A SAGA DE QUINCAS CIPÓ
- O Valente Cai de Pé –
(3ª e última parte)
 
 
 
  
Conforme diz o ditado,
Tudo que é bom dura pouco
Fato é que pr'esse coitado
Um revés que o deixa louco
Foi u'apego passageiro
Tão falso, vil, traiçoeiro...
E verdadeiro tampouco
 

     É o fim daquela estória
     Deixando Quinca alquebrado
     Caído, fraco, sem glória,
     Maculou-lhe o que é sagrado:
     O amor por sua metade
     Que negando sua verdade
     Deixa o coração magoado

 
Dar outro rumo na sorte
Assim quis então o destino
Qu'um primo salvo da morte
Pelo Quinca paladino
Surgisse como percalço
Tão astuto como falso
Tão bonito tão ladino.

 
     E tudo caso pensado
     O apadrinhado rapaz
     Fez-se servil, educado
     Atencioso e loquaz
     Camuflando seu ardil
     A sua índole hostil
     E seu intento safado

 
Do sol detestava a luz
Comida pouco tempero
Tinha até medo da cruz
E de estaca um desespero
Detestava mulher feia
Adorava a lua cheia
No amor era matreiro

 
     Cobiça pela mulher
     Bem antes do sucedido
     Não hesitando sequer
     Em se fazer de fingido
     Queria mesmo a tal flor
     Musa de belo rubor
     A Deusa de seus sentidos

 
Criatura suja e vil
E com sua alma sagaz
Já prepara o ardil
Onde ela 'tá, vai atrás
Mas se Quinca é um pouco louco
Então todo zelo é pouco
Olha o perigo rapaz!
 
 
     Ela logo pega fama
     Dando trela pra folgado
     Tal qual fosse mulher dama
     Rindo à toa sem cuidado
     "Água mole, pedra dura
     Tanto bate até que fura"
     Pois assim que diz o ditado

 
À vontade no quintal
Dando trela pra leseira
Chega perto o galalau,
Surge idéia traiçoeira...
De deixar Quinca pra trás
Pois sabem do que é capaz
Ele nu'é de brincadeira

 
     Está desfeito o casório
     Entre santo e mula preta
     Sai o herói provisório
     Entra o filho do capeta
     Agora é mula e morcegão
     Amantes da escuridão
     Andando pelo planeta

 
Sequer houve testemunha
Do que acontece depois
Quinca afia suas unhas
Então sai atrás dos dois
Montado num javali
Assim se diz por aí
Questão de honra ora pois!

 
 
     Onde o vento faz a curva
     Se encontram num descampado
     Sem pensar, co'a vista turva
     Vai pra cima do safado
     -Piedade eu lhe imploro
     Roga a dama bem sonoro
     Pedindo por seu amado

 
Pedem ajuda ao tinhoso
Sendo de pronto atendido
Pra batalha sem repouso
Como ninguém tinha ouvido
Três em um é covardia
Luta dura noite e dia
Se via Quinca perdido

 
     Apela pra sua fé
     Roga uma ajuda do céu
     Santos e Anjos até
     Surgir o Arcanjo Miguel
     Qu'empunhando espada em brasa
     Protege o bravo com as asas
     De escudeiro fiel

 
Se intensifica a batalha
Vencendo um por primeiro
Devolve o cão pra fornalha
Não ficando nem o cheiro
São três noites e três dias
Luta de espada e magia
Não é coisa pra escoteiro
 
 
     Para o desfecho final
     Astuto como ele só
     Desferir golpe fatal
     Coube a Quincas cipó
     Foi num golpe bem ligeiro
     Alvo de tiro certeiro
     Solta um grito e vira pó

 
E da mula só tem pena
Ignora aquela chama
Põe o peito em quarentena
Evitando um melodrama
Abraça a sina caipora
De soslaio manda embora
Cabisbaixo sai de cena

 
     Quanto mais azar no amor
     Mais estreita sua senda
     Mais ainda seu langor
     Muito mais a sua lenda
     Essa sina de caubói
     É solidão de herói
     Sentimento sem legenda

 
Hoje vive mundo afora
Sem rumo nesse sertão
Ele só pensa no agora
Indo em qualquer direção
Brinda a vida com caninha
Pra linda moça é Quinquinha
Sua pátria é esse mundão





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A SAGA DE QUINCA CIPÓ
1ª parte - A Origem da Lenda

          http://www.recantodasletras.com.br/cordel/3796400 

2ª parte - Até Macaco Velho Bota a Mão em Cumbuca
          http://www.recantodasletras.com.br/cordel/4595773

3ª parte - O Valente Cai de Pé