Herança de pobre

Pobre tem a sua herança

Mas nem sempre sabe disso

No domingo ele descansa

A semana é sem serviço

Tem a vida na balança

Mesmo se não tiver vício.

Sua casa é sem telhado

Sua roupa é remendada

Seu bornal está rasgado

Sua roça mal cercada

O seu chão já ressecado

Parece terra largada.

A mulher é lavadeira

Mas não lava nem panela

Apesar da trabalheira

Falta água para ela

Quando tem a prateleira

Nada tem para por nela.

O colchão já foi espuma

Hoje é um pano no chão

Comida pro filho arruma

Dando banana e mamão

Cabelo de milho fuma

Pra servir de distração.

O seu corpo está queimado

Pelo sol abrasador

Não ganhou nenhum trocado

O que lhe causa torpor

O seu dia foi marcado

Pela andança sem valor.

Seu olhar está perdido

Sua voz não quer sair

Vê no seu filho abatido

A força pra resistir

Acha que está perdido

Mas não pensa em desistir.

Sua paz é a tolerância

Que procura conservar

Tem um fio de esperança

Que tudo vai melhorar

Acredita que a constância

Fará ele prosperar.

Seu silêncio é agonia

Porque lembra da pobreza

Para ele o dia a dia

Não mostra a sua beleza

Tem na sua idolatria

Fonte de toda riqueza.

Mesmo pobre é comportado

Reconhece o seu dever

Fica às vezes endividado

Pra poder sobreviver

Pois o seu lhe é tirado

Pela força do poder.

Seu salário é quase nada

A escola pouco ensina

A saúde ignorada

Sua casa é na colina

Nunca teve água encanada

O seu banho é numa tina.

Seu trabalho o enobrece

Seu prazer é trabalhar

Seu filho lhe obedece

Sabe que tem de estudar

A mulher lhe oferece

Segurança no seu lar.

Tem somente como herança

Uma longa e árdua vida

É tudo o que ele alcança

Pra buscar uma saída

De uma vida nada mansa

Com pouca contrapartida.

Vendo o filho ser direito

Vendo a filha bem casada

Seu viver quase perfeito

A mulher bem conservada

O seu neto a lhe dizer

Que tem uma namorada.

Sua vida foi de glória

Hoje vive aposentado

Nunca reclamou vitória

Lutou com a mulher ao lado

Hoje vivem a sua história

Como um casal honrado.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 31/10/2015
Reeditado em 31/10/2015
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