Meu diário
Anotei no meu diário
O que tinha pra fazer
Rabisquei no calendário
O que tinha a devolver
E preguei no mostruário
O que tinha pra vender.
Visitei o meu padrasto
Minha mãe presenteei
Coloquei um terno gasto
Pelo qual nunca paguei
Dos irmãos eu me afasto
Ao labor renunciei.
Fiz as pazes com o vizinho
Conversei com a minha sogra
Sigo livre no caminho
Me seguir ninguém não logra
Sigo o caminho sozinho
E de mim nada se cobra.
Fiz o meu próprio destino
Escolhi o que plantar
Comecei desde menino
Meu caminho preparar
Apesar de pouco ensino
Foi bom o meu caminhar.
Muitos traumas suportei
Nos caminhos desta vida
O porquê disso eu não sei
Não olhei par a subida
Eu de tudo desliguei
Para achar uma saída.
Disse ao desembarcar
Que a vida foi difícil
Pouco o meu descansar
Enfrentei pesado oficio
Mas o fiz sem reclamar
E assim livrei do vicio.
Foram muitas exigências
No viver o dia a dia
Apesar da inocência
Viver era o que eu queria
Mas a santa providência
Nunca quis dar regalia.
Fiz do meu viver a fonte
De um sonho fracassado
Não atravessei a ponte
Pra chegar ao outro lado
Não olhei o horizonte
Onde eu já tinha estado.
Tive muitos pesadelos
Tive medo do escuro
Não olhava nos espelhos
Pra não ver quanto era impuro
Ouriçava os meus cabelos
Para andar pisando duro.
Caminhei campos minados
Enfrentei a guerra sim
Vi amigos assassinados
Numa matança sem fim
Vi corpos estilhaçados
Segurando um estopim.
Esqueci o meu passado
Tive medo do futuro
O presente era o meu fardo
O meu sol estava escuro
Tudo que me fora dado
Eu sabia ser impuro.
Vi o meu presente infindo
Dar um salto no passado
Eu continuei sorrindo
Achei aquilo engraçado
Depois vi que estava vindo
O futuro preparado.
Dei adeus ao meu presente
Fui em busca do futuro
Aprendi ser diferente
Deixei de escalar muro
E pra ser eficiente
Me livrei do mau augúrio.
Tudo é água passada
Hoje estou recuperado
Já refiz minha jornada
Sem levar fardo pesado
Assim sigo a caminhada
Pra chegar ao outro lado.
Do passado eu desisti
O futuro me espera
O presente eu construí
Dominando a besta fera
E no meu viver eu vi
Que a fé não desespera.
Foi assim que terminei
De fazer o meu diário
Nele não exagerei
Fui bastante solidário
Mas ainda anotarei
O viver do solitário.