Cordel
• Eli Rodrigues de Lima
• Acadêmico da AELE – Academia Escadense de Letras.
Quando me entendi por gente
E comecei a rimar
Palavras de todo jeito
Sem saber no que ia dar
Malfeito e mal-acabado
Uns versos de pé-quebrado
E achando eu que era arte
Só depois vim entender
Que Deus dividiu o saber
Dando a cada qual sua parte
Na geografia de Deus
Não tem país nem fronteiras
O mundo é partido em poetas
Cada um, da sua maneira
Retrata sua região
Levando no coração
A devoção por sua arte
E do divino trabalho
Somos colcha de retalhos
Cada qual com sua parte
Comecei lendo os sonetos
Do poetinha Vinícius
Com sua métrica perfeita
Feito um relógio suíço
E assim, descobri primeiro
Que o dito amor verdadeiro
Pode sim, ser traduzido
Seja lá em verso ou prosa
Sua poesia voluptuosa
Me deu um novo sentido
Mas no auge dos meus sonetos
Entrei na Universidade
Tive que ocupar meu tempo
Com outra realidade
Cálculo diferencial
E a Física vetorial
Cada conta de lascar
Estudava noite e dia
Mas dentro de mim, sabia
Que meu medo era endoidar
Num belo dia, um colega
Querendo fazer gracinha
Só porque é da Capital
Disse: E aí, Escadinha,
Lá já chegou coca-cola?
Tu escutas som em radiola,
Ou já tem fita cassete?
Isso é coisa que se diga?
Mas como não sou de briga
Respondi ao seu topete:
Realmente eu sou de Escada
Carrego-a aonde eu for
E, pra você que não sabe
O nome disso é amor
Lá, criei-me solto ao vento
Tu, aqui, em apartamento
Não sabe o que é viver, não
Tu nem sabe o que lá tem
Se não for pra falar bem
Também mal não fale não
Nesse dia vim pra casa
Com a mente às avessas
Pelas frases rodopiando
Dentro da minha cabeça
Foi aí que eu entendi
Que a poesia está em mim
Está em nós, amantes da arte
Por mais que a gente se esconda
No fim tem que prestar conta
Cada qual com sua parte
A frase tornou-se verso
O verso tornou-se estrofe
A estrofe virou cordel
Que depois eu pus num cofre
E não mostrei a ninguém
Até que um dia, porém
Mostrei ao amigo João
Que leu, releu e gostou
Não satisfeito, espalhou
Foi aquela danação
Sendo a poesia um trem
Cheio de arte brasileira
Escolhia estação cordel
Minha estação derradeira
Desci aqui de mala e cúia
Nessa arte que só me orgulha
Que esse nó nunca desate
E mesmo com verso falho
Nessa colcha de retalhos
Encontrei a minha parte
Saibam: não estou sozinho!
Só tem gente de primeira
Mestre Valdeci Leocádio
Zé Pacheco, Zé limeira
Patativa do Assaré
Tem Josué de Nazaré
Tem Jessiê de rima e prosa
Sem falar do meu Patrono
Cada cordel me apaixono
O grande Chico Pedrosa
Tem gente que me pergunta:
Tu és poeta ou engenheiro?
Respondo em cima da bucha:
Nenhum dos dois, companheiro!
Me orgulho, sou cordelista!
Forçado a ganhar a vida
Numa outra formação
Quando dinheiro eu ganhar
Com versos que eu sei rimar
Eis a minha profissão
Enquanto esse dia não chega
O jeito é me dividir
Entre o que amo e o que preciso
Um cordel aqui outro ali
Eu vou tapeando a vida
Tornando-a mais colorida
Mesmo nessa luta diária
Num eterno perde e ganha
E quem não aprende, apanha:
Só a arte é igualitária
E a arte me trouxe aqui
Para chamá-los, Confrades!
Andantes da mesma estrada
E por nossa afinidade
Hoje, vocês me dão asas
Para, em nome desta casa
Voar cada vez mais alto
E sem esquecer que aqui
Finquei a minha raiz
Mas dei meu primeiro salto
Me rendo. Sou escadense!
Por tua causa eu declamo
Talvez não seja a mais linda
Mas é a cidade que eu amo
Por ti, sempre vou e volto
Quando estou aqui me solto
Como um filho indo pra casa
Que nunca erra o caminho
E quando chegono ninho
Esqueço que tenho asas
Dar-te-ei a minha vida
É, neste instante, o que posso
Juro “lutar com palavras”!
Sugere o brasão que é nosso
Eis-me aqui, um novo soldado
De poesias, venho armado
Tendo o cordel como farda
Cumprirei meu dever
De amar, cuidar...proteger
A nossa querida Escada
Eli, cordelista da cidade de Escada - PE