POVO TEM QUE SER EXTINTO*

I

Há quem diga que o mundo

Seria bem mais feliz

Se o povo se acabasse

Diante de nosso nariz;

Findar-se-iam dilemas,

Não restariam problemas

Nessa nova diretriz.

II

Com tudo isso que se diz

Só tenho que concordar,

Embora corra o risco

De estar sendo impopular,

Mas nada posso fazer,

A verdade é bom dizer

E não quero me calar.

III

Povo tem que se danar

Porque se comporta mal,

Só pensa em futebol,

Quando não em carnaval,

Não sabe sequer comer,

Só xixi e cocô fazer

Em escala industrial.

IV

Povo é vulgar e boçal,

Nunca busca o melhor,

Sempre erra ao votar

E não sabe da maior:

O problema ecológico,

Culpa do povo, é lógico,

Já vai de mal a pior.

V

Quem não conhece de cor

Que nesta terra espremida

O povo se reproduz

Numa proporção suicida?

E a superpopulação,

Como que numa explosão,

Ameaça extinguir a vida.

VI

Já não pode ser contida

A grande expansão urbana

Porque o povo é sem-vergonha

E acha isso bacana;

Proliferam-se as favelas

E a miséria dentro delas

É por demais desumana.

VII

O crime às drogas se irmana

Em meio à promiscuidade,

Congestiona-se o trânsito

Pelas ruas da cidade,

Boa higiene já não cabe

Porque o povo não sabe

Viver na modernidade.

VIII

O povo vai ter saudade

De toda bela paisagem

Que um dia devastou

Porque teve a coragem

De se banquetear em festas,

Destruindo as florestas

E a rica vida selvagem.

IX

É uma grande bobagem

Defender esse povão,

Que germina toda sorte

De prostituta e ladrão;

Com política em desmando,

Não se sabe até quando

Vamos ter povo ou não.

X

Se ao povo se der a mão,

O braço logo agarra

Porque só quer mordomias

E esbanjar tudo em farra;

Não imita a formiga,

Mas aplaude a cantiga

Da preguiçosa cigarra.

XI

Povo trabalha na marra

E pouco estuda também,

Por isso a economia

Só capenga e não vai bem;

Pra melhorar o recinto,

Deve o povo ser extinto,

Pois assim é que convém.

XII

Se um dia ficarmos sem

Esse nosso grande estorvo,

As coisas vão melhorar

E não vou dizer de novo,

Pois devo ficar calado

Pra não ser apedrejado,

Sem dar conta que sou povo.

*Cordel inspirado na crônica de

LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO,

intitulada O POVO.