Se eu voltar a viver no meu sertão/Não terei o que tinha no passado

Inda lembro quando eu era pequenino

Minha casa tão singela e simplezinha

Uma sala, só dois quartos e a cozinha

A latada e o pé de tamarino

Onde o pai amarrava o asinino

Depois que retornava do roçado

Com a enxada, a cabaça e o machado

Abatido de sua lida em exaustão

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

Na cozinha tinha o fogão de lenha

E uns trambelhos em cima do atajé

A batata lá na mesa com café

Leite cru vindo agora da ordenha

Duas vacas, uma velha, outra prenha

Quatro cabras, a pastar, lá no cercado

Um terreiro bem varrido e bem cuidado

Uma horta de coentro e pimentão

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

Hoje a moto substitui o jumento

Luz elétrica destronou a lamparina

Não tem pote. A geladeira domina

O fogão é a gás. Isso eu lamento

Não tem mais petisqueiro no aposento

Nem um porta-chapéu bem arrumado

Nem chocalho nas vaquinhas pendurado

Nem se bate o feijão com valentão

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

De manhã um copo de café com leite

Que na rua chamam de leite pingado

Com cuscuz e um ovo cozinhado

Ou as vezes era fritado no azeite

Tudo era um verdadeiro deleite

Depois ia para a lida no roçado

Limpar mato ou pastorear o gado

Dependendo de ter ou não ter ração

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

No almoço tinha o feijão macaça

Machucado prá render mais um pouquinho

Temperado com tripa ou com toucinho

E o peixe ou até mesmo uma caça

O meu pai dava um trago na cachaça

Prá deixar o apetite apurado

Também tinha rapadura ou melado

Sobremesa prá ajudar na digestão

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

Toda tarde no grupo eu estudava

Para ter uma vida mais tranquila

No recreio jogava castanha ou bila

Numa paz . Nenhum menino brigava

As orelhas de pau que mãe mandava

Era o lanche por todos nós desejado

Feitas com carinho e com cuidado

Prá comer com um ponche de limão

Se eu voltar a viver no meu sertão

Não terei o que tinha no passado

Jhoracio
Enviado por Jhoracio em 29/01/2016
Reeditado em 29/01/2016
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