
Ao norte da Amazônia
Maior bloco de Savana
Onde a paisagem une
Rio Branco-Rupununi
A beleza não engana.
A paisagem atual
Está muito bem ligada
A eventos tectônicos
De uma era passada
Erosões, trocas climáticas
Que parecem tão estáticas
Deixaram assim formada.
A Formação Boa Vista
Sedimentou os espaços
No Graben do Takutu
Causando embaraço
E vieram Criptógamas
Depois ervas fanerógamas
Ocupando todo paço.
Então as águas mudaram
Em relação a drenagem
O que ia ao Atlântico
Desviou sua viagem
E se fez o rio Branco
Quebrando qualquer barranco
Formando tal paisagem.
Com clima tropical úmido
Sem uma estação fria
Seca: dezembro a março
Com sol quente todo dia
Chuvas: maio a agosto
É assim o nosso posto
Umidade que varia.
Ligando lagos aos rios
Numa rede de drenagem
Estão as trilhas veredas
Que abraçam a paisagem
Mas se tornam sem rumores
De incêndios corredores
Nos anos de estiagem.
E a origem da flora
Fruto de interações
Edáficas e climáticas
Com outras flutuações
Resultou ecossistemas
Formando seus vários temas
Em muitas situações.
São rotas de dispersão
No sistema amazônico
Variadas trocas gênicas
Em um processo icônico
Mas diferentes ações
Quebram-se interações
E vivemos com o crônico.
Os impactos antrópicos
Vêm sem nenhuma clareza
E podem provocar perdas
Por toda a natureza
Estudos são muito raros
E depois pagamos caro
Por perder essa riqueza.
Mas já temos conclusões
E um grande resultado
São dois belos ambientes
Bem caracterizados
Aberto, não-florestal
Com árvores, florestal
São assim classificados.
Poucas pesquisas florísticas
É que foram realizadas
E as principais espécies
Foram pouco amostradas
Os sistemas florestais
Ainda têm por demais
Que nos serem reveladas.
Nos campos não-florestais
Dados são realidade
Temos as espécies-chaves
Com lenhosas de verdade
E que geram nutrientes
Pra espécies diferentes
Gera continuidade.
Sobre a fauna local
Há pouco conhecimento
Mas são diversos fatores
Que fazem entendimento
Que toda a região
Destina conservação
Abrigando elementos.
Aves são mais estudadas
Depois vem herpetofauna
São bastante conhecidas
Com a ictiofauna
Maracá tem inventários
Que nos trazem comentários
A outros tipos de fauna.
Invertebrados, mamíferos
São bem menos estudados
Mas aranhas e insetos
Estão bem documentados
Apesar dessas coletas
Devemos ter novas metas
Para todo o Estado.
Mais da metade das aves
Bem aqui elas residem
E não há na Amazônia
Uns outros que coincidem
Centro de preservação
Lugar de conservação
Onde as vidas progridem.
A biodiversidade
É tão pouco conhecida
Porém sem conservação
É também desprotegida
Rios, lagos, buritizais
E refúgios animais
Perecem sem ter medida.
Estes são considerados
Lugares prioritários
Mais a Savana-Floresta
Que tem poucos inventários
São faixas de transição
Requerem mais atenção
Pois são extraordinários.
O PARNA Monte Roraima
Possui papel importante
Proteger sistemas raros
Com mais um representante
Raposa/Serra do Sol
Também é mais um farol
De modo interessante.
Pois são as Terras Indígenas
De uma forma sadia
Que protegem as savanas
Com as suas etnias
De savanas florestadas
Com serras associadas
Até as microbacias.
Outras áreas do lavrado
Fazem o meio rural
Em Bonfim e Boa Vista
Compreendem o local
E de reforma agrária
Para imobiliária
É o que tem atual.
Mas pra nossa atenção
São três grandes regiões
Serras Tucano e Lua
Que abrigam transições
Floresta submontana
E também campinarana
Que reforçam as razões.
E a região dos Lagos
É mais fácil que a lógica
Por sua fauna e flora
E a questão hidrológica
Aos rios são pra drenagem
Pois mantém a paisagem
Zelando a ecológica.
E apesar dos avanços
Muitas lacunas estão
Abertas pra melhorar
Esta tal compreensão
E a curiosidade
Da biodiversidade
Que as savanas nos dão.
A desvalia dessas áreas
É um grande descompasso
Para toda Amazônia
E se traduz em fracasso
Confunde-se o processo
Resulta em retrocesso
Quando se tornar escasso.
Talvez você não aceite
Esses versos que vos fiz
Mas foi tudo baseado
No que a Ciência diz
É uma informação
Pra formar opinião
Pois sou sempre aprendiz.
E encerro esta rima
Com certeza do recado
Pois deixo essa mensagem
Para os interessados
Que no chão de Makunaima
As savanas de Roraima
São chamadas de Lavrado.
(Baseado no artigo “The 'Lavrados' of Roraima: Biodiversity and conservation of Brazil’s Amazonian Savannas”, de Barbosa, R. I. et al., 2007)
Boa Vista, 11 de fevereiro de 2016.