A VELHINHA CHUPADEIRA

I

Eu soube duma garota

Que gostava de laranja

Uma criança peralta

E dócil como uma anja

E sem ser mexeriqueira

Todo pé de laranjeira

Para ela era canja.

II

Uma cabocla que manja

Trepava no abacateiro

E no pé da gabiroba

Na limeira e no limoeiro

Com a sua peraltice

Tão ágil, como eu disse,

Subia até num coqueiro.

III

Somente o caroço inteiro

De uma manga sobrava

Porque a poupa e o suco

Sua boquinha sugava

Pois essa menina astuta

Não poupava uma fruta

Até cana ela chupava.

IV

Na cidade onde morava

Lá viveu a vida inteira

Ficou moça e depois velha

E permaneceu solteira

Tornando-se uma beata

E uma rezadeira nata

Na igreja da Padroeira.

V

Aos domingos ia à feira

Logo em seguida à missa

Sem se casar ficou velha

Essa mulata mestiça

Que permaneceu donzela

Mais tarde ficou banguela

E uma idosa enfermiça.

VI

Eis que a cidade se eriça

Com uma grande novidade

Inaugurando uma Boate

Pro prazer da mocidade

Fez o prefeito um discurso

E programou um concurso

Pra eleger uma beldade.

VII

Moças de maior idade

Provindas de toda vila

Fizeram em frente ao salão

Uma longuíssima fila

Cada qual pra se inscrever

E ao posto concorrer

Pra ser coroada Dalila.

VIIII

Dançava até com gorila

Sonhando com seu Sansão

Pra ser a dama primeira

No embalo duma canção

Porém eis que uma velhinha

Manquitolando que vinha

Chegou, bengala na mão.

XIX

E ela ali de supetão

A um guarda perguntou

O porquê daquela fila

Debochando ele informou:

- Essa fila não se acaba

Tão dando jabuticaba

A quem chupa ou chupou.

X

E o guarda continuou:

- Toda mulher trepadeira

Vai ganhar o seu quinhão

Seja de qualquer maneira

Como sei que a senhora

Chegou por último agora

Da fila será a primeira.

XI

Levou-a para a dianteira

Quando se abriu o Guichê

E a atendente perguntou:

- Senhora, quem é você?

Uma mulher de idade

Aqui onde a mocidade

É que sabe do porquê!

XII

Disse a idosa: - Como vê

Eu não tenho nenhum dente

Mas eu juro que um dia

Fui uma mulher valente

E hoje vivo sozinha

Numa modesta casinha

Rezando terço, sou crente.

XIII

E a bela moça atendente

Foi dizendo: - Não entendo

Desculpe-me a pergunta

Não quero estar lhe ofendendo

Porquanto este ambiente

É restrito àquela gente

Que trepa. Está me entendendo?

XIV

Disse a velha: - Compreendo

Que trepar não trepo mais

Para colher as pitangas

E as uvas nos parreirais

Tenho dor nas escadeiras

Já não subo em laranjeiras

Mas chupar chupo demais.

XV

Dê-me uma chance a mais

E as frutas que estão dando

Eu quero voltar pra casa

Mesmo o limão me azedando

Sei que vou morrer em breve

Tal qual a Branca de Neve

Uma maçã saboreando.